quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Philosophia Iuris #16: a Jusfilosofia de Dworkin

 


Ronald Dworkin (1931 a 2013) foi um jusfilósofo. Ele é conhecido por ter uma obra crítica ao pensamento de H. L. A. Hart. Trabalhou na Universidade de Oxford, na Universidade de Nova York e na University College London (UCL). 


Ronald Dworkin tem uma abordagem crítica ao juspositivismo, sendo mais próximo a uma posição não-juspositivista, o que o aproxima de Lon L. Fuller e John Finnis. Podemos chamá-lo de jusmoralista ou algo próximo ao jusnaturalismo contemporâneo.


Dworkin defende a moralidade como parte necessária e inseparável da identificação, interpretação e aplicação do Direito. Porém ele rejeita a interpretação clássica do jusnaturalismo em que uma lei injusta deixa de ser lei.


Como grande parte do texto se retirará ao trabalho de Hart, peço que o leitor ou a leitora leia os textos predecessores. Visto que a obra de Dworkin é uma crítica sistemática ao pensamento de Hart.


Grande parte do trabalho de Dworkin é o de ser uma resposta ao trabalho de Hart. Para desdobrar isso precisamos ter uma visão setorial. Em pririmeiro lugar, vou traçar um quadro sistemático de forma simplificada.


— Hart vs Dworkin:


- Questão Central: "O que a lei é?" (Hart) X "O que uma lei requer?" (Dworkin);

- Natureza da Lei: Sistema social de regras primárias e secundárias (Hart) X Regras, Princípios e Política (Dworkin);

- Regra de Reconhecimento: O último critério para a validação da lei é o fato social (Hart) X Nenhuma regra mestra pode captar a razão complexidade legal (Dworkin);

- Papel da Moralidade: Separável, uma lei pode ser válida e moral (Hart) X Necessária, o raciocínio moral é essencial para identificar uma lei (Dworkin);

- Julgamento em Casos Difíceis: exercer discrição e fazer uma nova lei (Hart) X usar princípios (Dworkin);

- Analogia: a lei é um fato social a ser observado, ciência (Hart) X a lei é uma narrativa a ser interpretada, literatura (Dworkin).


— Questão Central:


Dworkin começou seu trabalho crítico contra Hart começando a atacar a concepção positivista de que as leis poderiam ser descritas tão somente como se fossem só regras. Segundo Dworkin, as leis podem conter também dentro de si conteúdos que não são regras.


Esse conteúdo que não são regras podem ser chamados de princípios. Os princípios servem para preencher os requisitos da justiça quando ela estiver vaga e imprecisa, dando uma dimensão de moralidade.


Para ilustrar esse caso, Dworkin trabalha com o caso "Rigg v Palmer" de 1889. Nesse caso, um neto matou o seu avô. O assassino seria herdeiro. Todavia entrou o princípio de que "ninguém pode lucrar com o próprio crime". Logo o princípio (que vem com moralidade) completou a lacuna da regra. É por isso que Dworkin vê o trabalho de Hart como incompleto.


— Natureza da Lei:


Para Dworkin, os princípios são capazes de preencher as lacunas das regras estabelecidas. A diferença entre os princípios legais e as regras legais está no caráter. Ambos apontam para obrigações legais. Os princípios apontam para as dimensões morais da lei. Apontando para uma dimensão teleológica da lei (a finalidade a qual ela se inscreve), podendo esse ser socioeconômico ou político.


Enquanto Hart era um juspositivista, aderente da Tese da Separação, Dworkin vê na moralidade uma consubstancia necessária para aplicação da lei. Visto que os princípios são padrões de conduta que apontam para uma direção, mas não determinam uma posição única. Eles possuem peso e importância no balanceamento dos conflitos.


— Regra de Reconhecimento:


Dworkin rejeita a ideia de que exista um tipo de regra mestra que todo sistema jurídico apresenta. Isto é, não há uma chave mestra para ser utilizada para identificar regras válidas em todos os sistemas jurídicos existentes. Logo ele vê a ideia de Hart como uma espécie de simplificação da complexidade que o mundo apresenta.


Ele vê que as pessoas continuam tendo direitos válidos mesmo quando esses mesmos direitos estão em disputa. Ou seja, mesmo quando se disputa socialmente qual é a correta legalidade de um direito, mesmo situações bastante críticas onde há um questionamento profundo, as pessoas continuam a ter acesso a esses direitos.


— Papel da Moralidade:


Dworkin, ao contrário de Hart, acredita que a moralidade serve para dar uma interpretação construtiva da lei. E que a interpretação da lei já implica necessariamente em uma moralidade quando pensamos no que uma lei realmente é. Tal como foi o caso de "Rigg v Palmer" anteriormente citado. Quando o neto matou o vô para obter a sua herança, questionou-se qual era o fundamento da lei. Logo houve uma análise de natureza moral.


— Julgamento em Casos Difíceis:


Aqui, mais uma vez, destaca-se em Dworkin a ideia dos princípios. Isto é, enquanto que em Hart é possível criar uma nova lei, em Dworkin é necessário que o juiz se questione a respeito do Telos (finalidade da lei) e se oriente moralmente para cumprir essa finalidade. A questão é uma interpretação moral que se faz sobre os direitos e deveres presentes na sociedade.


— Analogia:


É por causa da correlação entre direito e moralidade que podemos vislumbrar em Dworkin uma ligação a uma chave interpretativa da lei. E essa chave interpretativa da lei é a busca dos princípios que a orienta. Isto é, ele lê a lei através da lente moral. E a lente moral completa a lei.