sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Novas Aquisições!



   
    O primeiro livro, "Natureza e Missão da Teologia", é do Joseph Ratzinger. Se o nome lhe soou estranho, distante e meio desconhecido, já lhe explico: trata-se do Papa Bento XVI. Se perguntam qual será a qualidade do livro, Bento XVI era conhecido como: "O Teólogo", basicamente uma das figuras mais ilustres da teologia católica e um dos papas mais inteligentes da história. 

    Já o segundo: "O Clube de Negócios Estranhos", é de Chesterton. Tive pouco contato com a obra literária (aqui no sentido de "ficcional") de Chesterton, mas o contato que já tive - sobretudo em alguns contos do Padre Brown - prima pela mais alta beleza e engenhosidade. Estou doido para ler esse livro, mas ele terá que esperar na longa lista de leituras que o antecedem. De qualquer modo, exímia aquisição

Acabo de ler "Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban" de J. K. Rowling

 



    Se há algo de espacial para se comentar sobre esse livro é a evolução da narração literária da escritora. É incrível como o mundo criado por ela ganhou mais ricos detalhes e a história amadureceu muito mais do que no segundo livro, embora eu ainda creia que as pessoas dão menos crédito ao segundo livro do que ele de fato merece. Mesmo assim, digo-lhes: esse terceiro livro é fantástico e é, até o presente momento, um dos livros de Harry Potter que mais gostei de ler.


    O livro tomou um ar mais sombrio e a presença dos malignos dementadores deixou o mundo mágico com toques de malignidade bem adulta. A ideia de morte e sofrimento é mais bem trabalhada nesse livro e tom cômico infantil vai, gradualmente, adentrando num humor um tanto sarcástico. Creio que o humor pitoresco, trocado pelo sarcástico, foi pouco a pouco sendo trocado para o amadurecimento narrativo e o próprio crescimento de Harry Potter enquanto personagem.  Finalmente podemos ver consequências mais severas, sem aquele ar de que tudo pode terminar em feijoada e pouco importando o rumo tomado - coisa que me enjoa nos filmes da Marvel.


    A sensação que me domina é essa: hoje compreendo muito mais o bom gosto que as pessoas tinham ao ler Harry Potter. Dir-lhes-ei mais: os livros são bem mais legais que os filmes, embora o Harry Potter 1 e 2 do PlayStation 1 ainda sejam, em meu coração, adaptações magnânimas do universo do bruxinho. Sem dúvida logo engatarei na leitura do próximo livro. E, sim, estou maravilhado e contente com essa experiência fantástica!

Acabo de ler "Harry Potter e a Câmara Secreta" de J. K. Rowling

 


    "São as nossas escolhas, Harry, que revelam o que realmente somos, muito mais do que as nossas qualidades" (Dumbledore)


    Quando terminei de ler o primeiro livro, senti logo vontade de ler o segundo livro. E, apesar de alguns não gostarem tanto dele assim - julgam-no como um livro de menor importância  -, acabei por gostar bastante da experiência. Tenho-no como uma evolução do primeiro, mas aviso aos imbecis ideológicos: "evolução", em meu linguajar, não indica superioridade alguma, mas sim uma forma de continuidade que pode ou não ser boa. No caso, vejo-o como uma grata expansão do primeiro. Acentuando claramente o potencial da história e amadurecendo o mundo do Potter.


    É incrível ver como a história apresenta uma série de mal-entendidos e como Potter é confundido, preconceituosamente, com um mago das trevas. E como nazismo, magia negra e sonserinismo se aparentam, Harry enfrentou vários problemas por causa dessa visão de que ele era o herdeiro de Salazar Sonserina. Até mesmo falar com cobras - possivelmente ele estava falando em alemão,  mas não façam isso em casa - garoto podia e acabou por ser visto por toda a escola como um grande estorvo e até mesmo como um assassino.


    Quanto a comparação ao livro anterior, dir-lhes-ei que esse ainda preza pelo tom cômico, mas a característica sombria de que as pessoas podem sofrer foi mais acentuada. O que dá ao livro um tom bem mais sombrio e adulto. Fora que somos apresentados ao passado de Voldemort e as suas ligações e rivalidade com Harry Potter.


    Livro excelente, vale a pena dar uma olhada e, quiçá, ler todos os outros livros e se inteirar no mundo fantástico de Harry.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Diários Cadavéricos #3 - Espírito Celeste

 "Não obstante, eles adoram, em vez d'Ele, divindades que nada podem criar, posto que elas mesmas foram criadas. E não podem prejudicar nem beneficiar a si mesmas, e não dispõem da morte, nem da vida, nem da ressurreição"

(Surata 25:3)


Se eu morresse hoje, estaria completamente insatisfeito. É difícil, meu Deus, não cair na idolatria quando o peso do mundo bate forte. E, se assim o é, é pelo jogo gravitacional das relações humanas e meu parco caráter. Sei que sou moralmente fraco, e minha performace social a isso indica: não sou o que sou, sou a negação do que deveria ser. Só que tão grandes são as vozes sociais que minha mente de Ti distoa por causa de vários gritos.


"15. Pergunta-lhes: Que é preferível: isto, ou o Jardim da Eternidade que tem sido prometido aos devotos como recompensa e destino,"
"16. De onde obterão tudo quanto anelarem, e em que morarão eternamente, porque é uma promessa inexorável do teu Senhor?"
(Surata 25:15-16)

Deus, sou um traidor, mas sei que és glorioso e misericordioso. Só que a sociedade me traz um jugo idólatra, já que a ela sou temente. O sofrimento psíquico se condensa e condena junto com o inferno vindouro, já que o caminho do idólatra nada mais é que o desvio da senda reta. Por temer tanto a sociedade, por ser com ela um covarde, sigo o caminho da vã vanidade. A ela atribuo mais do que é capaz, faço por temor e complacência, mas nada dela vem de modo autogerado, já que só Deus é capaz de criar. Então, pergunto-me: por que temo esse deus de barro e não me aconchego em Ti, verdadeiro Deus?

"[7]Zain. Nestes dias de males e vida errante, recorda-se Jerusalém das delícias dos tempos idos. Agora que seu povo sucumbiu sob os golpes do inimigo e ninguém vem socorrê-la! Olham-na seus inimigos, e zombam de sua devastação."
"[8]Het. Graves foram os pecados de Jerusalém: ela ficou uma imundície. Quem a honrava, agora a despreza porque lhe viram a nudez. E ela geme e esconde o rosto."
(Lamentações 1,7-8)

Lamento agora a vanglória de outrora. Meu pensamento perdeu retitude e atitude. Conforme esmorecia, ajuntava-me a tragédia de minha comédia. A Tua lógica não é dos homens e a lógica dos homens é torta. A Tua senda é reta, mas a senda dos homens engendra tragédias com pratos cheios de aparentes comédias. Se assim é, sou tolo. Guia-me, Alá, a Tua senda reta. Já que sofro mais por ter te esquecido do que por ter te seguido. Se tivesse te seguido, não me surpreenderia com os ventos mutantes que mudam os rumos dos homens e nem edificaria morada em areia movediça. Como assim fiz, vi meu império de areia ruir. Já que o homem abandona e só o Senhor cuida do homem abandonado.

"[18]Sade. O Senhor é justo, porque fui rebelde à sua voz. Escutai todos vós, ó povos, e vede a minha dor. Minhas virgens e meus jovens foram conduzidos para o exílio."
"[19]Cof. Implorei a meus amigos e eles me iludiram. Meus sacerdotes e os anciãos pereceram na cidade enquanto buscavam alimento para revigorar as forças."
"[20]Res. Vede, Senhor, a minha angústia! Tremem minhas entranhas, e meu coração está perturbado por causa de minhas revoltas. De fora mata a espada, de dentro alastra a morte."
(Lamentações 1,18-20)

Deus, Tu bens sabes, a glória ensorbece e a humildade pouco apetece. Não que saiba de modo vivencial, mas sabe pela debilidade que o homem se encontra. O homem, Vossa criatura, sofre por a Ti não te ver mais do que deve. E não vê porquê não é digno. E eu de nada sou útil, já que me desviei de Ti e sou tão impuro quanto aqueles que mal acuso. Decepciono-me com o óbvio: tal como me movo pelo vento, em passo insólito, abrigo-me no sofrimento pelo mundo vão que me decepcionou e assim necessariamente seria. Minha burrice, meu Deus, perdoai. Dai-me um tanto de Sua luz, renovai-me com Teu Espírito Celeste.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Diários Cadavéricos #2 - Soberba

Diários Cadavéricos - Soberba


"Indubitavelmente Deus conhece tanto o que ocultam, como o que manifestam. Ele não aprecia os ensoberbecidos" (Surata 16:23)


Sou absurdamente soberbo, tão soberbo quanto medíocre. Minha obra é um peido comparado aos que me precederam e insisto em permanecer ridículo por causa de meu alto ego. Faz muito tempo que não escrevo com seriedade e ocupo-me com vanidades. Deus, pesa-me a minha falta de caráter e a impossibilidade de agir por preguiça e humor flutuante. Só que eu escondo: não sou feliz com o que escrevo, já que o que escrevo é precário. Contento-me, então, com escrever mal e mediocremente.


Se eu morresse hoje, nada de feliz eu teria. Sentir-me-ia incompleto, com jeito de mal-acabado. Quase tudo que quero fazer, não fiz. Como posso me sentir feliz? Falta-me práxis. Só que tudo é tão difícil e mutável que parece que a imutabilidade divina Daquele que É não existe. Como enxergar um Deus imutável numa mundanidade líquida? Como ver através do reino das aparências mutáveis enxergando a Ordem Oculta atrás disso? Parece que há mais abstração nos assuntos teológicos que uma ordem invisível que a tudo transcende. E, se assim escrevo, escrevo-lhe por minha tendência agnóstica. Como não confio em minha razão, de Ti igualmente desconfio, já que não posso prová-lo, seja por burrice, seja por incapacidade de alma ou de vivência.


"Dessa forma, por Zeus, teremos de admitir que, assim como as outras artes se aperfeiçoaram a ponto de fazerem figura feia os artesãos antigos, em comparação com os de agora: diremos também que vossa arte particular, a dos sofistas, progrediu, e que os antigos, em confronto convosco, são principiantes em matéria de sabedoria?" (Hipias Maior - Sócrates).


Quando eu me tornei tão arrogante e esquivo? Quando eu passei para as sombras, fugindo de minhas obrigações e lutando para omitir meus movimentos preguiçosos e covardes? 


Minha percepção soberba volta-se contra Ti. É como ver uma obra caótica sem Criador. E eu mesmo sou caótico, seja em questão de gênero ou em filosofia. O sofrimento é inalterável num mundo alterável e alteridade sem fim quase sempre implica em sofrimento. Escrevo em lamúrias, já que sou inconstante e constantemente melancólico.


"Ela chora pela noite adentro, lágrimas lhe inundam as faces, ninguém mais a consola de quantos a amavam. Seus amigos todos a traíram, e se tornaram seus inimigos"
Lamentações 1,2
"E lançamos, no Livro, um vaticínio aos israelitas: causareis corrupção duas vezes na terra e vos tornareis muito arrogantes"
Surata 17:4


A natureza do pensamento dos antigos é essa: toda vez que uma parcialidade redutora chegava ao pensamento, diziam que Deus é maior. Assim evitavam qualquer idiotice redutor. No caso, Israel chora pelo seu povo oprimido e abandonado, o que prova a volatilidade traidora dos interesses humanos. Como homem, só posso ser traidor e traído. Ora reclamo a Deus o ataque aos que me traíram, ora peço a Deus o perdão de minhas traições, já que suporto, como hipócrita, mais minhas traições do que as de outrem. Embora, perante Deus, sejam iguais em iniquidade. E, perante minha personalidade, tenha natureza de peso assimétrico. Tornei-me arrogante e indolente com a conquista adquirida, essa é a arrogância humana.


A relação que devo ter contigo é de abertura, já que Ti não é abarcado por minha redutibilidade e adquiro-Te reduzindo-O. Se assim o é, é por minha deformidade humana. Só que todo avanço pode, em minha pessoa, virar regresso com a redução de Ti a parte recebida.

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Novas Aquisições





Novas aquisições:

    A "Bíblia do Peregrino" e "Didaqué".
    A "Bíblia do Peregrino" é uma Bíblia de tradução de enfoque poético, mas não se engane pela beleza do livro: ele também apresenta uma série de notas que enriquecem a leitura do livro, e também preenchem boa parte dele - o que é ótimo: a Bíblia é um livro absurdamente difícil de ler e requer anos e anos de erudição para se ter uma compreensão parca dela. Embora muitos incautos pensem que podem interpretar a Bíblia literalmente - o que seria analfabetismo metodológico puro e simples.

    Já o "Didaqué" apresenta tradução bilíngue: está em grego e português. É um livro de suma importância e era utilizado pelos primeiros cristãos para instrução. Apesar do pouco tamanho, meras 49 páginas, ao se engane: o livro é bastante profundo, além do valor propriamente histórico.

sábado, 18 de dezembro de 2021

Antropoteísmo sem Antropos

Mãe, eu tenho trabalhado sem trabalhar o dia inteiro. Procurando na melancolia a flor. Nas cidades, com a urbanização e a consequente inconsciente escravização dos homens, não crescerão jamais flores para a verdadeira alegria dos homens.


Nossas casas são prisões  contra os tormentos, nossos risos são peças de teatros, não somos travestis, mas travestimo-nos para continuar a trabalhar. Trabalhar a moralidade ególatras de alcoólatras martirados pelo fogo, marginalizados pelo medo de infeliz ficar sem a selva de vaidades sem tréguas. Os presos não escondem os edifícios e nem aquilo que é difícil. A morta é tão morta quanto a própria morte. O tiro é mais eutanásia sem pressão do que uma pressão de que aqui devo ficar.

Eutanásia nesse mundo é piedade. Eutanásia nesse mundo é ortonásia do que eutanásia. E as drogas só continuam a provar que o a Terra é mais Inferno do que o Inferno. O anjo caído sempre anda com novas asas. O anjo caído é tão escuro quanto e como minha pele. E se for parente meu, não o jugo pelo jugo.

Meu sonho mais tenro é um trem me espatifando e fincando nos anônimos habitantes terrestres de nossas cidades. Cidades cercadas de opressão circundante, infernizante e marginilizante. Fui concebido no céu e nascido do inferno. Se eu soubesse que hoje o útero ainda é melhor que o Inferno Vivante, preferia o castelo uterino que a essa realidade tão ruim.

Já fazem oito anos que o Inferno se fez Terra. Já fazem oito anos que a disparidade não mais engana. Já fazem oito anos que o mel é suicídio e o fel é a vida. Já fazem oito anos que entro em delírio saltitante que sonho com a punição de um Deus impassível. Já fazem oito anos que entro na caverna prisional do Deus Dragão martirizante. Já fazem oito anos que dormir pra caralho é melhor do que trepar. Já fazem oito anos que tenho amado sem amar. Já fazem oito anos que o vinho é sempre sem açúcar, que o chá vem sempre frio e que o café é sempre naturalmente salgado. Eu não sou tão cristão quanto Plínio Salgado, mas sou tão impuro quanto Rousseau. Não sou Lutero com 95 sentenças, sou Lutero com novecentos e noventa e nove penitências, tal como se eu fosse mais Legião do que Cristo.

Eu não amei o suficiente, mas tive dose suficiente de insuficiência. Vontade de poder sem metáfora. Se eu não fosse tão marginal quanto a impotência, ao menos não seria tão fraco contra a idolatria social, antropoteísmo sem antropos. 

Acabo de ler "Harry Potter e a Pedra Filosofal" de J. K. Rowling.



    "Se existe uma coisa que Voldemort não consegue compreender é o amor. Ele não entende que um amor forte como o de sua mãe por você deixa uma marca própria. Não é uma cicatriz, não é um sinal visível... ter sido amado tão profundamente, mesmo que a pessoa que nos amou já tenha morrido, nos confere uma proteção eterna. Está entranhada em nossa pele" (Dumbledore).


    Ler Harry Potter depois de anos é uma maravilha. A primeira vez que o li, estava no segundo ano do ensino médio. Ou seja, há cerca de oito anos atrás. Não me lembrava do quanto o seu universo era curioso e nem o quanto o livro era engraçado em diversos bons aspectos. E digo-lhes o livro é melhor que o filme, embora eu o tenha assistido - o primeirão - enquanto ainda era só uma criança. Assisti-o naquela ferramenta tecnológica, hoje antiquada, chamada Fita Cassete. Até hoje me lembro de estar ao lado de minha irmã enquanto assistia o primeiro filme de Harry Potter, das poucas coisas que me lembro da infância, essa é uma das melhores.


    Talvez a serenidade da vida adulta tenha acalmado o desordenado senso de realidade que me fazia digerir livros rapidamente em minha tenra mocidade adolescente. Talvez eu tenha ficado lento e reacionário, mas tendo fortemente a gostar mais de produções literárias que audiovisuais. Muitas coisas hoje não me agradam, entre elas os memes e as microescritas e microleituras que dominam a internet atual. Só que hoje, afastado da reação espalhafatosa, creio que é melhor calar-se e curtir um "próprio" universo cultural do que entrar em briga com uma unanimidade de imbecis. 


    Se alguém disser que "Harry Potter" é insuficiente como produto literário, dir-lhes-ia que são poucos os capazes de criar universos ricos de sentido e que a beleza da vida está mais contida em coisas que não veem do que as que veem. 

    Quanto a velhice e a morte, fico com as palavras de Dumbledore:

    "Afinal, para a mente bem estruturada, a morte é apenas a grande aventura seguinte".

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Diários Cadavéricos #1 - Inluta

Se eu morresse hoje, sentir-me-ia triste. Sei que minha família me ama, mas queria algo quente vindo de outro alguém. Alguém não ligado pelo fogo do sangue. Se assim não é, o amor não me basta. Não é suficiente o amor que vem do sangue, já que ele é quase que necessário. O amor de sangue é necessário e gratuito, mas o amor do outro, que não de sangue, é apenas gratuito. É por isso que invejo quem ama e quem é amado.


A luta que "inluta" em meu peito é luta amarga, meu Deus. Eu receio desejar mais o amor do outro que o seu - e assim o é. Como humano, é-me mais fascinante o amor humano do que o divino. O divino me parece mais distante do que o próximo. Se não tenho amor das coisas visíveis, como posso sonhar com o amor do Deus invisível? Eu preciso de um amor de carne, estou sozinho e confuso. A cada dia mais, a consciência de sua presença se apaga.


"Os desígnios de Deus são inexoráveis; não trateis de apressá-los" (Surata 16:1)  

"Pede-me; dar-te-ei por herança todas as nações; tu possuirás os confins do mundo" (Salmos 2,8)


Os dois argumentos provêm do mesmo Deus. Só que a pergunta que vem é essa: quando devo pedir e quando devo esperar? Devo pedir e esperar? O meu coração é aflito e na obscuridade perece. Sinto saudades de minha mãe e de um amor tal qual dela: tão pulsante quanto seu coração batente. Só que o que tenho é: uma vida vácua de amor e espiritualidade, recheada de caminhos tortos e passos insensatos. Deus, afasto-me de Ti, já que a tua presença se apaga de minha vida. Não pela sua inexistência, mas pela minha impiedade. Sua glória é tão benigna que parece inalcançável e por ser tão benignamente inalcançável, soa-me como irreal, impossível e irreproduzível nesse Vale de Lágrimas.


"Ele criou, com justa finalidade, os céus e a terra. Exaltado seja, pelos parceiros que Lhe atribuem" (Surata 16:13).

"O rei Davi estava velho, avançado em anos, e por mais que o cobrissem de roupas, não se aquecia" (I Reis 1,1).


Deus, se a tudo você ordenou, a razão de meu conflito é como um pó que se desfaz com a vassoura do tempo. Do mesmo modo que Adonias governou por tempo delimitado, em aparente desordem, meu sofrimento é igualmente delimitado. Só que esse tempo delimitado, que para Ti é nada, para mim é muito. A desordem momentânea é sensitivamente eterna. Já que a ordem natural encerra o mal visto que por Ti ordenada. 


"Poder-se-á comparar o Criador com quem nada pode criar? Não meditais?

Porém, se pretenderdes contar as mercês de Deus, jamais podereis enumerá-las. Sabei que Deus é Indulgente, Misericordiosíssimo.

Deus conhece tanto o que ocultais, como o que manifestais.

E os que eles invocam, em vez de Deus, nada podem criar, posto que eles mesmos são criados." (Surata 16:17-20)


O reino da matéria me parece tão único que minha pobre mente cai em idolatria, busco amar de forma deformada pois reduzida. A busca pelo amor daqueles que podem amar, mas não por Aquele que é o Amor. Busquei em outros amores te encontrar, quando encontrava, abandonava-o; quando eles sumiram, voltava a Ti tal como a ti volto agora. O que eu oculto é o que agora manifesto: sou tão errante quanto precário. Sou feio, meu Deus, e sofro de ausência de brio. Não sou bonito para ter direito e nem forte para conquistar. Se eu morresse hoje, arrepender-me-ia de ter passado tanto tempo me movendo pelo espaço-tempo do nada.

domingo, 12 de dezembro de 2021

Acabo de ler "Ed Mort e Outras Histórias" de Luis Fernando Veríssimo.

 



    Um autor versátil e capaz de dar vários entendimentos distintos, erudito tal como ninguém e referência múltipla para diversos agrupamentos. Homem de diversas leituras e humor genial, talvez um dos maiores gênios do humor da história lusófona.


    O livro conta com uma série de contos que traduzem uma série de sentimentos distintos - além de um certo constrangimento pelo autor ser demasiadamente culto. Tal como o "Você vai ver" no qual a marginalidade, o crime e o mundo distópico remetem a um cyberpunk cada vez mais real e aproximado do Brasil. Coisa que traz um certo mal sentimento e um elogio a capacidade profética do autor. Confesso também que me perdi numa série de referências que partem de um Brasil que não vivi e que me deixou meio perdido no entendimento de alguns contos, mas nada que fizesse com que eu perdesse a qualidade da leitura.


    "Organizamos os nossos dias em datas com a ilusão que assim estamos organizando, de alguma maneira, o Universo. O primeiro ato racional de Robinson Crusoé na sua ilha foi marcar a passagem dos dias no tronco de uma árvore. Só então, situado nas suas datas, partiu para pôr ordem na sua solidão e tratar de sobreviver"

    É incrível como o autor consegue traduzir a sua erudição em comédia, já que a maioria de nossos ilustres intelectuais transformam a sua erudição em alguma produção chata, formal e que não dá tesão algum em se ler. As suas referências dão um gosto maior a leitura, tal como a piada do rato albino que sempre volta e por isso se chama "Voltaire" ou quando Ed Mort investiga o caso de Sartre no Brasil.


    Termino o livro com uma certeza: quero e lerei mais livros do autor que, para mim, é genial.


segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Acabo de zerar Ocean's Heart!





    Esse é um dos melhores jogos indies que já joguei. O fato dele remeter aos clássicos jogos do The Legend of Zelda é um adicional enorme. E o jogo cumpre seu papel de ser um jogo "estilo Zelda". Seu universo é riquíssimo e realmente vale a pena saber de sua história e fazer várias de suas missões secundárias.

    O jogo é visualmente belo, relembrando a era 16 bits (alô, Mega Drive e Super Nintendo), só que conta com efeitos visuais aprimorados. Quando joguei, senti uma enorme nostalgia que foi cumprida em cada longa hora do jogo. Tive que muitas vezes pensar, anotar, revisar pensamentos, olhar para as anotações e aprender um pouco mais de coordenadas - tudo o que eu faria jogando Zelda. Um simples diálogo muda tudo e "escutar atentamente os NPCs" é de importância crucial. Sério mesmo, já ignorei diálogos e acabei tendo que voltar atrás apenas para ler mais minuciosamente.

    O jogo em si não é tão longo, mas como você se perde em missões secundárias - que recompensam acentuadamente -, você acaba por jogar por horas e horas e dias e mais dias. Se eu pudesse dar uma dica, essa dica seria: faça as missões secundárias, simplesmente faça. A experiência das missões secundárias favorecem muito a jogabilidade geral do jogo.
Se eu tivesse que dar uma experiência negativa, essa seria: seus chefes são fáceis demais e a necessidade de pensar estrategicamente quase some do mapa mental quando falamos da dificuldade dos chefes - não que isso afete muito negativamente, mas é um fator que é importante para mim. Os chefes viram monstros padrões com algumas adições visuais.
É um jogo que vale muito a pena jogar e que roda em quase toda carroça que você ousar colocar o joguinho. Esse comentário é importante: seu PC fraco que só não morreu por sua piedade e falta de grana será "revitalizado" com essa experiência de gameplay.

    Sem dúvida é um jogo fantástico, com um enredo fascinante, que sabe entregar uma boa experiência geral e que entretém por dias. No final, ao olhar por tudo que chegamos a passar na história e gameplay, temos a sensação feliz de missão cumprida. Nos integramos no jogo e tornamo-nos participantes dele de forma definitiva. Amei!

domingo, 5 de dezembro de 2021

Acabo de ler: "Em busca de rigor e misericórdia" de Lobão.





    Creio que Lobão seja um autor de estilística fascinante, uma vida pujante e de uma originalidade inequívoca.

    "Eu precisava mergulhar em questionamentos como: por que os intelectuais brasileiros são, em sua esmagadora maioria, tão unívocos e quase sem qualquer nuance de pensamentos?; por que esse deserto de opções ontológicas?; por que tudo que não se coaduna com esse monomaníaco pensamento reinante vira um tabu a ser perseguido e eliminado, jamais ponderado e discutido?; por que os debates, já tão escassos em outras eras, foram aterrados na vida pensante brasileira?; por que todo pensador, artista, produtor de alguma cultura no Brasil, caso não esteja atrelado aos cânones do mainstream, à ortodoxia pouco esclarecida de nossa intelligentsia, é, via de regra, tratado como um pária, como irrelevante, como um inimigo candidato a se tornar um nada?".

    A consciência de que vivemos num país recheado de bovinidade é, de longe, a que mais nos enche de temor. Em nosso estado atual, é-se impossível sequer um debate real, já que isso sugere uma série de estudos de cânones contraditórios que ninguém se atreveu a estudar por motivos de adesão ideológica-identitária. E, se estudou, estudou sem o menor "constrangimento" de tentar entender, já que o objetivo do estudo de um pensamento contrário é, quase sempre, a refutação ou a recusa a priori. Quando não, vê-se a "leitura camisinha" que tem por objeto o comentário de um autor que se gosta sobre um que não se gosta.
 
    "A solidão é a matéria escura da coletividade. Quem se nutre na solidão se torna um mundo, uma entidade que injeta sabedoria e oferece possibilidades múltiplas à coletividade. Meu insight partia da percepção de que nossa condição básica, a solidão, tem peso infinitamente maior naquele cujo ofício é contemplativo, criativo, o que a torna grande companheira".

    A vida intelectual não pode se curvar de forma abjeta a uma reprodução sem fim de consensos coletivos sem perder a sua autenticidade crítica. O que se vê é uma substituição da mentalidade crítica por um consenso social, isso anula a verdadeira forma de analisar a intelectualidade.

Acabo de ler "Em Defesa de Stalin" de Vários Autores (Parte 12)

  Essa é a última parte de Emil Ludwig, indo da página 185 à 208. Aqui termina a triunfalmente rica e arguta análise de Ludwig. E talvez sej...