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quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Acabo de ler "How Marxism Works" de Chris Harman (lido em inglês/Parte 4)

 


Nome:

How Marxism Works


Autor:

Chris Harman


O que diferencia o homem dos outros animais? Talvez as centrais diferenças dos homens para os outros animais está na forma com que vemos o mundo a nossa volta. Temos uma consciência mais elevada não só de nós mesmos, mas do mundo ao redor. Consciência suficientemente boa para poder moldar a realidade por meio da transformação do meio.


A animalidade tende, no geral, a se proteger do meio. A humanidade se distingue da animalidade geral pela alteração do meio. O progresso cultural não é apenas um progresso imaterial, é um progresso da humanidade em relação a alteração do meio. Alteração do meio com o propósito de atender as necessidades, sonhos e ambições dessa humanidade.


A humanidade altera os meios para comportar a própria humanidade. A humanidade transforma desejo em verdade. É evidente que falhamos e erramos diversas vezes nesse processo, mas o fato inegável é que a humanidade continua. Sempre em frente, alterando cada parte em prol dum objetivo.


A interação entre anseios humanos e meios gera diferentes formas de relação. Essas relações são pautadas pela distribuição dos recursos. A distribuição dos recursos é pautada, por sua vez, na capacidade de produzir.  Quando os meios de produção mudam, muda-se também a cultura. As forças de produção alteram sociologicamente as relações de produção.


Os idealistas acreditam que podem mudar o mundo pelos céus, os mecanicistas materialistas acreditam que a natureza humana não é modificável. A história demonstra que os meios de produção alteram a cultura.


A mentalidade também é preocupante nesse caso. A mudança tecnológica é muitas vezes paralisada em prol de um tipo de privilégio que não se quer perder. Então os poderosos se juntam e entravam o desenvolvimento da tecnologia. Não é um fatalismo tecnológico, existe também relações sociais que permeiam o avanço e o entrave.

segunda-feira, 8 de julho de 2024

Acabo de ler "DICTADURAS MILITARES Y LAS VISIONES DE FUTURO" de Gabriela Gomes (lido em espanhol/Parte 4 Final)

 


Um Estado é uma visão de um projeto e a realização de um espírito. A ausência de um projeto dificilmente levará a unidade nacional. Logo se faz necessário que a nação tenha um identificação coletiva baseada no cumprimento duma missão civilizada.


Quando os militares assumiram o poder do Chile, quiseram refundar a sociedade e até mesmo a sua mentalidade. A sociedade chilena era vista pelos militares como extremamente estatista, o que a deixa suscetível a mentalidade socialista. Os militares trataram logo de implementar medidas de descentralização, diminuição do gasto público e diminuição do Estado, deixando a iniciativa privada ser o principal motor econômico. Na Argentina, o projeto refundacional deixaria a cargo da iniciativa privada tudo que não ferisse a assim chamada segurança nacional.


Essas iniciativas demonstram o desprezo dos tecnocratas ante ao povo. Isto é, eles creem que o povo não pode governar por si mesmo. Antes disso, o povo deve se elevar a tal ponto que chegue ao desenvolvimento cultural compatível com o nível de um tecnocrata. Essa inferiorização separa o restante da sociedade dos tecnocratas, supostamente portadores de uma visão superior e responsáveis pelos rumos do país. O que não é outra coisa que escravidão política.


Na futurologia argentina, se planejou um desenvolvimento agroindustrial, em que haveria uma implementação de uma modernização industrial. Assim acreditavam que teriam um valor agregado. Além disso, acreditavam que só com o desenvolvimento de uma mentalidade científica-tecnológica seria possível que a Argentina se tornasse uma nação moderna. Graças a isso, investiram também na cibernética, seja no campo da educação (preparando as pessoas para o ano 2000), seja na própria indústria. Computação e informática também foram preocupações do regime chileno, visto que elas se tornariam os motores do desenvolvimento em tempos posteriores.


Olhando hoje, não vemos nem o Chile e nem a Argentina como nações desenvolvidas e capazes de fazer frente aos EUA e Europa – além de, é claro, a China. Apesar de várias boas intenções dos tecnocratas, creio que não foram completamente exitosos em suas intenções. Será que o custo política, social e cultural foi adequado? Promoveu-se a escravização política de sociedades inteiras na promessa de um "futuro melhor" em que essas duas nações seriam equiparáveis a Europa e Estados Unidos, mas se entregou duas nações dependentes e que não tiveram suas prometidas elevações.

quinta-feira, 21 de julho de 2022

A Solidão de uma Consciência Precária

Sou pobre, mas não tenho que trabalhar. No futuro que vivo, a automatização industrial a tudo abarcou e toda produção é feita pelo maquinário em sua precisa precisão. Não há possibilidade de inconveniência de erro humano. Até mesmo o antigo telemarketing, bastião da antiga liberdade e inimigo da nova liberdade, é feito por um robô inteligente que aprende a cada ligação – sua erudição é melhor que a minha porca educação. Vivo num futuro tão distante que nenhum olhar pode olhar, não pode olhar nem para mim e nem para o que se há. Deus? Aqui não há. Nada pode olhar, nada pode salvar, nada pode olhar e me salvar.


Minha casa é um cubículo, só que posso comer toda comida que quero – tudo é entregue, tudo é dado, tudo é público, gratuito e de qualidade – e posso ficar dias e dias a me masturbar pra o computador que transmite toda pornografia que necessito para preencher o buraco do vazio afetivo que quero fechar. Se a pornografia se mostra ou se demonstra insuficiente, posso apelar para um robô sexual que a tudo que é sexualmente conveniente me dá. Claro que tudo é transmitido informacionalmente para uma série de registros globais.


O futuro dá o necessário e o supérfluo, o futuro dá o necessário e o essencial, o futuro dá o transcendental e a revolução – toda grande conquista que demorava e era tardia pode ser simulada com retidão de perfeição. Quando entro na internet, tenho que apenas dar a minha digital e toda informação que vejo, é logo alicerçada a minha pessoa. Se faço mal, recebo algum guia educativo que sou obrigado a engolir e estudar. Se persisto, vou para um centro educacional no qual aprendo todas as verdades necessários nesse novo tempo vital e sem vida. O mundo é tão bom que corrigiu a própria natureza humana, impediu todo tipo de opressão e negatividade. Ninguém mais sofre pelo ideal e nem mais busca o paraíso – já que esse é mais real do que a realidade. É o perfeito comunismo, mas é também o paraíso liberal e a anarquia simulada. No passado, tinham-se pais e países, hoje a educação é feita e controlada por instituições que nos criam. Não fui concebido e nem amado, fui criado em um laboratório geral e ensinado numa língua universal.


Quando aboliram as diferenças das línguas por um tradutor universal, logo em seguida sugeriram uma linguagem universal. Depois da linguagem universal, veio-se a verdade universal. Só que, nesse ponto, tudo podia ser interpretado por todos e todos viraram fiscais de todos. Se todo pensamento era publicável, todo pensamento era fiscalizável e tudo acabaria num gigantesco processo crítico de grupos de pressão que revisavam inquisitorialmente a humanidade para que ela se tornasse mais perfeita e plena. Com o tempo, toda informação foi sendo filtrada por efetivos meios de localização que localizam todo aquele que falava, condicionando tudo o que podia e o que não podia. Tudo tornou-se tão universal que foi necessário câmeras em todos os lugares, que todos os dados fossem públicos e acessíveis, até mesmo dentro de casa – a intimidade do lar foi parte dum reacionarismo tardio que precisou ser corrigido com o mais novo progresso humano.


A internet, como dizem as fontes antigas, destruiu a diferença da informação e possibilitou que toda informação ao mundo rondasse. O espaço-tempo tornou-se relativizado pelas fronteiras informacionais sendo sistematicamente quebradas. A realidade virtual substituiu a realidade e logo vimos que a realidade virtual poderia ser despida de toda inconveniência humana – como o racismo, a desigualdade e aquela coisa que chamavam de religião. Tão logo se percebeu que poderíamos ter um mundo inimaginável já que condicionado ao imaginável e a sua perfeição idealística. Logo, pelo maior amparo da ciência, ligou-se a realidade virtual com uma efusão de sentimentos virtuais criados por máquinas e que dão felicidade de forma rápida e eficiente. Quando esse ponto chegou, a tecnologia já tinha feito do trabalho físico como uma idiotice do passado, algo completamente desnecessário e a realidade virtual superou a realidade real em perfectude – ao menos na emulação de conquistas humanas.


Num mundo onde não há trabalho, num mundo onde a realidade virtual se tornou o melhor amparo emocional, num mundo onde toda emoção pode ser simulada pela mais perfeita máquina, num mundo onde toda conquista pode ser reproduzida e simulada dando um sentimento transcendental, qual seria o problema? Não há mais problema, tudo é perfeito. Às vezes tão perfeito que me enoja. Só que toda perfeição tem um preço! Para abolir os problemas de sexo e de gênero, criaram-se hermafroditas perfeitos e todas as roupas não possuem mais sexo ou gênero. Ninguém é mais homem, mulher ou variação. Tirou-se também a menstruação e o velho esforço patriarcal masculino. Para garantir a liberdade humana, humanos não mais podiam engravidar, já que a gravidez gerava uma série de consequências e imprevistos. Para impedir o preconceito dos pais, agora todos os novos humanos são gerados em laboratórios e criados por sólidas instituições universalmente aceitas. Para impedir todas as divergências religiosas, criou- se uma única religião – que é vaga, abstrata e a tudo convém. Destruiu-se toda linguagem para que todos se entendessem, só que isso gerou o fim da identidade de pessoas e tribos. Não existem mais dialetos. Todas as cores humanas foram sincretizadas num ser único que não poderia mais se revoltar em sua raça – já que não havia qualquer diferença plausível, seja estética, seja intelectual, seja identitária. Toda expressão nacional foi abolida, já que as barreiras nacionais eram absurdas para um mundo tão englobalizado pela globalização. “Imagine” não é mais ideação, é fato.


Se você pensa sobre a situação de jornais nesse estado atual da humanidade, saiba que agora temos checagens internacionais e tudo passa por um padrão global que não permita qualquer divergência com esse mesmo padrão global. As instituições emissoras de informação formam um grande monopólio universal de padrão universal e não há diferença no que notificam, já que estão em perfeita harmonia universal e universalizante. Se toda revolução informativa no passado gerou uma descentralização informacional, tal descentralidade foi resolvida com centralização universalizante e isso foi possível graças a natureza da era digital que podia entrar em contato com todos. 


Toda vez que uso banheiro, vejo a câmera a me olhar. Toda vez que entro no computador, sei que meus dados são compartilhados em tempo real e são fiscalizados pelos mais fantásticos agentes que só querem o meu bem. Toda vez que transo virtualmente, meus dados são compartilhados e serão reunidos em novas soluções científicas que darão mais e mais felicidade simulada. Toda revolta pode ser superada por um remédio e até a tristeza poética se consegue com um simples remédio ou uma realidade virtual que nos transborda de grandes amores. 


A linguagem antiga foi sendo resolvida com uma revisão universalista. Até livros nocivos como a Bíblia, a Torá e o Alcorão foram sendo revisados e reescritos conformes o padrão universalista. Naquele tempo, a linguagem se tornou neutra e o a pretensão universal de cada religião foi sendo localizada numa grande religião global. Alguns se assustaram quando uma série de intelectuais ilustres e progressistas lançaram um novo livro religioso. Alguns disseram que a religião deveria ser abolida. Outros disseram que a religião tinha acabado numa mensagem revelada em dada época. Tolos, simplesmente tolos: se o abraamismo foi criado em épocas específicas e com mensagens específicas, uma nova religião global tinha que chegar algum dia e essa religião seria mais do que definitiva, superando todas as carências religiosas anteriores. O novo livro religioso reunia a nova humanidade religiosa.


A única coisa que me preocupa é o fato de que surgiu mais uma nova tecnologia. Não que eu queira ser reacionário para com tanta igualdade e felicidade. Não que eu queira atacar a liberdade da realidade simulada. Longe de mim ser contra tal progresso. É que agora eles podem também alterar os estados de minha consciência, incluindo mentalidades e ideias, substituindo mentalidades “defeituosas” por novas mentalidades progressas. Querem até mesmo abolir a separação entre as diferentes consciências. Eles anunciaram: a mente humana é o último entrave ao progresso, a individualidade é um erro e a consciência individual deve ser abolida. Se a mente era, até agora, o único ponto de divergência num mundo igualitário e perfeito – agora até mesmo a consciência pode ser cientificamente condicionada para mais felicidade humana. Enquanto eles colocam o maquinário na minha cabeça e meus pensamentos são registrados nesse relatório que vocês leem, eu tenho muito medo e… Na verdade, essa foi a melhor coisa que me ocorreu, para que serviria essa bobagem de consciência individual? Agora a humanidade é toda um único ser acoplado entre si, nem a solidão mais existe e tudo é um. Fui liberto de mim. Fui salvo de mim mesmo. Não há mais sofrimento e solidão. Obrigado, agradeço- lhes por terem abolido a solidão de minha consciência precária.