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quinta-feira, 21 de agosto de 2025

Ephemeris Iurisprudentiae #19: TGD 8


Viver em sociedade exige que as relações sejam pautadas por normas. Mas qual seria a diferença entre o Direito e a Moral?


— Direito X Moral:

- Regras Sociais X Deveres das Pessoas;

- Coercibilidade X Pessoa em Si e Divindade;

- Sanção Externa X Sanção Interna.


Podemos ver que, em alguma parte, Direito e Moral possuem algo em comum, isto é, regular a sociedade de alguma maneira. A diferença é que a moral não se restringe a sociedade, atinge a pessoa em si e pode entrar até mesmo no terreno da divindade. Já o Direito está sempre no campo social, atua na regulação da pessoa entre os seus semelhantes.


Todavia essa explicação ainda não é suficiente. Devemos avançar ainda mais na diferenciação da Moral e do Direito.


— Normas X Normas no Direito:

- Imperativas X Autoritativas;

- Conduta Humana X Poder de Exigência.


Segundo Maria Helana Diniz, todas as normas são imperativas visto que fixam as diretrizes da conduta humana. Se as normas da Moral e as normas do Direito apresentam mutuamente a imperatividade, qual seria a exata diferença? A diferença está no fato de que, no Direito, é que a norma é autorizante: ela possibilita ou autoriza a pessoa lesada o poder de exigir o seu cumprimento ou a reparação do mal sofrido. Enquanto isso, a moral, por si só, não carrega esse poder.


— Norma Jurídica X Norma Normal:

- Bilateral X Unilateral;

- Coação X Dever Interno;

- Dever e Obrigação X Não autoriza coação


Indo mais além na diferença entre a norma na esfera do Direito (norma jurídica) e a norma na esfera da moral (norma normal), podemos ver que a norma jurídica carrega a bilateralidade,  a coação, o dever e a obrigação. Na norma jurídica, isso significa que ela impõe dever ao indivíduo violador da norma e autoriza ao indivíduo lesado poder exigir o seu cumprimento conforme a previsão que está estabelecida. No campo da moral, observa-se o fenômeno da unilateralidade, o que significa que há um dever de caráter interno diante do comportamento que a moral prescreve, ou seja, ela não autoriza a utilização da coação para obter o seu cumprimento.


— Resumidamente:

- Moral: volta-se ao aspecto interno, de natureza psíquica, da pessoa;

- Direito: regula as condutas que se exteriorizam no mundo físico, na própria sociedade.


Outra classificação interessante é a de Jeremy Bentham e Georg Jellinek:


— Teoria do Mínimo Ético:

- Direito = Mínimo da Moral;

- Obrigatório;

- Teoria dos Círculos Concêntricos.


O Direito, segundo a Teoria do Mínimo Ético, representa o mínimo da moral, o mínimo possível, o mínimo obrigatório para se viver em sociedade. Essa teoria desenha um círculo grande, que representa a moral, e um círculo pequeno dentro do círculo grande, que representa o Direito. O que significa que o Direito (círculo menor) faz parte da moral (círculo maior).


Outra teoria, contraposta a essa, é:


— Teoria dos Círculos Secantes:

- Normas Jurídicas Independentes;

- Normais Morais Independentes;

- Normas em comum.


Um grande exemplo de que nem toda norma está no campo de Direito ou até mesmo da moral, são normas técnicas. Ali a preocupação não é de caráter moral, mas puramente técnico. Nessa teoria o Direito apresenta alguma independência, há uma parte que depende da moral e outra que é independente.

sexta-feira, 15 de agosto de 2025

Ephemeris Iurisprudentiae #11: Direito e Moral

 


Estas são anotações de uma aula de Filosofia do Direito ou Jusfilosofia. Aqui se trata de dois pensadores, George Julinek e Miguel Reale.


— George Julinek:

- Teoria do Mínimo Ético;

- O Direito aparece como um campo concêntrico dentro da Moral;

- O Direito regula parte da Moral, mas está sempre dentro dela;

- O Direito pode aumentar ou diminuir o seu escopo regulatório da atividade moral.


— Miguel Reale:

- Teoria da Amoralidade Parcial do Direito;

- Há campos de Direito que não regulam a Moral;

- Em outras palavras, Direito e Moral apresentam uma intersecção, mas são campos autônomos.


— Teoria do Mínimo Ético (George Julinek):

- Exemplo:

1) O adultério é rechaçado do ponto de vista moral, todavia perguntamo-nos o seguinte: será que a hipótese de condenação moral também deveria ser hipótese de condenação do Direito? Até o Código Penal de 1940, havia a criminalização da prática do adultério. O que aconteceu depois? A sociedade começou a pensar que o adultério não era tão grave a ponto de ser considerado crime. Com base na consciência social, a jurisprudência começou também a pensar que a prática do adultério também não era mais digna de ser apenada. Graças a isso, o adultério deixou de ser crime em 2005;

2) No caso da corrupção política, ela sempre foi condenada moralmente. Na década de 90, tivemos a lei da improbidade administrativa. Em 2010, a lei ficha limpa. 

- Conclusão:

O Direito é variável em relação a Moral, podendo aumentar ou diminuir o seu escopo. Ele pode diminuir a sua atuação em relação a uma prática e aumentar em relação a outra. No caso, a sociedade se tornou mais liberal nos costumes, no âmbito da sexualidade, ao mesmo tempo que se tornou mais rigoroso em relação a moral pública. O Direito acompanhou esse movimento.


— Teoria da Amoralidade Parcial do Direito (Miguel Reale):

- Há uma intersecção entre o Direito e a Moral, mas nem todo Direito faz parte da Moral e nem toda Moral faz parte do Direito;

- A relação entre o Direito e a Moral é maior ou menor a depender da vontade da sociedade.

- Exemplo:

As normas de trânsito não carregam juízo de valor, mas uma simples regulação do trânsito humano.


— Diferença entre o Direito e a Moral:

- Heteronomia (Direito) vs Autonomia (Moral):

1) No Direito, há a heteronomia. O que significa que outra pessoa elabora a norma. Nós obedecemos regras criadas por outras pessoas, não por escolha pessoal;

2) Na moral, temos a autonomia. O próprio indivíduo escolhe o que está certo. As normas morais são fabricadas pela própria sociedade, mas cabe a filiação individual: é o indivíduo, em última instância, que escolhe.


- Coercibilidade (Direito) vs Incoercibilidade (Moral):

1) No Direito, temos a coercibilidade. Isso significa que o Direito pode exigir e coagir a prática de um ato;

2) Na Moral, verifica-se a incoercibilidade. Isto é, não há possibilidade de coação. Dentro do campo moral, não há quem possa obrigar o indivíduo a pensar ou agir de forma correta.


- Bilateralidade (Direito) vs Unilateralidade (Moral):

1) As relações no Direito implicam numa bilateralidade, isto é, são uma relação de duas ou mais pessoas. Não cabe uma decisão puramente individual, mas sempre bilateral;

2) Nas relações da Moral, há uma unilateralidade. O ato se processa internamente no indivíduo. A moralidade considera o outro, mas o indivíduo unilateralmente toma a decisão.


- Atributividade (Direito) vs Não atributivo (Moral):

1) No Direito, há a atributividade. Isso significa que há um valor objetivo para o ato praticado. Em outras palavras, há uma métrica de valoração;

2) Na Moral, há um valor subjetivo, inquanficável. É por isso que ela é não atributiva. 

sábado, 6 de julho de 2024

Acabo de ler "Sacred Chaos" de Françoise O'Kane (lido em inglês/Parte 1)

 


O Self não faz divisão de valores. Ele é a totalidade, isto é, sejam compostos considerados pelo próprio "Ego" como bons ou ruins. Quando nossos valores, moralidade e virtudes entram em choque com uma realidade que nos nega, existe uma tentativa de puxar "os conteúdos caóticos" de dentro de nosso ser e pô-los em prática. O lado irracional e sombrio é inerente ao psiquismo, ele pode ser custosamente reprimido, mas não pode ser retirado. Ou seja, ele estará conosco onde quer que estejamos e poderá despertar quando menos esperarmos.


O eterno conflito da natureza humana, ele aparece diversas vezes durante a história. As linhas mais avançadas do cristianismo defenderam que o mal está circunscrito na esfera da ação moral, mas não é uma existência por si mesma. Por outro lado, existe uma versão maniqueísta em que há um dualismo no mundo. Um "deus bom" e um "deus mal", opostos dialeticamente. Existe a gnose que separa duas deidades, a material e a espiritual. Os problemas do mundo teriam surgido através da criação do mundo físico.


Ora, o elemento do caos – a ausência de regularidade e estabilidade – gera sempre uma outra percepção acerca da humanidade. Por exemplo, existe dentro da mentalidade revolucionária uma ideia positiva. Do caos, surgirá uma ordem mais justa, socialmente mais equilibrado e em que os recursos são dispostos de forma a favorecer o bem comum. Logo o caos é percebido instrumentalmente, o caos serve para a criação de uma ordem. O revolucionário não defende o caos pelo caos, mas a geração de um caos para a destruição da ordem existente. Isso tendo em vista uma nova ordem. Esse fenômeno pode ser enquadrado como uma espécie de "sedução sombria".


É possível dizer que existe um mecanismo de regressão. Essa regressão é, particularmente, enquadrada como um mecanismo de retornar a passos anteriores – idades mentais anteriores – para resolver um conflito presente. Isso leva a uma perda do "quadro psicológico" em sua inteireza.  Isto é, se o psiquismo pode ser enquadrado como um quebra cabeças em que há graus maiores de consistência e inconsistência pelas partes que faltam ou estão devidamente integradas perante o aspecto momentâneo e dinâmico da vida. Quando entramos em crise, há um obscurecimento e perda quantitativa dos fragmentos que estavam integrados, o que leva uma perda qualitativa do autocontrole psíquico e da estabilidade mental. Usualmente levando a infantilização e imediatismo.

quarta-feira, 16 de março de 2022

Acabo de ler "As Crônicas de Nárnia Vol. 1: O Sobrinho do Mago" de C. S. Lewis

 



"— Riam sem temor, criaturas. Agora, que perderam a mudez e ganharam o espírito, não são obrigados a manter sempre a gravidade. Pois também o humor, e não só a justiça, mora na palavra" (Aslam).
Apesar da aparente simplicidade, o livro é bastante complexo e, como não haveria deixar de ser, esconde uma "mensagem cristã criptografada". O livro tem uma lição moral que quer conduzir o jovem leitor - ou o "velho leitor", como em meu caso - para um entendimento cristão de mundo.
Por um lado, o livro apresenta um conflito quase que cósmico entre uma figura de uma rainha de gelo (Jadis) contra um Leão bem próximo ao fogo (Aslam). Jadis representa não só a figura de Satã, mas bem simboliza a idolatria e o Estado-Deus. Jadis é tirânica e se julga além de qualquer coisa "fortuita" como as emoções e ambições humanas. Já Aslam crê na liberdade, não por acaso uma de suas frases, citada bem no começo, fala sobre o riso e a liberdade de rir. Aslam não se impõe, mesmo sendo imponente, pois crê na liberdade. A salvação traz não somente o paraíso da ausência de escassez, também traz o paraíso do sorriso e do riso. Aslam, tal como Verbo Divino (Jesus Cristo), produz um mundo pelo seu canto majestoso ("no princípio era o verbo", já dizia a Bíblia). Já Jadis representa a gravidade, onde toda ação tem um preço e tudo se correlaciona a um poder gravitacional - lógica da escassez, diferente do paraíso.

André, tio do protagonista, mexe com algo que não sabe e acaba por trazer o mal para a Terra. Digory e Polly, nossas duas crianças, em sua pureza, vão acabar por impedir o mal. As ambições de André, o feiticeiro, acabam dando errado e ele acaba por descobrir que o mal é sempre ligado numa lógica dura, numa lógica de coração de pedra em que a ambição do mais forte recai sobre o mais fraco e o mais fraco se curva - diferentemente do bem, movimento pela graça, que ama todas as criaturas em igualdade e as ela quer bem, não por algo prévio e sim pelo amor. De tal modo, Aslam (figura cristã) é o amor e Jadis (figura satânica) quer só o próprio benefício, abusando dos mais fracos. Simples, mas complexo.