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domingo, 11 de setembro de 2022

Acabo de ler "Mistérios Divinos" de Neil Gaiman e P. Craig Russell

 



Faz algum tempo que ando me aproximando do mundo das revistas em quadrinhos. Esse mundo, até agora, nunca me deixou de fascinar. Entre meus autores prediletos, encontra-se Neil Gaiman, uma pessoa capaz de proporcionar fantásticos enredos que sempre movem o leitor para uma leitura curiosa e apaixonada.

Como não poderia deixar de ser, "Mistérios Divinos" é outra excelente HQ de Neil Gaiman. A história se passa antes da criação de nosso mundo, quando os anjos viviam produzindo tudo que será utilizado no mundo que vivemos. Embora hajam alguns personagens que vivam no mundo em que nós vivemos.

Se a pergunta é: "como era o mundo antes de Adão e Eva", essa revista em quadrinhos traça um cenário para essa pergunta teológica. Claro que ela goza duma visão pouco ortodoxa no âmbito da teologia, porém isso só impacta gente meio fanatizada que não consegue se entregar numa experiência cultural sólida. Convido o leitor a esquecer-se por um momento de suas crenças teológicas e gozar dessa ótima experiência literária e artística.

A HQ seguirá dois personagens, um anjo e um homem. O caminho dos dois será encontrado na narrativa. E, interessantemente, pode-se ter um roteiro que deixará o leitor cada vez mais expectativo com a consumação dessa história que sempre deixa um gosto de quero mais. Um processo investigativo é traçado e questionamo-nos a função dos anjos e o desempenho de cada um deles no pré-criação.

Em relação a comentários sobre a história total, prefiro deixar-lhes mais com a experiência em si do que um comentário que estabelece previamente todos os eixos. Digo-lhes, tão apenas, que a experiência vale muitíssimo a pena e que a história tem bastantes reviravoltas.

terça-feira, 31 de maio de 2022

Um Gorducho com Duas Espadas - Parte 2 (Hereges - G. K. Chesterton, pág. 33 a 43) (Lamentações - Jeremias - 1)

 




A similitude de Hereges de G. K. Chesterton com Lamentações de Jeremias poderiam ser meramente ocasionais se não fosse pelo fato de que Chesterton era um teólogo no sentido mais substancial do termo e real em vivacidade, seja em inteligência ou vida em santidade. Mas cenas catastróficas das lamentações em que fala o profeta Jeremias, vemos uma cidade que se perdeu no peso de sua própria glória e esqueceu-se do motivo central que a edificou pomposamente. 


Olhando o argumento anterior, pensa-se: Jerusalém esqueceu-se de Deus, Deus maldosamente a castigou. Só que é má teologia pensar assim, Jerusalém não foi castigada por Deus e sim por si mesma. Ao viver uma vida que foge da substância e cai no mero acidente, perde-se a centralidade e consciência daquilo que nos circunda e importa. É como o homem que hipnotizado pelo amarelo do ouro, passa a acreditar que tudo que é dourado é ouro. Daí encontramos Chesterton: o peso doutrinal é sumamente ignorado e existem discussões que não tratam da essência das coisas, mas de meros itens secundários. É uma discussão metodológica sem a razão que fundamenta o método.






Por exemplo, Chesterton, ao ver que a frase de que "a vida não vale a pena ser vivida" é um bem elabora o seguinte argumento se o pensamento fosse sistematizado: 

Toda ordem que temos hoje seria posta ao contrário e o único objetivo da vida seria o extermínio da vida existente.






Chesterton e a Bíblia me fazem perceber que estou atirando cegamente, esses tiros escapam da seriedade pelo simples fatos de serem ingênuos. Perco-me no subordinado sem alcançar jamais a ordem, já que a centralidade do meu discurso e de minha vida se perderam em banalidades que escapam da centralidade almejada. A vida requer um sentido profundo que lhe dê plausibilidade e dirigibilidade radicada nesse ideal. Se não, perde-se em pormenores que são acidentais. Uma das próprias condições para se atingir isso é a aplicar as crenças num exercício mental de realidade, com pessoas e objetos concretos, testando a veracidade dessas crenças dentro do universo real. Voltar ao senso comum.

quarta-feira, 16 de março de 2022

Acabo de ler "As Crônicas de Nárnia Vol. 1: O Sobrinho do Mago" de C. S. Lewis

 



"— Riam sem temor, criaturas. Agora, que perderam a mudez e ganharam o espírito, não são obrigados a manter sempre a gravidade. Pois também o humor, e não só a justiça, mora na palavra" (Aslam).
Apesar da aparente simplicidade, o livro é bastante complexo e, como não haveria deixar de ser, esconde uma "mensagem cristã criptografada". O livro tem uma lição moral que quer conduzir o jovem leitor - ou o "velho leitor", como em meu caso - para um entendimento cristão de mundo.
Por um lado, o livro apresenta um conflito quase que cósmico entre uma figura de uma rainha de gelo (Jadis) contra um Leão bem próximo ao fogo (Aslam). Jadis representa não só a figura de Satã, mas bem simboliza a idolatria e o Estado-Deus. Jadis é tirânica e se julga além de qualquer coisa "fortuita" como as emoções e ambições humanas. Já Aslam crê na liberdade, não por acaso uma de suas frases, citada bem no começo, fala sobre o riso e a liberdade de rir. Aslam não se impõe, mesmo sendo imponente, pois crê na liberdade. A salvação traz não somente o paraíso da ausência de escassez, também traz o paraíso do sorriso e do riso. Aslam, tal como Verbo Divino (Jesus Cristo), produz um mundo pelo seu canto majestoso ("no princípio era o verbo", já dizia a Bíblia). Já Jadis representa a gravidade, onde toda ação tem um preço e tudo se correlaciona a um poder gravitacional - lógica da escassez, diferente do paraíso.

André, tio do protagonista, mexe com algo que não sabe e acaba por trazer o mal para a Terra. Digory e Polly, nossas duas crianças, em sua pureza, vão acabar por impedir o mal. As ambições de André, o feiticeiro, acabam dando errado e ele acaba por descobrir que o mal é sempre ligado numa lógica dura, numa lógica de coração de pedra em que a ambição do mais forte recai sobre o mais fraco e o mais fraco se curva - diferentemente do bem, movimento pela graça, que ama todas as criaturas em igualdade e as ela quer bem, não por algo prévio e sim pelo amor. De tal modo, Aslam (figura cristã) é o amor e Jadis (figura satânica) quer só o próprio benefício, abusando dos mais fracos. Simples, mas complexo.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Diários Cadavéricos #3 - Espírito Celeste

 "Não obstante, eles adoram, em vez d'Ele, divindades que nada podem criar, posto que elas mesmas foram criadas. E não podem prejudicar nem beneficiar a si mesmas, e não dispõem da morte, nem da vida, nem da ressurreição"

(Surata 25:3)


Se eu morresse hoje, estaria completamente insatisfeito. É difícil, meu Deus, não cair na idolatria quando o peso do mundo bate forte. E, se assim o é, é pelo jogo gravitacional das relações humanas e meu parco caráter. Sei que sou moralmente fraco, e minha performace social a isso indica: não sou o que sou, sou a negação do que deveria ser. Só que tão grandes são as vozes sociais que minha mente de Ti distoa por causa de vários gritos.


"15. Pergunta-lhes: Que é preferível: isto, ou o Jardim da Eternidade que tem sido prometido aos devotos como recompensa e destino,"
"16. De onde obterão tudo quanto anelarem, e em que morarão eternamente, porque é uma promessa inexorável do teu Senhor?"
(Surata 25:15-16)

Deus, sou um traidor, mas sei que és glorioso e misericordioso. Só que a sociedade me traz um jugo idólatra, já que a ela sou temente. O sofrimento psíquico se condensa e condena junto com o inferno vindouro, já que o caminho do idólatra nada mais é que o desvio da senda reta. Por temer tanto a sociedade, por ser com ela um covarde, sigo o caminho da vã vanidade. A ela atribuo mais do que é capaz, faço por temor e complacência, mas nada dela vem de modo autogerado, já que só Deus é capaz de criar. Então, pergunto-me: por que temo esse deus de barro e não me aconchego em Ti, verdadeiro Deus?

"[7]Zain. Nestes dias de males e vida errante, recorda-se Jerusalém das delícias dos tempos idos. Agora que seu povo sucumbiu sob os golpes do inimigo e ninguém vem socorrê-la! Olham-na seus inimigos, e zombam de sua devastação."
"[8]Het. Graves foram os pecados de Jerusalém: ela ficou uma imundície. Quem a honrava, agora a despreza porque lhe viram a nudez. E ela geme e esconde o rosto."
(Lamentações 1,7-8)

Lamento agora a vanglória de outrora. Meu pensamento perdeu retitude e atitude. Conforme esmorecia, ajuntava-me a tragédia de minha comédia. A Tua lógica não é dos homens e a lógica dos homens é torta. A Tua senda é reta, mas a senda dos homens engendra tragédias com pratos cheios de aparentes comédias. Se assim é, sou tolo. Guia-me, Alá, a Tua senda reta. Já que sofro mais por ter te esquecido do que por ter te seguido. Se tivesse te seguido, não me surpreenderia com os ventos mutantes que mudam os rumos dos homens e nem edificaria morada em areia movediça. Como assim fiz, vi meu império de areia ruir. Já que o homem abandona e só o Senhor cuida do homem abandonado.

"[18]Sade. O Senhor é justo, porque fui rebelde à sua voz. Escutai todos vós, ó povos, e vede a minha dor. Minhas virgens e meus jovens foram conduzidos para o exílio."
"[19]Cof. Implorei a meus amigos e eles me iludiram. Meus sacerdotes e os anciãos pereceram na cidade enquanto buscavam alimento para revigorar as forças."
"[20]Res. Vede, Senhor, a minha angústia! Tremem minhas entranhas, e meu coração está perturbado por causa de minhas revoltas. De fora mata a espada, de dentro alastra a morte."
(Lamentações 1,18-20)

Deus, Tu bens sabes, a glória ensorbece e a humildade pouco apetece. Não que saiba de modo vivencial, mas sabe pela debilidade que o homem se encontra. O homem, Vossa criatura, sofre por a Ti não te ver mais do que deve. E não vê porquê não é digno. E eu de nada sou útil, já que me desviei de Ti e sou tão impuro quanto aqueles que mal acuso. Decepciono-me com o óbvio: tal como me movo pelo vento, em passo insólito, abrigo-me no sofrimento pelo mundo vão que me decepcionou e assim necessariamente seria. Minha burrice, meu Deus, perdoai. Dai-me um tanto de Sua luz, renovai-me com Teu Espírito Celeste.

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Novas Aquisições





Novas aquisições:

    A "Bíblia do Peregrino" e "Didaqué".
    A "Bíblia do Peregrino" é uma Bíblia de tradução de enfoque poético, mas não se engane pela beleza do livro: ele também apresenta uma série de notas que enriquecem a leitura do livro, e também preenchem boa parte dele - o que é ótimo: a Bíblia é um livro absurdamente difícil de ler e requer anos e anos de erudição para se ter uma compreensão parca dela. Embora muitos incautos pensem que podem interpretar a Bíblia literalmente - o que seria analfabetismo metodológico puro e simples.

    Já o "Didaqué" apresenta tradução bilíngue: está em grego e português. É um livro de suma importância e era utilizado pelos primeiros cristãos para instrução. Apesar do pouco tamanho, meras 49 páginas, ao se engane: o livro é bastante profundo, além do valor propriamente histórico.

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Metodologia da Esperança: a profecia primordial da humanidade!



Que das minhas feridas
Saia poder pra curar
Que cada hora perdida
Me lembre que não é pra eu parar
(Rodolfo Abrantes - Até que a casa esteja cheia)

    Existe uma profecia que nunca deixou de ser afirmada, pouco se importando o período histórico. Existe uma profecia primordial que só pode ser intimamente afirmada e não pode ser nunca intimamente negada, pois até o suicida quer uma expansão, pois até o suicida visa se conectar: mesmo que com uma última mensagem. Essa é a profecia da vida. É a vida, a vida imortal, é a profecia primordial da humanidade. A verdadeira profecia não é só verdadeira, como se cumpre. O profeta não é só aquele que diz a verdade, mas aquele com que a verdade concorda e faz cumprir o que ele afirma. No peito de cada homem há um coração que diz: "o ser é". O ser é, o ser não está, o ser é. E a afirmação de que o ser é, é a profecia de que a vida resistirá a morte. É a profecia da esperança. Essa profecia da esperança é sustentada em cada peito humano. Essa profecia é a verdadeira tradição, a tradição das tradições, pois: "Os céus e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais passarão" (Mateus 24:35). É como a música de Rodolfo Abrantes citada no começo dessa postagem: mesmo que eu seja ferido, mesmo que eu perca tempo, eu devo saber que não devo parar. O ser é, mas tudo leva a crer que não pode sê-lo. Só que o ser precisa lutar para ser. Essa é a condição tensional da vida.

    O que nos deprime não é a vida, mas a ausência de vida. Tal como o que nos mata não é a vida, mas aquilo que nos priva dela. O assassino não assassina alguém dando a esse alguém mais vida, mas privando esse alguém de vida. Acreditar que o assassino transmite ao assassinado a vida é o mesmo que pensar que ficamos deprimidos pela vida e não pela ausência dela. O deprimido não está deprimido por causa da vida, mas por causa da ausência de vida: é a incapacidade conectiva e expansiva que lhe deixa deprimido. É a irrealização do ser que deprime o deprimido e não o contrário. Um deprimido é um não realizado, é um ser privado de ser, é um ser que padece do não-ser. É por isso que a frase de Cristo é: "O ladrão não vem senão a roubar, a matar, e a destruir; eu vim para que tenham vida, e a tenham com abundância" (João 10:10). A cultura da morte separa o ideal do real. Ela prende o ser no peso do real ou na alienação da pura idealidade.

     Para fins meramente ilustrativos, é preciso dizer certas coisas que podem ser contundentes. Algumas vezes acabamos por nos perder em alguns pensamentos pela falta de parâmetros. Muitas pessoas ficam pensando sobre a idealidade e a realidade, só que elas creem que há uma diferença muito grande entre realidade e idealidade. Sim, eu também compreendo essas duas "condições" como diferentes, todavia creio que há uma terceira forma: a expressão comunicativa do ser. Entre o real e o ideal há um intercâmbio que traz a comunicação entre essas duas condições. Nossa vida é, propriamente, a expressão desse intercâmbio.

    Essa postagem fala da esperança. Esperança que não se finca inteiramente no ideal e nem se esmaga inteiramente pelo real. A esperança é um contínuo caminhar que conecta sempre o real e o ideal. Ela é, propriamente, isso: a tentativa de junção do ideal e do real. Aquele que não caminha, não crê. Aquele que crê, caminha. É preciso crer e caminhar. Creio que poderia dizer que entre o ideal e o real há uma caminhada que une os dois. Há uma tentativa. A esperança é a busca de conectar a realidade com a idealidade. Sem isso, ela é vã. Você não pode tão somente desejar, você precisa buscar o desejo. Buscar o desejo é transformar o desejo em vontade. Conforme o desejo é transformado em vontade, ele se torna mais racional e ao mesmo tempo mais concreto. Visto que se caminha e se pensa como chegar. Cria-se aquilo que chamamos de intencionalidade. 

    O que move o ser é a beleza "tão antiga e tão nova", pois o ser absoluto, o sumo ser, que é Deus: é sempre tão antigo e tão novo. E assim o é pelo fato de que aquilo que temos de Deus é o cumprimento daquilo que será a afirmação mais radicalmente plena do ser: a alma imortal. Caminhamos para o Reino de Deus que cumprirá o fim da escassez e o reino absoluto da plenitude. A suma felicidade é afirmação de que o ser é. "Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti", afirma Santo Agostinho em seu livro "Confissões". O que muitas vezes no segura na Terra é essa parcialidade, essa parcialização, esse constante caminhar por privações. Caminha-se de privação em privação em vez de buscar a plenitude que é mais perfeita, por ser mais plena, que todas essas privações. Deus é a plenitude perfeita de todas as coisas, isso o torna mais perfeito do que todas as partes plenificadas, visto que ele é a união perfeita e plena de todas as partes plenas e perfeitas. 

5. Exalaste Teu Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus… de Quem separar-se é morrer, de Quem aproximar-se é ressuscitar, com Quem habitar é viver. Deus… de Quem fugir é cair, a Quem voltar é levantar-se, em Quem apoiar-se é estar seguro. Deus… a Quem esquecer é perecer, a Quem buscar é renascer, a Quem conhecer é possuir. Foi assim que descobri a Deus e me dei conta de que, no fundo, era a Ele, mesmo sem saber, a Quem buscava ardentemente o meu coração. (Santo Agostinho, Confissões)


    Essa série de afirmações brutais e fulminantes caracterizam uma consciência sensata quando encontra o objeto formal de toda consciência sensata: a suma complexidade divina. Visto que tudo que sei de Deus é pouco. Todo conhecimento divino, todo conhecimento teológico é muito pouco: Deus, suma complexidade, nunca será abarcado pelo intelecto humano e por isso é nosso objeto de adoração! Só aquilo que nos ultrapassa transcendentalmente de forma inequívoca é aquilo que pode corresponder a nossa contínua insatisfação. A nossa insatisfação tem o tamanha de Deus, a nossa insatisfação é infinita e só um Deus infinito pode corresponder a essa insatisfação infinita.


13.Respondeu-lhe Jesus: “Todo aquele que beber des­ta água tornará a ter sede, 14.mas o que beber da água que eu lhe der jamais terá sede. Mas a água que eu lhe der virá a ser nele fonte de água, que jorrará até a vida eterna”.
São João, 4:13-14 - Bíblia Católica Online

    Se eu falar para você que o fim supremo da vida é a morte, você sentirá uma negativa constante que afirma o contrário: que o fim da vida é a vida. Se vive para se aproveitar a vida. E quanto melhor se vive, melhor é o viver. Já que o fim da vida é a vida. Se eu te falar que a derrota é melhor que a vitória, você também sentirá uma negativa constante, você sentirá algo tão claro quanto o chão que pisa: a derrota é a negação da vida e a vida tem como fim uma vitória constante e afirmativa. Há um saber que sabe que sabe. Um saber que quer superar. Um saber que quer crescer. Um saber que quer viver. E tal saber afirma triunfantemente a imortalidade e o paraíso: o homem não vive pela escassez e nem gosta da escassez, o que o homem quer é perfeição e plenitude. 

    A afirmação do ser perante o não-ser é o dever teológico primeiro. É quando o ser se torna mais pleno, quando o ser se torna mais capaz, que ele se torna mais feliz. A diferença entre o simbólico e o diabólico está no grau de participação. O ser só é ser quando o é em absoluto, logo o ser só é ser quando participante de Deus, que é onipresente. Quando buscamos a sabedoria, queremos ser capazes de responder todas as questões, sobretudo as questões que reverberam na intimidade das nossas entranhas: queremos e buscamos a onisciência de Deus. O objetivo da ciência é a participação na onisciência de Deus. Quando exigimos reformas, quando queremos mais justiça, quando queremos melhoras, queremos a plenitude da onipotência divina. O fim do poder não é a destruição dos sonhos: o fim do poder é a realização de todos os sonhos. Aquele que corrompe o poder é aquele que priva o ser de seu sonho, levando o ser ao não-ser. 

29.Jesus respondeu-lhe: “O primeiro de todos os mandamentos é este: Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor; 30.amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu espírito e de todas as tuas forças. 31.Eis aqui o segundo: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Outro mandamento maior do que estes não existe”.
São Marcos, 12:29-31 - Bíblia Católica Online


    Por que amar a Deus em primeiro lugar? Para que tal mandamento? É pelo seguinte: Deus tudo é. Sendo Deus tudo, conectarmo-nos com ele é estarmos junto de tudo. Sem ele, estamos presos em alguma particularidade que nos prende e nos desconecta da existência. O objetivo de amar a Deus é amar a tudo. E é nesse sentido que vem o "amar o próximo como a ti mesmo": amar a Deus é se abrir, aquele que não ama o próximo, não pode amar a Deus. Se Deus está em tudo, Deus está presente no próximo, negar a amar o próximo é negar a amar a Deus. É por isso que se deve amar primeiramente a Deus. Aquele que ama qualquer outra coisa, ama-a parcializando-se. Parcializando-se, perde a conexão para com a própria vida.


    Essa é a metologia da esperança: crer e caminhar. Caminhar exige realidade. Crer exige fé. É preciso não só crer, mas expressar o que crê na realidade. É preciso não só amar o ideal, mas colocá-lo no real. É preciso ser absurdamente realista para expressar o ideal de alguma forma no real. Ignorar a realidade é incapacitar a expressão do ideal. Aquele que se prende no ideal, torna-se alienado. Aquele que se prende no real, torna-se escravo. Na realidade, o peso nos esmaga. Na idealidade, flutuamos infinitamente, fugindo eternamente da Terra. É preciso estar com os pés no chão e a cabeça no céu. Isso é aquilo que chamo de metodologia da esperança: é preciso crer e caminhar, mesmo que às vezes a caminhada contradiga a fé e que a fé contradiga a caminhada. A doutrina é a expressão da conexão do real com o ideal. Aquele que melhor conectar as duas instâncias melhor se expressará como ser humano. Tudo isso pode ser resumido na frase de Santo Inácio de Loyola: "ore como se tudo dependesse de Deus e trabalhe como se tudo dependesse de você", essa é a metodologia da esperança.