Nome:
Militância enquanto Convite ao Diálogo: o Caso da Militância Monodissidente
Autores:
Dani Vas;
Danilo Silva Guimarães.
Nome:
Militância enquanto Convite ao Diálogo: o Caso da Militância Monodissidente
Autores:
Dani Vas;
Danilo Silva Guimarães.
Nome:
Militância enquanto Convite ao Diálogo: o Caso da Militância Monodissidente
Autores:
Dani Vas;
Danilo Silva Guimarães.
Em relação ao hétero-patriarcado se pode afirmar que a hegemonia é marcada por uma superioridade, essa superioridade recompensa quem é (heteronormativos) ou quem se assemelha (homonormativos) ao padrão de masculinidade hegemônica. A homossexualidade é condenada em três vias: o homem heterossexual vê como fundamental odiar o homem homossexual; a homossexualidade está ligada a efeminização e vivemos numa sociedade machista; o desejo homossexual é considerado subversivo por si mesmo.
O comportamento homofóbico, bifóbico, lesbofóbico e transfóbico provindo de homens heterossexuais é comum e, até mesmo, recompensado. Desde criança, o homem heterossexual é ensinado que será recompensado por ser hétero e atacado se desviar desse padrão. Ser hétero é uma forma de autojustificação e esse comportamento deve ser ressaltado o tempo todo. Não por acaso, uma das principais brincadeiras é acusar outro homem de não ser "homem suficientemente", acusação do qual o homem acusado deve imperiosamente se livrar. Esse mecanismo, feito a exaustão e todos os dias, leva a um condicionamento mental em que o homem deve ter uma vigilância constante em relação a própria masculinidade – e não uma masculinidade qualquer, mas sim a hegemônica.
O comportamento homossexual é considerado um desvio duplo. Um desvio se encontra no gênero (homossexuais são considerados efeminados) e outro na sexualidade (homossexuais possuem relação com o mesmo sexo). O antagonismo entre heterossexuais e homossexuais é claro: se o poder heterossexual advém do hétero-patriarcado, advém por sua vez da masculinidade e heterossexualidade. O homem homossexual é a antítese do homem heterossexual, ele representa a negação sistêmica dos seus valores e modo de vida. Tal radicalidade, sobretudo em nosso meio cultural, leva a um choque óbvio.
A cultura do homem heterossexual é uma cultura da exaltação da força e do domínio. Essa cultura, nociva e tóxica por si mesma, requer uma constante descarga energética entre si e em outros grupos. A "descarga interna" é um meio de regulamentação comportamental entre os próprios heterossexuais, para reforçar o comportamento hétero-patriarcal. Já a "descarga externa" é correlacionada a demonstração de superioridade do homem heterossexual em relação aos outros grupos, sobretudo mulheres e LGBTs.
A natureza da hegemonia é cruel. É a partir dela que a maioria das opressões sociais se estrutura e se aplica. É o grupo hegemônico que pode, com sua força, definir até o que é normalidade. É ele que pautas as relações sociais, culturais e, até mesmo, econômicas. E é a partir dele que vemos o surgimento de vários papéis que devem ser desempenhados por nós performaticamente. A normalidade, em grande parte do tempo, é criada por uma estrutura de poder. Ela é produzida por uma narrativa, por um discurso. O reforço a normalidade em conjunto com a patologização são ferramentas coercitivas para preservar.
A hegemonia é criada pela intelectualidade, criada pela cultura. Ela é mantida pelos padrões culturais. No fundo, são as organizações intelectuais que mantêm ou destroem um determinado padrão. É evidente que isso depende da capacidade de dadas organizações intelectuais. Meios undergrounds não conseguem facilmente penetrar a massa e redefinir conceitos. Quem tem tal domínio, tem para si os chamados "meios de produção cultural". Para detê-los, se faz necessário grande poder financeiro ou o suporte do grande poder financeiro.
Em relação a hegemonia na esfera da masculinidade e do gênero, há uma correlação entre "poder masculino" e "heterossexualidade". Existem aqueles modelos de masculinidade que visam preservar as estruturas de dominação hétero-patriarcais e aqueles outros modelos de masculinidade que atuam contra essa estrutura. A grande maioria desses modelos de masculinidade são violentos, dominadores e agressivos. Visam, antes de tudo, a superação pela conquista, pela imposição e uma perpétua luta dos homens pela hierarquia. É absolutamente infeliz que a maioria dos modelos de masculinidade reinantes sejam sobre dominação e subordinação, isto leva a conflitos sociais perpétuos e rodas tautológicas de tortura sociopsicológica.
A estrutura hegemônica da masculinidade é tecida dia após dia. Regulada e gerida para articular: as experiências, as fantasias e as perspectivas. É a partir dela que as relações de gênero e sexualidade são refletidas e interpretadas. Ou seja, é a partir da matrix (homem, hétero, macho e ativo) que se inicia a reflexão do gênero e da sexualidade. Todos os outros pontos são ignorados ou violentamente censurados, seja pela força da lei jurídica, seja pela força da lei social – que, convenhamos, muitas vezes não são o mesmo. É dessa forma que vemos a natureza do movimento queer e do movimento heterossexual. Sendo o que o queer parte do estranho – contra-hegemônico – e o heterossexual parte daquilo que foi naturalizado – polo hegemônico.
São os ideias culturais os reguladores e gerentes, são os ideias culturais que criam e perpetuam. Para encontrar o modelo de homem reinante, basta ler a maioria dos livros, ver a maioria dos filmes, ouvir a maioria das músicas, assistir a maioria dos programas. O mesmo modelo – homem, hétero, macho e ativo – se repete exaustivamente, como num mantra imagético, adentrando imaginários e servindo como base inspiracional. É assim que se mantém, que se preserva, pela moldagem do imaginário, a hegemonia heterossexual.
A formação social é diferente da formação biológica. Muitas das formas sociais se confundem com realidades naturais, quando na verdade muito do mundo que temos ao redor foi construído pela sociedade em que vivemos ou que existia anteriormente a nossa existência concreta. A percepção que as pessoas têm, sobretudo quando estudam pouco sobre o assunto ou possuem pouca ou baixa possibilidade de encontrar outras realidades, é a de que o universo existente e o universo natural são o mesmo. Desse modo, realiza-se uma naturalização do universo existente, vendo como essência imutável o que é uma realidade mutável e móvel. Tal movimento cria aquilo que chamamos de "pacto silencioso".
Existe hoje um crescente debate entre a relação de masculinidade, sistema de gênero e formação social. Em tempos anteriores, muitos trabalhos exigiam força física e homens possuíam mais dela. Como resultado, criou-se uma mentalidade de que o homem tinha mais capacidade que a mulher. Essa crença de maior capacidade foi permeando muitas outras crenças, até que se delimitou cada vez mais a autonomia feminina. Com o processo industrial e relativa capacidade cada vez maior de exercer funções sem a necessidade de poder físico, a mulher foi sendo inserida, pouco a pouco, nos universos anteriormente dominados por homens. A autonomia crescente levou a reflexões cada vez maiores e o poder masculino se torna cada vez mais questionável.
Hoje não questionamos só o poder masculino, questionamos também a própria masculinidade hegemônica ("macho, hétero e ativo"). Sabe-se que o sistema de determinações de gênero e sexualidade estabelece uma série de papéis que devem ser cumpridos para a aceitação social. Todavia essas determinações estão sofrendo dia após dia com uma onda contra-hegemônica que questiona os papéis atribuídos pela sociedade. O que queremos não é cumprir papéis pré-determinados na sociedade, queremos descobrir quem somos e agir conforme a autenticidade de nossos espíritos. Se não, estaremos vivendo uma vida falsa, em que atuamos conforme um roteiro, de forma performática.
Vários intelectuais – e pessoas menos profissionalmente intelectualizadas – buscam a construção de uma outra masculinidade e uma outra feminilidade. Não uma hegemônica que sirva como parâmetro ou que seja paradigmática. E sim uma masculinidade e feminilidade que tenham autonomia frente aos sistemas de gênero e sexualidade. Ou seja, a ordem que queremos é uma ordem em que cada pessoa tenha a possibilidade de determinar o tipo de masculinidade e feminilidade que quer expressar e que seja correlacionada ao próprio gosto e subjetividade sem a imposição de um modelo sobre outro.