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quinta-feira, 21 de março de 2024

Acabo de ler "Teatro Completo: Peças Míticas" de Nelson Rodrigues

 



Com esse texto se encerra, por fim, a mais grandiloquente saga de microanálises desse perfil: um passeio imortal pela obra do homem que se fez eterno pela sua produção teatral. É, para mim, um grande momento. Eu tenho a honra de dizer que sou daqueles que conseguiu ler toda a produção teatral de Nelson Rodrigues. E não só li, como analisei. Talvez não com a grandeza que mereceria um autor de estatura tão universal quanto Nelson Rodrigues, mas ainda assim, em minha pequeneza, pude divulgar as suas obras.


Nelson é um homem sem o qual nada faria sentido. Lembro-me até hoje que estava isolado, numa casa desocupada, lendo Pondé. E Pondé detalhou Nelson com uma infinidade de detalhes, tão belos e tão maravilhosos, que me fez, logo após terminar o seu livro, buscar um livro de Nelson Rodrigues na biblioteca para poder ler. Daí para frente, tudo mudou num absurdismo mágico.


Eu lhes digo orgulhosamente, sem medo de passar uma impressão de monotonia intelectual, que leio Nelson Rodrigues há onze anos. Não houve, desde meus 16 anos de idade, um ano que não tenha pego um livro de Nelson Rodrigues para ler. E isso demonstra todo triunfo de impotência apaixonada que essa obra me causa. Ela é como uma bomba que, ao explodir, causa um choque estremecedor cujo o impacto, na pele, não é o de dor e sim o de espantamento admirativo.


Nelson é, para mim, meu pai espiritual em duas grandes áreas: na dramaturgia e na crônica. Nessas duas áreas, Nelson reina na minha consciência, como uma espécie de imperador ululante e eu sou apenas parte do cenário que existe tão somente para justificar a beleza lírica de sua obra, tal qual a estranha Cabra Vadia que ficava comendo capim ou mato enquanto Nelson realizava suas hilariantes entrevistas imaginárias - dizia ele, em seu saber profético, que essas eram mais verdadeiras que as entrevistas reais.


O tempo passa, leio e leio vários e vários autores, numa maquinal erudição acumulativa. Só que eu tenho a certeza absoluta de que, em toda minha vida, lerei Nelson Rodrigues e/ou escritos sobre Nelson Rodrigues. Nelson Rodrigues é e sempre será isso: o trágico fulminante!

quarta-feira, 20 de março de 2024

Acabo de ler "Hombres y Engrenajes" de Ernesto Sabato (lido em espanhol)


 


"Pero así como la máquina empezó a liberarse del hombre y a enfrentarse a él, convirtiéndose en un monstruo anónimo y ajeno al alma humana, la ciencia se fue convirtiendo en un frígido y deshumanizado laberinto de símbolos. Ciencia y máquina fueron alejándose hacia un olimpo matemático, dejando solo y desamparado al hombre que les había dado vida"

(Ernesto Sábato)


Esse livro é, certamente, portador duma brilhante mensagem e, ao mesmo tempo, duma liricidade no uso da língua de Cervantes. O conteúdo ensaístico casa perfeitamente com a capacidade de gerar bons efeitos poéticos por meio da escrita. Além disso, a mensagem em si vem recheada duma erudição inabalável que só homens como Ernesto Sábato sabem ter. Certamente esse livro entra como uma das melhores leituras do ano.


Digo-vos que existe uma grande questão: falido o projeto socialista e tendo o mundo nas mãos do imperativo ideológico da forma econômica do capitalismo, que sobra de nós? As mensagens sociais que venho visto, longe de serem de apoio ao capitalismo e estrita observância a ele, são a negação cabal do domínio capitalista e a esperança de que, ao menos alguma hora, uma afronta surja e ataque os sonhos burgueses que atordoa vários de nós.


O homem está hoje, mais do que todos os tempos, dominado. Tornou-se apenas um escravo das estruturas que ajudou a construir. E agora se lida com um mundo vazio, sendo apenas um dado numérico diante dum grande oceano de nada. E ao se olhar como mera formação estatística se revolta e crê, crê firmemente numa aurora que deixará toda essa porcaria tecnocrática no chão e trará, reacionária e revolucionariamente, o retorno de seu Self.


Acreditamos, apesar de tudo, num devir dum mundo melhor. E nossas lágrimas preenchem o chão enquanto nos vemos sistematicamente explorados por um mundo corrupto, por um sistema doente e por uma horda de homens que na desumanidade de cada dia se desumanizam em coro harmônico com essa mesma desumanidade.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Acabo de ler "Marx y Rusia" de Carlos Taibo (lido em espanhol)

 



A obra de Carlos Taibo é uma obra muito rica em seus pontos. Sendo ele um exímio estudioso da realidade russa, é também um leitor apaixonado da obra de Marx. Embora o próprio Carlos Taibo seja, por assim dizer, um autor anarquista. Ele faz frente aos vulgares que sendo marxistas ou anarquistas não lêem o conteúdo teórico de outros autores por divergências intelectuais, empobrecendo em muito o conteúdo da própria obra e (auto)limitando a capacidade de expansão do próprio horizonte de consciência.


Percebe-se que Marx, o velho Marx, tornou-se um homem mais sábio e mais aberto. Em vez de se encurralar pelo corpo teórico já construído pelos seus anos de vida intelectual, tornou-se, muito pelo contrário, aberto ao revisamento intelectual de sua própria obra. Estabeleceu novas pontes, construiu pouco a pouco um contato maior com sociedades pré-capitalistas em diálogos teóricos com o futuro anticapitalista. Além disso, estabeleceu um horizonte teórico de maior ecumenicidade com autores anarquistas.


A pesquisa de Carlos Taibo sobre o velho Marx traz uma luz que pode desencadear uma série de estudos que são muito relevantes ao desenvolvimento duma linha de raciocínio mais crítica e, ao mesmo tempo, mais abarcante e, portanto, mais completa. Hoje em dia é soberanamente necessário que não sejamos mais intelectuais dogmatizados e brutalizados pela adesão irrestrita ao bando. Temos que ser pessoas abertas, navegantes do mar de dados que é o conhecimento.


Sem dúvidas, hoje para mim é indubitável que se pode amadurecer intelectualmente sem que, ao mesmo tempo, sejamos pautados por uma rigidez mental tão característica de vários intelectuais que nos predecederam. E, quem sabe, a partir disso: construir uma sociedade mais igualitária, mais justa e mais humana. Que a mesa onde nos assentamos seja a de um diálogo irmão e não a de uma selvageria desavergonhada.

sábado, 10 de fevereiro de 2024

Acabo de ler "Psicoterapia para todos" de Viktor Frankl (Parte 2)

 



A divulgação científica tem uma problematicidade que lhe é irresistível. Como garantir que as pessoas compreendam a mensagem que é posta? Se, por um lado, se aumenta quantativamente o número de informação disponível, não há garantia que essa informação seja qualitativamente digerida. Isto é, a boa compreensão da mensagem não é o resultado (efeito) que se obtém.


Para burlar tal condição, se adere uma forma de se escrever que cai, por vezes, num simplismo que não traz a complexidade necessária ao bom entendimento da questão levantada. E se entra na maior má compreensão dos debates que se criam. O que há, hoje e na época desse texto, é a má compreensão e má utilização do saber científico. Uma constante mania de "uso freestyle" que descaracteriza a rigorosidade do trabalho acadêmico e científico.


Outra condição que podemos cair é, evidentemente, uma tendência falsificadora da própria psicoterapia ao criarmos um ambiente em que os pressupostos já interiormente aderidos pelo paciente criem uma tendência ao entrar na clínica. Essa falsificação ocorre pelo paciente já ter uma linha de pensamento já pré-montada sobre qual é o problema que possui.


Falsificação mediante a má compreensão e má compreensão interligada a divulgação científica. O problema não é a divulgação científica, acadêmica ou filosófica por si mesma. O problema está no "digerir" dessa informação e a forma com que há um processo de compreensão assimilatória do saber que é passado pelos meios de divulgação. Não se pode esperar que o efeito seja o entendimento integral, mas usualmente é o que as espera.


De forma contundente, Viktor Frankl nos fala/escreve duma questão bastante profunda. Questão essa que nos afeta, mas que, na maioria das vezes, ignoramos em absoluto. Creio que se poderia pensar, a partir disso, meios de criar uma cultura curiosa e investigativa que supere as dificuldades de entendimento. Só que isso depende do esforço pessoal e capacidade de cada um.

quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Acabo de ler "Amores Proibidos na história do Brasil" de Maurício Oliveira




Nada melhor do que terminar o ano lendo sobre o amor, não é mesmo? Este livro traz uma perspectiva intensamente interessante: partes da história de nosso país contada através da situação romântica de homens e mulheres que marcaram a história do Brasil. Um prato cheio para quem busca estudar nossa história sem o fardo de se perder no vaivém burocratizante e sonífero que toma conta da nossa história extremamente academicizada e pouco apaixonada.


Aqui o leitor entra em contato com uma realidade que transcende a banalidade oficialesca que é usual nossa forma histórica-narrante, isto é, ele sai das condições do castelo de marfim dos padrões normativos e adentra nos terrenos ocultos e íntimos do amor. O leitor, pouco a pouco, compreende que os grandes homens e mulheres de nosso país não eram tão somente figuras de ação política, cultural ou econômica: eram homens e mulheres normais, infinitamente normais, e, portanto, ligadas ao ato profundamente humano e normal que é o ato de amar.


O que move a história é mais do que uma gigantesca maçaroca de idealidade abstrata. O que move a história é muitas vezes o desejo de amar e ser amado. E esta necessidade leva os seres a grandes ideias. O amor precede tudo. O amor é o guião da inteligência e dos grandes atos. Até mesmo a ciência está envolta deste calor efervescente a qual poderia chamar de chamas do amor. A ideia de que estamos separados do imaginário e da busca do Ordo Amoris em todos os nossos atos nada mais é do que uma construção da própria imaginação humana e a objetividade nada mais é do que um fruto dum desejo subjetivo.


O leitor corre um grande risco ao entrar em contato com esse livro: o de ver-se humano. Quando nos vemos como humanos, apaixonamo-nos e deixamo-nos a mercê dos ventos da impotência da volatilidade do desejo. E, quiçá, em uma época tão dominada pela idealidade vazia dum maquinacismo vil, exato e proporcionalmente desumano, esta ação de se deixar levar seja a nossa principal lição.

sábado, 18 de novembro de 2023

Acabo de ler "Renato Russo - O Trovador Solitario" de Arthur Dapieve

 



Não sou muito fã de Legião Urbana. Para ser sincero, sempre achei a sonoridade meio vazia, meio oca, só existindo unicamente para dizer que há algum som que preencha o fundo. Porém isto é tão somente meu gosto musical, visto que respeito a banda e a genialidade de seu vocalista. Dito isto, vamos prosseguir na análise.


Renato Russo foi um homem extremamente idealista e capaz de estruturar suas ações a longo prazo. Tal condição lhe deu franca vantagem no cenário musical. Isto é, o brasileiro médio tende a uma inconsistência e incapacidade metódica. A inconsistência por si mesma gera a incapacidade metódica. Em Renato Russo, sua força de vontade lhe deu uma visão estratégica que lhe proporcionou a ideia não duma banda, mas dum projeto altamente duradouro que marcou o Brasil.


A banda e os fãs se sentiam verdadeiramente parte dum projeto. Eles não eram só átomos presos num acaso que lhes era inteiramente indiferente. Eles eram parte duma comunidade orgânica que tinha objetivos claros. A raiz messiânica da Legião Urbana trouxe um sentimento de pertencimento que é quase inexistente no Brasil. Essa diferença lhe rendeu o título de maior banda de rock do Brasil.


Renato Russo também era um homem bastante lido, capaz de fazer piadas inteligentes e com uma leitura de mundo impressionante. Porém sofria do mal que aflige uma série de gênios: a incapacidade de ser compreendido pelos seus semelhantes. O que Renato Russo tinha de genial, igualmente tinha de incompreendido.


Renato Russo talvez seja uma das poucas pessoas neste país que marcaram a história através de sua inteligência e são lembradas. Isto prova que a arte consegue quebrar as barreiras até mesmo dum povo bastante fechado a uma cultura mais sofisticada.

domingo, 5 de novembro de 2023

Acabo de ler "Toda Nudez Será Castigada" de Nelson Rodrigues

 



"O ser humano é louco! E ninguém vê isso, porque só os profetas enxergam o óbvio!"

Patrício (personagem de Nelson Rodrigues)


Enquanto que uma pessoa normal é vista como aquele que é a réplica da média social da sociedade em que se inscreve, a pessoa neurótica é uma em que o próprio desejo, e não a adequação social, é o impulso ordenador e dirigente da vida em si mesma. Logo o neurótico dá voltas em torno de si mesmo, de forma mais ou menos obsessiva.


A obra de Nelson Rodrigues é uma galeria de neuróticos. Neuróticos compulsivos. Pessoas portadoras dos desejos mais viscerais e mais sombrios. Capazes dos atos mais ensandecidos, das ações mais sanguinárias, dos amores mais mortais. A atrelação ao próprio desejo cumpre uma função trágica: essa guia a uma série de desentendimentos que, pouco a pouco, carregam as personagens da trama numa série de complexidades e complexos que posteriormente lhes esmagarão. Em Nelson Rodrigues, o desejo é triste pois (seu desfecho) é trágico.


Pode-se questionar a cultura em que Nelson Rodrigues estava imerso: a repressão social nas ações de indivíduos levava a quadros de extremização de conflitos. O corpo social atuava tiranamente - mais do que nos tempos modernos -, e a singularidade do ser era enfraquecida diante da própria impotência perante uma sociedade marcada por impulsos normatizadores. O desejo daqueles que são anormais são vistos como passíveis de ódio e logo passam pelo tribunal inquisitorial da sociedade.


O ser deseja e, na medida em que deseja, se vê diante da impossibilidade de desejar sem ser punido. Se o desejo vem de sua essência e ser a si mesmo é o mesmo que ser punido, a vida em si mesma é intolerável e deste conflito surge uma grande pulsão destrutiva. E é disto que a obra de Nelson Rodrigues retrata dramaticamente bem: a pessoa em sua mais triste singularidade a ser punida pelos desejos que não desejou ter. O pior tipo de punição é a punição sem escolha, essa mata o ser pouco a pouco.


A obra de Nelson Rodrigues nos faz repensar a nós mesmos e a nossa sociedade em conjunto. E também se somos o que somos ou a negação do que somos.

sábado, 28 de outubro de 2023

Acabo de ler "Napoleão" de Leslie McGuire

 



O ser humano se realiza na medida em que seus desejos se externalizam na conjuntura do real. Quanto mais externaliza seus desejos, mais o universo é carregado de simbolicidade. A simbolicidade no espaço nada mais é do que a alma do homem tomando forma física no tempo-espaço.


Quando falamos de grandes homens, falamos de homens que dalguma maneira foram capazes de, além de suportar a multiplicidade anulante do mundo, contornar o mundo a seu favor e retocá-lo com a tinta de sua alma. O mundo é, nas mãos de um grande homem, a escultura que os gigantes deixaram.


Napoleão tinha dupla qualidade: o fogo solar duma gigantesca paixão e a monumental capacidade técnica. Quando estas se alinhavam, nada poderia impedi-lo. Ele era como um deus em meio a mortais.


Evidentemente aqui há mais uma reflexão da vida e dos sonhos do que uma endossamento das ações de Napoleão. Porém não consigo, na situação atual, pensar em fazer uma análise da mesma forma: analiso por meio da minha subjetividade circunstante e não por um método geral bem delineado.


Creio que este é um livro bom para quem queira refletir a própria vida, a história e, igualmente, compreender mais sobre um dos homens mais geniais - não no sentido moral e sim na capacidade estratégica - que a humanidade gerou.

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Acabo de ler "Teatro Completo: Tragédias Cariocas I" de Nelson Rodrigues

 



A leitura dessa análise pode ser precedida pelas análises anteriores, visto que essa só é análise final do conteúdo que vem sido exposto por aqui já a algum tempo.


Empenho-me em analisar toda a obra teatral de Nelson Rodrigues e disponibilizar uma análise que seja sucinta, porém que tenha algo de minuciosidade e subjetividade. O que não é algo fácil, porém que me disponho a fazer com certa satisfação, visto que Nelson é um dos meus autores prediletos.


Resolvi adentrar na análise das tragédias cariocas, última fase do autor, em vez de ir por aquilo que lhe seria mais "inicial" por assim dizer. Espero que o formato não desagrade aos leitores que esperavam algo mais metódico em ordem de leitura.


Essa série de textos que venho feito é, antes de tudo, um convite para aqueles que me seguem: leiam a obra de Nelson Rodrigues. Ela pode ser uma forma de se libertar e de amadurecer, encarando o mundo de forma mais sóbria e adulta.


Ler Nelson, nestes tempos de solidão, tem sido um pouco de alívio nessa escala de terrores contínuos, de preocupações inenarráveis, na qual se alinha a presente fase de minha vida. E creio que pode lhes ser útil lê-lo também.

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Acabo de ler "Kono Subarashii Sekai ni Shukufuku wo! - Vol 10 - Natsume Akatsuki" (lido em espanhol)

 



Chegamos ao décimo volume. O que significa que estamos mais próximos do fim do que do começo. E quando digo "nós" quero dizer "eu", embora eu prefira dar ao escasso leitor que me acompanha uma sensação de pertencimento, mesmo que falha ou pouca.


Konosuba preza pelo humor, pelas falhas de caráter, idiotice, comportamento duvidoso e dualidade moral de seus personagens. Este volume não falha nisso, porém ainda podemos ver o desenvolvimento dos seus personagens rolando.


Eu não gostei muito do baixo desenvolvimento de nosso protagonista, o Kazuma. Embora já podemos ver um Kazuma bem mais a vontade e proativo no mundo em que se encontra, o que é um excelente sinal.


Aqui vemos um desenvolvimento maior de Iris e mais dados em relação aos nobres. A preocupação que Iris demonstra pelo seu reino, pelo combate ao exército de Rei Demônio e sua tenacidade em seguir lutando é impressionante.


Como já poderíamos pressupor, um personagem já deixa vestígios de que o Rei Demônio não é um mau-caráter e que, provavelmente, revelar-se-á tendo mais caráter que os humanos e demais protagonistas da obra. O que já era esperado, visto que os vilões são melhores que os protagonistas no conjunto geral delineado pelo autor.


De qualquer modo, a pequena novela demonstra sinais de desgaste e já não apresenta a mágica que apresentava no começo. Espero que os próximos volumes melhorem.

terça-feira, 26 de setembro de 2023

Acabo de ler "Amor em Segredo" de Sonia Rodrigues

 



Certos livros nos aparecem com um ar de espanto. Ao pesquisar o nome "Nelson Rodrigues", na biblioteca, deparei-me com essa curiosa obra de sua filha.


A relação "pai-filha" é tratada de forma curiosa, visto que seu pai negou-lhe a paternidade diversas vezes. A sua mãe, uma mulher apaixonada, não quis ir atrás também. A filha teve que seguir uma jornada teimosa até que tudo viesse à tona.


Não é de se espantar que o nome "Nelson Rodrigues", um dos maiores autores da história de nosso país, caísse como um trovão no céu ao ser meramente pronunciado devido a grandiosidade de sua obra que, além de excelente, é recheada de polêmicas de alta qualidade.


O livro trás mais da figura de Nelson como pai. Além de sua relação conflituosa com a filha. Todavia não há unifocalidade no tema: há algo de autobiográfico e um quê de gênero de crônica - característica que puxou de seu pai.


Um livro que vale a pena ser lido por todo legítimo fã da obra de Nelson Rodrigues e, evidentemente, de sua continuidade sanguínea.

terça-feira, 5 de setembro de 2023

Acabo de ler "O Grande Mentecapto" de Fernando Sabino

 



Li este livro faz um tempão, todavia resolvi escrever sobre ele tão somente agora. A falta de tempo me guiou a isto. Mas como fazia tempo que nada postava, resolvi escrever-lhes agora.


O personagem é chamado de "Viramundo". Tal nome não lhe vem ao mero acaso, o nome surge devido ao fato dele estar sempre envolvido em confusão e de sempre estar alterando o rumo da história mineira com a sua fanfarronice. Quase nunca por escolha própria, mas sim porquê sua habilidade inata - ou seria má sorte? - ou o destino o quis.


Declaro que me identifiquei bastante com o personagem. E o livro é um primor do humor, fazendo que o leitor ria de tempos em tempos e sempre se lembre do livro com um doce carinho.


O livro consegue ser engraçado sem ser clichê, triste sem ser nauseabundo, profundo sem perder o leitor numa miríade de complexidade diabólica que o afasta. Um equilíbrio perfeito conduzido por um grande gênio e autor que goza de profunda erudição sem perder o humor que lhe caracteriza.


No final, fica marcado uma espécie de grito de excluídos, dando margem a uma ampla crítica social e a estrutura da sociedade da época, sem perder a beleza e o encanto humorístico que denotam todo o percurso da obra. É um livro para se ler e reler, imaginando cada cena com todo carinho.

terça-feira, 22 de agosto de 2023

Acabo de ler "Historia Mínima de la Guerra Civil española" de Enrique Moradiellos (lido em espanhol)




Escrever sobre um conflito tão exaustivo e marcante nas poucas palavras que o Instagram permite é uma certa espécie de martírio. Porém não falho ao meu compromisso intelectual de estudar e analisar, mesmo que sem a minúcia necessária, o universo hispânico (seja este em sua origem ou em suas variações).


Quem estudar espanhol terá um mundo a se abrir diante de teus olhos. A história de inúmeros países e, igualmente, muitíssimos autores aparecer-lhe-ão em companhia para que amadureça em visão de mundo, relativizando a estreita visão de outrora e abarcando um novo grau de horizonte de consciência. A história marcar-lhe-á a alma a ferro e fogo, para que tu crenças na medida do mar imenso e profundo que desbrava.


A guerra civil espanhola teve uma configuração muito importante. A  Alemanha e a Itália estiveram ao lado de Franco, porém a União Soviética manifestou-se a favor do regime republicano. A participação de anarquistas, comunistas (marxistas) e socialistas também foi de suma importância. A neutralidade da Inglaterra e a permissividade da França foram pontos graves.


Tratava-se duma guerra entre um lado tradicionalista (católico e monárquico), de tendências fascistas e outro lado de tendências mais laicas, dominado por uma mentalidade mais própria da modernidade ou até mesmo do socialismo ou do anarquismo. Um lado vendo o outro como intolerável.


Todos já sabemos o fim que levou. A vitória de Franco não seria estrategicamente um grande auxílio ao Eixo (Itália, Japão e Alemanha), todavia afastaria a Espanha duma posição energicamente contrária aos seus interesses. Já a União Soviética, neste tempo ainda sem seu gigantesco arsenal militar, não seria suficientemente capaz de sustentar uma revolução socialista ali com sua baixa capacidade produtiva e produtos fora do padrão de excelência que um dia conquistaria. Mesmo que se possa dizer que outra república socialista ser-lhe-ia de grande ajuda.


Uma luta tão multifacetada, tão demonstrativa das contradições históricas não pode ser ignorada por qualquer um que goste e queira estudar seriamente o mundo.

terça-feira, 28 de março de 2023

Acabo de ler "El Futuro Bibliotecario" de Roberto Casazza (lido em espanhol)

 



A ideia de que o bibliotecário seja apenas um conservador dos livros que a sua biblioteca contém e um aquisitor dos livros que a sua biblioteca terá reduz, em muito, a própria magnificência do dever vocacional do bibliotecário. Um dever que transcende a mera conservação, catalogação, disposição e aquisição de livros.


A formação do bibliotecário trazer em seu seio uma postura dialética e simbiótica em que esteja, em paralelo e em harmonia, a capacidade técnica consubstanciada por uma ampla formação humanística e erudita. O bibliotecário tem o dever ser, ao mesmo tempo, uma pessoa fortemente embasada pela técnica e pela capacidade de diferenciar "compreensão" de mero "acúmulo informacional". Isto é, cabe ao bibliotecário a capacidade de selecionar as obras pelo seu rigor qualitativo além do aspecto meramente quantitativo.


As bibliotecas sempre foram portadoras duma missão e dum legado: (I) de transmitir, democratizar e ampliar, o acesso aos bens culturais civilizacionais; (II) serem pontos de encontro dialógicos e epicentros de saber cultivado. Muito de nosso desenvolvimento civilizacional se deve as contínuas lutas de bibliotecários em transmitir e disponibilizar as melhores obras a disposição dos intelectuais, ao povo e, também, aos futuros intelectuais que surgem com o contato com a cultura literária.


Tal posição de elevada importância não perderá seu papel protagônico mesmo com a digitalização, cada vez mais acentuada, do acesso aos bens culturais. Mudanças serão feitas, porém o bibliotecário é um educador que, com maestria elevadíssima, conduz o fio da boa comunicação ao receptor que por ela será elevado ao universo cultural. Esse importante papel requer uma formação não só técnica, requer uma formação radicalmente humanista. Essa é a postura que o autor desse livro explana eficazmente bem.

sexta-feira, 17 de março de 2023

Acabo de ler "La Crisis del Mundo Burgués" de José Luis Romero (lido em espanhol)

 



O fim do mundo inteligível é o fim de um mundo, mas não o fim cabal do mundo. O cristianismo destruiu a cultura clássica e, posteriormente, com ela se sintetizou. O renascentismo e o iluminismo também criaram um novo mundo. Os períodos revolucionários também possibilitaram a existência de mundos novos. E vários desses logo criaram formas mais sintéticas e aproximadas com mundo anteriores.


A questão da decadência do mundo burguês está na ascensão das massas que, quanto maior acesso cultural e maior riqueza, cada vez mais lutam pela realização de um outro mundo. Essa nova gente, da qual eu faço parte, não se vê engendradas nos processos estruturais da sociedade. A ausência de reconhecimento como parte desse tecido social leva um afastamento e uma dissidência para com essa própria sociedade.


A grande questão é a capacidade da sociedade criar meios de encaixar todas essas pessoas com suas demandas. Isto é, quanto mais consciente de si as massas se tornam, mais elas querem se ouvir. O simples ignorar não funciona: logo faz com que essas pessoas, cada vez mais insatisfeitas, criem grandes ebulições que podem até mesmo destruir a sociedade. Então a política de acomodação dessas figuras insurgentes é um dever para a própria saúde da sociedade e do mundo como um todo.


É preciso que haja uma forma democrática mais direta e dinâmica. Uma política que seja capaz de ouvir, entender e botar em prática as novas demandas sociais que, para seu próprio bem, deve acolher. Uma política integrada é melhor do que uma política que cerceia e oprime opositores. Quanto mais se oprime uma mola, mais seus braços doem e mais uma força reversa cresce. O grupo oprimido se alimenta de ódio e se radicaliza, produzindo uma forma danosa de se portar frente a sociedade, porém bastante compreensível.


O futuro do sistema e/ou o sistema do futuro dependerá de sua capacidade de atender as emergentes demandas sociais. Não há como ignorar uma massa de indivíduos que, a cada dia, crescem ignorados pela estrutura engessada. Já que uma força que pressiona gera uma força contrária que dificilmente será contida.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Marcha pela Inglória



Sempre andei de coturno. Faço-o há anos. Para mim, tem múltiplas significações. Ele é:

1. A opressão da sociedade e a idolatria social;

2. O fato de eu nunca ter parado de marchar e minha força de vontade;

3. A necessidade imperativa de continuar existindo, mesmo que as vezes só como um cadáver minimal. 


Qualquer grande filósofo buscava uma síntese e uma capacidade de absorção que compreendesse a engenhosidade da multiplicidade do discurso fragmentário. Isto é, o aumento da inteligência nada mais é do que a capacidade sintética que ele tem para com a realidade, sempre ultrapassando as linhas que lhe eram outroramente delimitantes. Porém esse exercício sempre corre o risco de perder-se, visto que ser em parte é tornar-se. As ideias tornam-se crenças, crenças tornam-se afetos, afetos tornam-se cegueira. Grande parte disso leva a um comportamento de seita, em que o enraizamento é visceral e a defesa é belicosa.


O exercício de buscar absorver múltiplas fontes da realidade, a qual chamei de "agnosticismo metodológico", é um exercício intelectual e catedrático por excelência. Esse exercício aumenta a experiência intelectual, só que não a aumenta de modo determinante. A fragmentariedade do discurso, junto com a incapacidade da reprodução desse discurso de modo pleno, torna o exercício intelectual da engenharia mental reversa insatisfatório. Embora essa seja a própria forma que a inteligência aumenta sem nunca captar em concretude seu alvo. A intelectualidade é sempre vã e sempre se perde na forma, porém seu objetivo não tem forma alguma.


A pergunta que não quer calar:

- Quem está tentando fazer isso no Brasil?

A resposta evidente seria: ninguém ou ninguém que se tenha conhecimento.


Enquanto estudava e criava meu método central, minha técnica intelectual mais potente e original, a qual chamo de neossistemática arquitetônica, deparei-me com minha própria impotência. O objetivo da neossistemática arquitetônica está muito além da neossistemática usual. Ela tem por objetivo pegar vários sistemas de pensamento e sintetizá-los artisticamente num todo coeso. Técnica que usei em meu TCC, Sanidade em Chesterton, pegando pensadores cristãos de todos os portes. Porém aí estava já o seu principal problema: a técnica neossistemática requer uma erudição ímpar de seu usuário. Quanto maior for a sua erudição, maior é a capacidade de usá-la. Não por acaso busco hoje uma dieta intelectual variada que dê a possibilidade de usar essa técnica com maior maestria.


Para Marx, por exemplo, o socialismo era superior ao capitalismo por ser uma síntese mais cabal que o próprio capitalismo. O socialismo seria a superação do capitalismo, não um sistema meramente diferente do capitalismo. Esse dado de fundamental importância poderia dar o entendimento do socialismo de mercado chinês, que mescla vários fenômenos distintos que confundem pessoas vulgares a quais chamamos de ideólogos. Esses preferem buscar validar suas premissas inquestionáveis e psiquicamente inquebrantáveis. Um exemplo claro disso é: já li um autor liberal que analisava o regime de Stalin, na falecida URSS, e dizia que todo crescimento dela se justificava única e exclusivamente graças ao mercado noutro; já li autores "comunistas" que diziam que o sucesso se dava apesar do mercado negro e graças ao planejamento estatal. A frase "não importa se o gato é branco ou preto, o que importa é que ele pegue o rato" é uma frase fantástica e sintetizadora, superadora do ruído dogmático das seitas ideológicas.


A China atual tem vários aspectos. Um deles é a união entre o marxismo e a doutrina de Confúcio. Isto é, a China poderia ser a união entre o aspecto marxista-progressista com o aspecto confuciano-tradicionalista-conservador. Sendo assim, a China não pode ser encarada como um país unicamente afetado pela mentalidade marxista. Há uma questão sintética nesse conjunto, porém esse é muito maior do que aquilo que sou capaz de analisar graças ao meu desconhecimento no assunto. Embora eu sempre passe um tempo lendo sobre a China.


A ideia sintetizadora, omniabarcância da inteligência, a capacidade transcendente para com àquilo que se delimita/determina. Tudo isso é o que se constitui uma civilização de fato. Civilizar-se é compreender como tudo que está ao nosso redor se faz. O exercício civilizacional é o exercício da própria inteligência. A civilização é o aumento da capacidade da própria civilização se compreender. E dessa compreensão multifatorial há o aspecto de antecipação que possibilita seu próprio progresso intelectual ou material. Ora, a inteligência só aumenta quando se cala. Já que inteligência é, evidentemente, percepção. Não estou dizendo que tenho essa faculdade, é precisamente o contrário: a inteligência é uma virtude negativa. No momento que se abriu, engoliu um dado. Esse dado torna-se razão. Quando a inteligência torna-se razão, não é mais inteligência. Temos a inteligência quando estamos praticando a inteligência, logo "estamos", não somos. Também sou condicionado pelos aspectos satúrnicos de crenças passadas que impossibilitam o aumento de minha inteligência, embora eu tente superá-los. Toda vez que reajo agressivamente e rápido, sei que fui rude e burro. Sei que minha vontade devorou meu pensar.


A grande problemática é que o intelectual moderno confunde razão com inteligência. Na verdade, a razão é apenas uma faculdade inferior. A razão é a aplicação daquilo que a inteligência já captou. Isto é, a razão é o horizonte que é possível no momento. A inteligência é o aumento dessa próprio horizonte. O objetivo da inteligência não é o próprio gosto ou crença, é a absorção universal. A inteligência não tem forma, antes modifica todas as formas. Quando a inteligência aumenta, a própria faculdade da razão aumenta. A razão aplica a inteligência que se tem. A inteligência aumento conhecimento que se tem. Para se tornar mais racional, é-se necessário se tornar mais inteligente. Já que a razão subordina-se a inteligência, visto que essa é faculdade dessa.


Mario Ferreira dos Santos falava que uma civilização que sempre busca transcender os fatores que lhe eram limitantes. Em vez disso, o brasileiro médio e a elite do Brasil acreditaram piamente que superaram todas as realidades antecessoras apenas as olhando com um ar de arrogância desmedida. "Minha ideia veio depois, logo é melhor". Dizem que, como vieram posteriormente, já apresentam um aspecto superior e sintetizador do que anteriormente se era. Porém a verdade é que a história não é um processo que se reduz numa linha direta, o processo histórico é pluricircular e expansivo - uma teoria histórica que tardarei muito a desenvolver e nem sei se estarei vivo para dar a ela aspectos caminhantes para pesquisadores posteriores. Tratam-se de vários círculos que se expandem. E esses círculos geram novos círculos que usualmente usam outros círculos e crescem ao lado dos círculos antecessores e posteriores. Exemplarmente: o catolicismo não se tornou luteranismo. O cristianismo nasceu dum círculo que se dividiu em vários que, mesmo ligados com traços em comum, trazem um desenvolvimento próprio e de características diferentes. Estão desenvolvendo-se e aprimorando-se. Disso que se trata minha teoria histórica. E a principal crítica é: o imperativo histórico-categórico - de que certas ideias aparecem como sínteses absolutas e superadoras das outras - é falsa. Porém isso se trata de outro livro que espero um dia ter o prazer de lançar.


A ideia de agnosticismo metodológico surgiu no momento em que tentava compreender o paradoxo da prisão de Chesterton. Nela encontrei a epistemologia chestertoniana, trabalho esse que um dia também terei de dar forma. O paradoxo da prisão, tal como tudo em Chesterton, requer uma síntese. O próprio livro Ortodoxia, que pode ser interpretado sobre o viés da saúde mental, é uma grande síntese entre vários dados dispersos que criam forma de corpo estrutural quando conjuntados. A saída da prisão não é uma mudança de local, mas a acoplação de infinitos novos locais para que a prisão deixe de ser uma prisão. Não se trata de ser marxista ou conservador, trata-se de ser os dois. E depois disso: três, quatro, cinco, seis, sete. Em certo sentido, essa dialética chestertoniana, essa epistemologia sintética se encontra em mim mesmo que eu não possa me dizer cristão. E queria um dia escrever mais sobre isso, num livro detalhado, espero que encontre tempo.


Quanto a questão do abarcar o universal pela delimitância-indelimitada, essa é uma questão de profundo valor para mim. Já devem notar que, pelo rumo da conversa, ele não é simples de se resolver e traz uma luta eterna em seu seio. Buscar acolher e sintetizar diferentes movimentos dentro de si é muito bom e traz um grande problema. O grande problema disso é que: religiões, ideologias, doutrinas e métodos não podem ser inteiramente abarcados e superados - a teoria pluricircular e expansiva da história trará mais luz a esse problema profundamente epistemológico. Tudo está num processo evolutivo próprio, dialogante ou nascente. A descoberta do videogame não matou a arte e a computação, embora tenha nascido, em parte, dessas duas. Compreender a multicirculariedade e expansividade não é achar um jeito de a tudo sintetizar. Todos esses círculos estão em processo evolutivo e sempre demonstram-se capazes de transcender o que anteriormente eram - isso se reflete igualmente no próprio tradicionalismo religioso. Além de que a informação dos vários componentes é tão fragmentária que se é impossível absorvê-las sem uma postura radicalmente eruditiva, e mesmo numa abertura radical se é impossível capturar todas as informações e subjetividades que a compõem. Schuon não errou a dizer que existe um componente especial na religião, que é a própria busca pelo universal. Embora essa busca universal se concretize num objeto particular que redireciona ao universal. Essa busca é o abstrato por absoluto. Deus nada mais é, compreendendo aqui como um fenômeno puramente psíquico, que uma crença metodológica para relativizar dada situação e ir além dela - a superação das adversidades que presentemente se apresentam. Não estou aqui para apontar a superioridade ou inferioridade desses círculos. As ideologias não comportam tal capacidade, um verdadeiro exercício intelectual requereria uma busca tão abstrata quanto a  própria busca religiosa. Só que ao buscar o universal, a própria ideologia se perdeu. Já que ideologias são fórmulas que retiram o peso monumental que é a tensão psíquica do ser frente a universalidade esmagadora que é o próprio universo que não pode abarcar. Graças a isso, o comportamento ideológico tem como método a redução da realidade a uma parcela que lhe é verdadeira, conquanto que não absoluta. Disso o comportamento ideológico pegará um dado (raça, classe, nação, gênero, qualquer parcialismo) e aplicá-lo-á até a exaustão. Dessa forma, veem o universo com uma lente reduzida que tira grande parte de sua complexidade e, de tal modo, tornam-o mais falsamente inteligível. Essa segurança confere a mente um grande relaxamento, que é também razão central do academicismo moderno. É graças a isso que acadêmicos vulgares dão show de vergonha alheia ao repetir tautologicamente termos mais do que batidos achando que estão acima de qualquer compreensão ao povão e aos seus rivais.


Em vez de se dar por vencido, um gigante do pensamento busca apreender tudo e apreender infinitamente. Saber-se limitado e que nunca corresponderá ao esforço que se entregou é uma loucura. Numa postura de humildade que beira ao extremismo mais fanático, porém possibilitadora duma real mudança paradigmática e, igualmente, de capacidade inovativa real. Visto que a síntese é o exercício supremo da inteligência. Esse será meu doutorado: "A Condução do Inconsciente como Metodologia Epistemológica das Ciências Humanas". Em que defenderia uma ideia mais ou menos artística de se pensar as ciências humanas, recorrendo muitas vezes ao acaso para a superação dos fatores condicionadores. O que me é hoje, na altura que me encontro, tarefa por demasiado difícil.


Um homem será glorificado por dominar múltiplas línguas. Só que não será glorificado por dominar múltiplas ideologias, doutrinas ou religiões. Isso cria uma grande problemática na capacidade de pensar e reduz em muito a qualidade e conteúdo do próprio pensamento.  Esse é o drama central da mentalidade ideológica, que propõe dogmas de pensamento como realidade última e premissas inquestionáveis, voltando a própria teologização do debate que lutou contra, porém aderiu inconscientemente. O tema que quero tratar em múltiplas obras para maior concretude. Um deles no âmbito da teologia política em que falarei do fenômeno da demiurgação do homem. Queria ilustrar mais a questão da teologização inconsciente, a raiz antropoteísta do problema e a superação dessa não por um retorno ao campo religioso, mas uma abertura ao absoluto e aceitação da própria contextualidade, porém sempre alcançando vôos mais coesos pela busca da superação das contingencilidades que regem o pensar.


Um verdadeiro intelectual não é aquele que é de esquerda, direita ou centro. É aquele que absorveu tudo isso - embora tal absorver nunca se concretize de fato. Porém não só isso: é aquele que busca a delimitância ilimitada, isto é, o delimitar-se por aquilo que não pode delimitar. É abertura ao absoluto enquanto absoluto. Um esforço supremo e catedrático em que há um espaço para a apreensão do "céu inabarcável". A capacidade de aceitar e, com isso, produzir não um relativismo niilista que se vê impotente. Nem um relativismo sincrético e desordenado, com partes que não são coesas entre si. Mas sim um relativismo sintético e simbólico, num parcimonioso devir em que a conexão com o próprio mundo aumenta conforme a integração da mente-mundo aumenta. O verdadeiro intelectual está para aquém de todas as coisas, de todas as ideias, de todas as contingências do mundo pré-inteligíveis. Ele é um homem neossistemático, visto que cria um novo sistema. E é um homem neossistemagógico, visto que se conduz não por uma estrutura já montada, conduz-se pela criação pautada na erudição absoluta. A minha técnica central, minha assinatura intelectual, a neossistemática fala sobre isso. O que resultaria mais num sistema de pensamento que funciona como um Linux, em que vários usuários ajudam criando componentes que elevam a qualidade do sistema.


Poderia falar que o método neossistemático é a superação do método mineral, forma predecessora que usava enquanto ainda era channer. Seria melhor dizer, hoje, que o método neossistemático é a continuação necessária do método mineral. Porém há a forma mais cabal que o neossistemático arquitetônico, em que usamos toda nossa intelectualidade numa única obra. E por falar em chans, falta ainda um livro que termine a saga de livros sobre chans, na qual eu falarei da Hipótese Feudal e a origem da nova direita (altright - direita alternativa). Pretendo começar a escrever esse livro daqui a cinco anos. Até lá eu (acho) que vou ter me apoderado do trivium e do quadrivium, além de outras áreas que quero ter um conhecimento mais notório. Pretendo demonstrar um pouco da teoria pluricircular e expansiva da história de forma apequenada, demonstrando a história dos chans nacionais nessa obra. Esse livro terminará a fase 2.


- Arco 1: Sapo Lunático

Manifesto Mineral ao Sage é Super Like;

(Livros experimentais em locais fechados de público restrito)

Arco 2: Batalha da Serpente

Termina no Harmonia da Dissonância (obra em que darei minha última contribuição ao estudo dos chans);

(Aqui haverá uma revisão de vários erros das obras predecessoras e adição de novo conteúdo);

Arco 3: Príncipe Pirata Palhaço

- Cartas de Missionários Burguês a um Ditador Puritano;

- O Imperialismo Acadêmico e o Fim da Inteligência;

- Obras do Apocalipse;

- A Demiurgação do Homem.

(Foco na desconstrução niilidionisíaca do discurso, não sei quando chegarei nela, talvez mais cedo, talvez mais tarde)


Os arcos terminam no número sete. Porém o arco sete terá três livros que espero lançar ainda vivo. E um quarto que será póstumo, este sintetizará absolutamente tudo. O objetivo da obra é criar uma catedral conexa em que tudo fará sentido.


É óbvio que não poderia dizer aqui tudo que é ou não é. Tudo que almejo, visto que são várias coisas:

- Construção e Aprimoramento da Neossistemática;

- Explicações mais detalhadas de termos como "coletivo-normativo", "inversão ritualística", "princípio da intimidação-excitação", "abraço satúrnico", "epistemologia simbólica", "epistemologia chestertoniana", "fascismo/nazismo como respostas doentias ao mundo líquido", etc;

- Uma série de obras literárias;

- Microlinguística para compreensão de autores e para tratamento psíquico;

- Meditação Ouroboros;

- Desconstrução niilidionisíaca do discurso;

- Condução Inconsciente como método intelectual;

- Etc.


É uma longuíssima batalha pela frente. Porém na busca pela universalidade real, transcendência absoluta, o saber adentrar no não-saber, num exercício de douta ignorância - termo paradoxal, porém o paradoxo é a condição do real -, superando a contigencialidade que o contextualiza espaço-temporalmente. Métodos são mais importantes que fórmulas, já que fórmulas são aplicadas a uma realidade líquida que sempre nos escapa. O método deve visar o universal e apreensão do universal relativiza toda e qualquer crença, visto que o aumento do horizonte de consciência supera as formas delimitantes da razão. A razão é forma, a inteligência é informe. Ela é informe pois, quando adquirida, modifica as formas (razão). Informe também o é por ser absoluta, e a captação do absoluto é objetivo da delimitância-indelimitada, onde vontade e inteligência já se harmonizam (mesmo que só efemeramente).


De qualquer modo, é um gigantesco esforço. Ninguém busca isso no Brasil. É sempre a baboseira de gente que repete clichês mentais como fórmula de onissapiência - drama esse falado nos aspectos coletivos-normativos que regem o pensar ideológico, nas quais tinha tratado em textos anteriores. A inteligência é uma virtude. Só que a própria inteligência é uma virtude negativa, está sempre para além de si e sempre busca o que está fora de si. A inteligência é a destruição de si mesmo, para a absorção do outro, para o aumento de si mesmo, para o estar além de si mesmo. Ser em parte é tornar-se. Porém aquele que visa o absoluto, condiciona-se para absolutizar-se. Esse exercício eterno, penoso, que sempre que alcança se perde, é o rumo inglório que ninguém está a altura de realizar ao todo. Só que quem não o faz, igualmente não capaz de ser um autêntico intelectual. Não saberia dizer se isso é pretensioso, porém é o que propus a partir de minha interioridade. Só espero não morrer antes de tudo isso...

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Acabo de ler "Clarice e as Mulheres" de Várias Autoras




Esse livro me despertou sentimentos mistos. Existem escritos que se sobressaem e outros que parecem ter sido colocados tão somente panfletagem política, o que, diga-se de passagem, não foi de meu agrado. Embora existam, evidentemente, escritos muito bons.


Esse livro foi distribuído, salvo engano, gratuitamente pela prefeitura de São Paulo. A sua estética é deveras agradável e demonstram um esmero para com a beleza do livro. Movimentação essa que é bem rara a política usual do Brasil para com a própria cultura.


O livro conta com várias autoras, cada qual encontrada num campo diferente e com obras distintas, embora tenham um posicionamento político bastante semelhante - ao menos, foi essa a impressão que me causou.


A descrição e a beleza literária sofre de altos e baixos que intermitentemente se intercalam. Por vezes indo ao mero argumentacionismo - artifício de amante de retórica - que, infelizmente, destrói a pretensa qualidade literária que se almejava. Por outras, vê-se uma beleza estilística e originalidade sobressalente que encantam em muito o leitor.


Para um livro distribuído gratuitamente com o objetivo de ampliação do horizonte cultural paulistano, creio que seja uma excelente obra. Como um livro, em si, varia demasiadamente em qualidade.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Acabo de ler "Clarita se volvió Invisible" de Graciela Montes (lido em espanhol)

 



Li esse livro com o objetivo de exercitar a tradução, um exercício para aprender mais a língua espanhola. Mas devo confessar que, durante o exercício, gostei bastante dessa infantil, mas encantadora história.

A história se passa narrando as proezas duma garotinha chamada Clarita. Essa menina, bastante sapeca, tornou-se invisível e foi pela casa aprontando diversas confusões. Um enredo bastante simples, todavia recheado duma mágica que, em meu coração, achava-se oculta.

Lembrei-me, diversas vezes, do mundo diminuto e fantástico de minha tenra idade e da relação que nutria com meus pais. As reminiscências dum passado distante que ressurgia a cada página tornou a leitura muitíssimo agradável, proveitosa e deleitosa. Além de que, para minha surpresa, tornou-se mais e mais emocionante com o passar do tempo.

No fim, Clarita volta a ser visível. O afeto de sua mamãe lhe é mais importante do que o fantástico poder de se tornar invisível. O carinho supera, incrivelmente, a especificidade e singularidade de sua experiência com esses poderes tão estranhos e desejáveis. Nisso reside, precisamente, a qualidade da experiência humana que a autora tão fantasticamente transmite.

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Acabo de ler "O sonho e a psicanálise freudiana" de Giovana Rodrigues da Silva

 



O sonho na psicanálise é analisado de forma diferencial. Ele é visto como uma via de acesso ao inconsciente, embora ele não seja a única. Várias são as portas e, quando combinadas, temos a possibilidade de nos conhecermos melhor como pessoas.

Para compreender um pouco mais do sonho, é preciso compreender que, para Freud, somos dotados por energia psíquica e que esse mecanismo trabalha para evitar a sobrecarga do nosso aparelho psíquico. Para regulamentar melhor essa energia e evitar a sobrecarga, nosso aparelho mental impossibilita o acesso de certos dados para que tenhamos uma certa paz - esses vão parar no inconsciente.

O grande problema é que: o inconsciente não tem toda sua informação bloqueado em acesso ao consciente. O que foi descartado, na verdade foi omitido. Ele há de reaparecer em algum lugar e Freud especulou que uma dessas vias é o conteúdo dos sonhos. O contato entre o consciente e o inconsciente nunca é cortado ao máximo.

O sonho é um grande mistério. O mecanismo repressivo ainda é atuante e é por isso que o sonho vem codificado para que o consciente não o entenda - só que essa codificação pode ser descodificada. Entramos em contato com a realidade mental sem ser por ela diretamente afetado a nível de compreensão integral. O esforço investigativo terá que ir para além das informações presentes nos sonhos e analisar a integralidade da vida em si.

Um artigo simples e enxuto, todavia de tematização elementar. Recomendável a quem busca um maior entendimento da psicanálise e dos sonhos - além de, é claro, de si mesmo. O sonho é, para psicanálise, uma mensagem do eu para o eu.

segunda-feira, 8 de agosto de 2022

Acabo de ler "Sangue, Suor e Pixels" de Jason Schreier

 



Videogames são a coisa mais divertida do mundo, não? Podemos desvendar masmorras mortais em The Legend of Zelda, viver o apocalipse zumbi em Resident Evil, correr a velocidade do som com Sonic, espancar deuses em God of War. Tudo indica que videogames são divertidos, eles abrem um leque de possibilidades existenciais nas quais entramos de cabeças em novos mundos... mas, pera aí, como tudo isso é feito mesmo? Cada possibilidade que adentra no fantástico mundo da gameplay é meticulosamente preparada por pessoas que, às vezes, passam dias trabalhando mais de dez horas por dia sem ver a família ou dormindo no próprio estúdio pra poupar tempo e maximizar a produção.

Sim, tudo gasta tempo e esforço. O cogumelo que aumenta o tamanho do seu encanador favorito requisitou tempo e esforço daquele que o programou para fazer isso. Os zumbis que lhe perseguiram pelas ruas de Raccoon City requisitaram de uma sofisticada inteligência artificial. Até mesmo o Sol e o reflexo na água tiveram um determinado tempo para ficarem prontos. Alguém teve que deixar qualitativo os movimentos das gramas. Sem falar da física que a tudo rege que teve incontáveis cálculos matemáticos. Fora uma série de piruetas de todos os tipos, alguém teve que conceber artisticamente o produto para que ele fosse bonito e verificar se as mecânicas dentro dele o deixavam divertido além de jogável.

Atrasos de produção, pessoas largando tudo para produzir jogos, horas de discussões intermináveis sobre poderes e como aplicá-los, passar tempo longe da família, não ver os filhos crescerem. Se isso lhe parece uma vida divertida, quiçá esteja apto pra trabalhar 12 horas por dia para que uma flor apareça numa tela e dê poder de fogo a um encanador barrigudo que luta contra tartarugas. A vida dos programadores não é fácil, videogames podem até ser divertidos, só que produzi-los é um esforço estóico do mais alto nível. Toda essa história é contada por uma série de relatos nesse livro.

Pra quem quer entender mais sobre videogames, esse livro é de leitura obrigatória. Ele trabalha com relatos que dão uma nova compreensão sobre jogos de forma inesquecível.