Naquela altura do campeonato, vendo o triste fim da União Soviética que estava embebida no totalitarismo, a ideia de uma construção social lógica e perfeita era impossível. Logo a possibilidade mesma de um mentalidade revolucionária era impossível. Era preciso ir além dos limites de "esquerda", "direita" e "centro". Se fazia necessário uma visão de mundo mais modesta, menos baseada em abstrações e mais pragmática em seus meios e fins.
A ideia de liberdade total ao indivíduo ou segurança total ao indivíduo eram duas totalidades opostas, uma defendida pelo liberalismo e outra defendida pelo socialismo. Essas duas abstrações marcavam a ferro e fogo o mundo. Era uma pauta muito "tolerante" para a animosidade polarista que tomava o mundo na Guerra Fria. O mundo estava dividido entre "dois grupos" e os grupos opostos tomavam todo e qualquer discurso do lado oposto como uma espécie de propaganda. A neutralidade, advogada por muitos intelectuais, parecia uma espécie de reforço a um dos lados – mesmo que essa não fosse, muitas vezes, a intenção.
O anticomunismo tinha algumas vias. Uma dessas vias era o anticomunismo reacionário, um anticomunismo mais à direita. Só que esse anticomunismo não era a única via anticomunista. Havia – e há – um anticomunista humanitário e mais ao centro ou à esquerda do espectro político. Esse anticomunismo é, muitas vezes, objeto de escárnio ou descrença. Muitos ex-comunistas eram anticomunistas e muitos deles não eram propriamente defensores do "capitalismo", mas sim de uma visão mais equilibrada de mundo, onde o dualismo ficava de fora.
A responsabilidade intelectual, em nome da busca sincera pela verdade, deveria ser maior que o otimismo e o grupalismo. O intelectual deveria estar acima dos interesses mais viscerais e dos grupos mais autolisonjeiros. Em vez disso, muitos buscavam soluções fáceis e tribalizadoras. É por isso que os intelectuais americanos queriam uma vigilância constante para não cair no atavismo. Prescrição essa muitas vezes ignoradas por tribalistas de direita ou de esquerda.
Tal situação de extremismo se tornou ainda pior quando o macarthismo se tornou a palavra de ordem dos Estados Unidos. O comportamento de Joseph McCarthy se tornou algo visceralmente doentio e a mentalidade conspiratória acusou sumariamente várias pessoas. Em nome da liberdade que era atacada pelos países comunistas, criou-se uma censura – muito semelhante a comunista – para acabar com... A conspiração comunista. Os Estados Unidos acabou cerceando a liberdade para acabar com aqueles que supostamente atacavam a liberdade.
A defesa da cultura livre, isto é, a livre discussão, a livre investigação, o livre-exame e o livre debate, eram mais do que nunca atacados numa era de extremos. Além disso, a consciência dos estados em relação aos intelectuais aumentava dia após dia. Os intelectuais são parte fundamental da sociedade, são eles que moldam a forma com que vemos o mundo e profissionalizam uma série de pessoas para várias tarefas. Os Estados queriam que os intelectuais fossem subservientes aos seus propósitos propagandísticos, deixando o "povo" mais dócil aos seus interesses. Só que há diferença entre o "intelectual puro" e o "intelectual propagandista". Um intelectual pode chegar a muitas conclusões, teses, ideias... Mas se seu dinheiro depende se algum grupo, as suas investigações são menos livres e mais condicionadas a interesses que escapam ao livre curso de seus exames.
A questão que aparece é: como que um intelectual mantém a sua vida intelectual? O exercício da sua intelectualidade requer um amparo financeiro. Esse amparo financeiro usualmente vem da burocracia e a burocracia geralmente se correlaciona ao governo – ou é o próprio governo. A ligação cada vez maior de intelectuais com o governo se demonstra mais alta. Essa correlação cria uma dependência e, quiçá, engrandece na medida em que corrompe a própria inteligência.
Vivemos no mais espetacular e grandiloquente processo de fusão entre o "intelectuariado" e a burocracia. Essa fusão está criando um elitismo acadêmico cada vez maior. Alçando o voo de uma classe que toma consciência corporativa cada vez maior. Os frutos dessa relação – além da ausência de uma cultura livre – é o engrandecimento de um poder estranho e invasivo.
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