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domingo, 2 de outubro de 2022

Nas Entrelinhas

Olho-te a ir desesperançado, o tempo junto parece cada vez menor na medida paradoxal em que ele aumenta. Quanto mais ficamos ao lado, mais quero-te ao meu lado. Dez horas são-me agora efêmero prazer, quero-a em todo o momento, quero-lhe sempre. Passo o dia a viajar imaginativamente quando lhe terei de volta, minha consciência não participa de nada que eu faço - meu pensamento perde-se inteiramente em ti. Só consigo mentalizá-la em todo momento que passo, nada mais me é importante.


E quando te abraçar novamente, meu coração baterá mais forte que todos os corações do mundo. Quando beijá-la, terei a sensação beatífica prévia do paraíso. Tê-la é ter a imanentização paradisíaca a bater no meu peito. E, se um dia eu pudesse escolher o mundo, escolheria a ti, já que tu és meu mundo, inteiramente meu mundo.


Não posso esperar até o amanhã, não posso esperar um dia sequer, um segundo sequer, nem um milésimo sequer para tê-la como minha mulher. Eu só quero sentir a ti, só quero beijar a ti, só quero amar a ti, só quero desejar a ti, só quero abraçar a ti, só quero ver a ti. E quando me disserem que você é pouco para suprir todas as demandas que minha alma humana quer, responderei que me é de inteireza perfeita e suficiente. Tu és a omniabrangência que meu apaixonado coração precisa.


Nas entrelinhas, toda vez que te abraço sinto um pedacinho do céu. Nas entrelinhas, toda vez que você se afasta, encontro-me no inferno. Nas entrelinhas, ter-te ao meu lado e não poder beijá-la é como estar no purgatório privado da proximidade do amor divino que tanto se espera. Nas entrelinhas, estar perto de ti é como ser conduzido ao nirvana. Nas entrelinhas, vê-la sorrir é como olhar uma linda Lua cheia estrelada. Nas entrelinhas, ouvir a tua voz é como ver o Sol depois de achar que ele nunca voltaria. Nas entrelinhas, amá-la é ter certeza que o paraíso é realizável.

sábado, 30 de abril de 2022

A Cobra

Palavras não morrem, não dá pra esquecer. Os batimentos de meu peito não cessam. E imerso em meu próprio sangue, eu nem consigo mais dormir, tenho imenso medo de me afogar. Salvar-me-á da solidão ou me verá caído na noite sem fim até que tenha percebido que tinha tido a chance de me salvar?


Pegue-me, se puder. Leve-me, se querer. Ame-me, somente se quiser. Meu espírito desvaira-se nos altos céus e colide-se com a crueza do real. Ando sempre em corda bamba num céu etéreo de imprudência bestialogicamente selvagem, é sempre difícil me acompanhar - a única certeza é que no meu anuviado e transtornado mundo: cair é quase sempre morrer, quiçá para renascer outra vez ou para enlouquecer duma única vez, a única garantia é a ausência de código de direito do consumidor.

Minha carne sempre se dobra, sempre tendo gosto agridoce com seu sangue meio amargo e meio adocicado. E estou sempre a sangrar, conquanto que até agora sem minha força vital obscurecer. Namore-me sem nunca saber se você tirará fel ou se tirará mel. É pedir demais, embora o demais é o que sempre peço. Sou um constante inconstante ameno outonal a sonhar quando o metrô de São Paulo levar-me-á ao paraíso da Jerusalém Celestial.

Eu sou de discutir o sexo dos anjos num rigor ultra escolástico, como se a inutilidade me confortasse e livra-se da ideação autocida. Minha visão longeva é tal como um ode ao disforme em que o previsível nunca se encaixa, tal como eu nunca estou a me enquadrar em absolutamente nada. Sou melancólico de formação meditabunda, trazendo uma nauseabunda penumbra entre o campo do dito e do não dito. Eu maquino fantasias tal como a esfinge maquina enigmas. Minha prudência é a soberba do orgulho do fracasso e de fracasso em fracasso crio minha distópica catedral que cresce como capim em direção a loucura dionisíaca e não a visão beatífica do Deus de Abraão, Isaac e Jacó.

Até quando eu serei essa cobra alquímica que come o próprio rabo sem ter coragem de esgotar a própria capacidade física? O transcendente escatológico é contra a minha naturalidade e o peso de minha vida é um fardo para minha alma ofídea. De pele em pele, prostituo-me por uma morada provisória num submundo subnutrido, esperando aquele juízo final que na mortalha me ponha como se coloca um corpo negro, tal como o meu, em mais uma banal estatística.

Não quero ser trágico. Só que vivo a vida toda como um traficante de boas tragédias. Embora que o que eu mais quero é que tudo acabe como a Divina Comédia - aquela estranha poesia que anda do inferno ao céu. É sonhar demais, e sempre sonho em demasia, peremptório erro meu. Perdoa-me, amor, cala-me com teu beijo e esqueça dessa minha loucura tardia.