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sábado, 16 de agosto de 2025

Acabo de ler "Teoria Geral do Estado e Ciência Política" de Cláudio e Alvaro (Parte 23)

 


Nome:

Teoria Geral do Estado e Ciência Política


Autores:

Cláudio de Cicco;

Alvaro de Azevedo Gonzaga.


Vou me centrar em anunciar os pontos essenciais.


Estado na Antiguidade Oriental:

1. Caráter sacro e divino do poder;

2. Identificação total entre poder político e religioso, entre patriotismo e religião;

3. Concentração dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário nas mãos do rei;

4. Absolutismo ou despotismo absoluto.


Instituições políticas gregas:

1. Surgimento de governos republicanos;

2. Separação da moral e da religião do Direito;

3. Governante não é mais considerado divino, nem indicado pelos deuses, é eleito pelo povo, os cidadãos comuns.


Grécia: cidades-Estados.


— Esparta:

- Diarquia: dois reis com funções militares e religiosas;

A) Eforato: cinco membros de eleitos anualmente, dirigiam o Estado;

B) Gerúsia: vinte oito homens maiores de sessenta anos, controlavam as atividades dos monarcas e atuavam no campo legislativo;

C) Apela: composta todos os cidadãos espartanos maiores de trinta anos, com funções eletivas e legislativas.


— Atenas:

- Aristocracia dos nove arcontes;

- Reforma de Clistenes traz à democracia;

- Democracia excluía estrangeiros, mulheres e grande massa dos escravos;

- Péricles e presidencialismo: o Senado atuou vetando Leis emanadas pela Apela — assembleia popular — pois as via como inconvenientes para "o bem da Polis" (era uma ditadura disfarçada).


— Teoria Política de Platão:

- O Estado deve ser, em ponto maior, o que o homem é, em ponto menor;

- Como o homem é governado pela razão, deveria o Estado ser governado por sábios filósofos;

- Tal como o corpo com suas paixões e instintos segue o que é determinado pela inteligência, assim os trabalhadores devem obedecer os sábios governantes que possuem os conhecimentos verdadeiros;

- Guerreiros e guardiões: responsáveis por defender a Pólis contra a subversão dos trabalhadores (para eles cumprirem os mandamentos dos sábios) e repelir ameaças externas;

- Todos deveriam agir conforme os papéis sociais fixos para que haja justiça;

- A mulher pode exercer qualquer função na cidade (igualdade de gênero).


— Teoria Política de Aristóteles:

- "O bem próprio visado pela comunidade soberana é o bem soberano";

- Três formas de governo em forma funcional ou corrupta: monarquia/tirania, aristocracia/oligarquia e democracia/demagogia;

- Melhor forma de governo como a monarquia;

- Homem como animal social.


— Pensamento Político Romano: 


— Cícero:

- Ecletismo: une monarquia, aristocracia e democracia;

- Unidade da Monarquia;

- Excelência da Aristocracia;

- Consenso da Democracia.


— Santo Agostinho:

- Cidade de Deus como obra de Filosofia da História;

- Dois tipos de homem: os que amam a si mesmos a ponto de desprezar a Deus e aqueles que amam a Deus a ponto de desprezarem a si mesmos;

- As duas cidades (A de Deus e a dos Homens) estão unidas como joio e trigo;

- O Estado deve se subordinar aos valores cristãos.

terça-feira, 29 de outubro de 2024

Acabo de ler "Heretics" de G. K. Chesterton (lido em inglês/Parte 3)


Nome:

Heretics


Autor:

G. K. Chesterton


Não há nada que seja desinteressante, a não ser a pessoa que, por falta de imaginação, considera tudo desinteressante. A pessoa que julga tudo desinteressante, crê que está acima de todas as coisas. E, por crer que está acima de tudo, impiedosamente não se abre a experiência do fantástico que a vida apresenta. Essa ausência de abertura, que conduz a ausência de fantástico, reduz a sua capacidade de percepção e a torna uma pessoa previsível e tediosa, numa estrutura rígida e estéril.


A questão que não estamos vendo não é a grandiosa imaginação de quem vê o mundo como algo a ser moldado por si. Aqueles que veem o mundo como algo a ser moldado por eles não possuem a humildade para compreender que a capacidade humana de apreender a totalidade dos fatos não lhes pertence. O que falamos é de outro tipo de imaginação, uma imaginação humilde que compreende que a humildade é o primeiro degrau da inteligência e do saber. É só com a humildade que podemos ver que o mundo é mais do que pensamos sobre ele, visto que não podemos abarcar o mundo em sua complexidade. Essa humildade nos permite ver que não vemos todos os detalhes, que a correlação dos fatos e objetos possivelmente nos escapa.


Quando dizemos que tudo é poético, as pessoas veem isso como uma linguagem comum ou, pura e simplesmente, um exercício de demagogia. A realidade é que não enxergamos o que está em nossa vida com os olhos de quem se admira, visto que nos julgamos acima de tudo o que está em nossa volta. O fantástico pode estar em tudo, inclusive no que é comum. Essa ausência de espantamento do intelectual moderno o leva a se afastar de tudo que está em sua volta. A arrogância lhe impede de ver o mundo, lhe conduz a querer mudar tudo. Só que ele não conseguiria, visto que isso requeriria mais do que a sua capacidade, a possibilidade de mudar o mundo requer uma inteligência sobrehumana, que não é acessível a nenhum intelectual ou burocrata.


A incapacidade de sentir a concretude de tudo por causa das abstrações que antecedem a própria existência da concretude é um mal de nossa intelectualidade desvairada. Ela indica tudo numa idealidade de quem foge. Foge da vida. Foge do próximo. Tudo está preso num esquematismo mental psicologista.  Só que esse psicologismo é mais um retorno a si do que uma abertura ao entendimento do mundo, pois o mundo nos escapa. Não podemos compreender o mundo, mas podemos amar o que está a nossa volta se nos abrirmos a esse amor. Amor esse que não podemos, de fato, compreender. A existência de uma verdadeira inteligência está ligada a uma humildade em que, no fim, não compreende o mistério profundo que a ata, mas magneticamente a conecta com tudo. 


É preciso compreender: há diferença em um estudo que torne tudo pequeno e um estudo que torne tudo grande. A simplificação para a compreensão é apenas um reducionismo para ser digerido por massas, mas não por homens e mulheres conscientes e sujeitos de si. O homem e a mulher aspiram a grandiosidade de uma vida mágica, mágica por ser concreta e fantástica em simultâneo.

domingo, 27 de outubro de 2024

Acabo de ler "Heretics" de G. K. Chesterton (lido em inglês/Parte 2)

 


Nome:

Heretics


Autor:

G. K. Chesterton


Se pudéssemos olhar todos os problemas do mundo, talvez chegássemos a algumas questões.  Chegaríamos a essas questões na medida em que olhássemos para o quão problemático o mundo moderno é e o quão imersos em problemas o homem moderno está. Como resolveríamos isso? Há quem diga que o que nos falta é realismo. Só que existe outro apontamento: somos pouco idealistas demais para sermos realistas. Podemos até ter motivos para olhar para a realidade, mas não temos ideias suficientemente fortes para tentar resolvê-los.


Anteriormente a negação vinha acompanhada de uma afirmação. A afirmação era prévia até a propriamente o que se negava. Hoje adentramos, cada vez mais profundamente, numa era em que buscamos atacar os defeitos do mundo sem nada que possamos colocar no lugar. Em outros termos, temos um inferno sem ter a possibilidade de um céu. Todo defeito é destacado com os arroubos meteóricos de uma retórica detalhada, mas toda virtude aparece sem coloração num quadro vago.


Houve um tempo em que aparecia diante se nós uma questão. Essa questão era uma pergunta cósmica acerca do sentido geral da existência. É nessa questão última que se revela cosmologicamende o sentido geral da existência. O sentido geral da existência subordina todas as outras questões, visto que todas as outras questões são secundárias. Com o tempo, quisemos nos libertar do peso da religião. Para tal, chegamos a conclusão de que não importava a filosofia ou a religião de alguém – tudo é relativo. Com isso, pulamos da pergunta para a resposta, resposta essa que seria singular. Essa forma de pensar levou a um não-pensar, visto que era a pergunta em si que possibilitava a nossa capacidade de resposta. Agora o que nos aparece não é a questão e nem a resposta. Estamos apenas por aí, vagando nesse universo de vácuo.


Pense, por exemplo, nas discussões modernas. Perguntamo-nos acerca do que é a liberdade, acerca do que é a educação, acerca do que é o progresso. Só que nos esquivamos, sempre e eternamente, sobre qual é a natureza do bem. Somente a natureza do bem pode nos dizer o que é a boa liberdade, o que é a boa educação, o que é o bom progresso. Sem sabermos primeiramente o que é essencial, não temos uma direção. A ausência de direção nos joga, novamente, ao acaso. Sempre estivemos andando em um labirinto, só que, graças aos nossos modernos sensos, estamos pela primeira vez andando num labirinto com a ausência de uma lanterna.


Falamos bastante em progresso e nos julgamos progressistas. Quanto mais progressista é alguém, mais essa pessoa é supostamente boa. Todavia o que define algo como um progresso? Se o progresso não tem uma finalidade, se não estamos caminhando para algum lugar, não podemos sequer medir se estamos indo bem ou mal em nossa caminhada. Não há como acreditar que tudo é relativo e dizer que estamos indo para o progresso, visto que o progresso, em si, seria relativo. Se o progresso é relativo, estamos indo pra qualquer lugar e isso não indica coisa alguma.


Para sabermos o que estamos fazendo, para sabermos para onde estamos indo, para sabermos se estamos bem ou mal, precisamos de um sentido. Progresso não pode significar que estamos mudando de direção a cada brisa de vento, mas precisamente que estamos indo a uma direção. Essa direção indica uma moralidade e indica uma fé quanto a essa moralidade.

Acabo de ler "Heretics" de G. K. Chesterton (lido em inglês/Parte 1)


Nome:

Heretics


Autor:

G. K. Chesterton


Há um tempo atrás, na história do homem, falava-se da importância das ideias e do que pensamos no universo. Hoje em dia, não cremos na importância das ideias – visto que são relativas – e nem cremos que a forma com que as pessoas pensam no universo é importante. No geral, tendemos a crer que a visão de alguma pessoa acerca de todos os pequenos detalhes da vida são importantes, mas a visão geral que ela tem da vida não importa.


A vida é definida por uma cosmologia. Sem cosmologia, não há base que se assente a vida. O que teríamos, sem uma cosmologia, não seria uma visão concreta. O que teríamos seria um monte de pontos soltos ligados pelas circunstâncias. Nenhuma consistência filosófica, apenas um punhado de ideias sobre alguns acasos.


Em tempos anteriores, questionava-se a razão de só pessoas consideradas ortodoxas poderiam falar sobre a natureza do homem. Após isso, liberais liberaram todas as heresias da Terra para que todos fossem livres para conversar sobre a natureza do homem. O resultado? Bem... Ninguém mais fala da natureza do homem e chegou-se a conclusão de que, no fundo, isso não importa.


Antes da revolução das ideias, todos tinham medo de se confessarem ateus. Depois da revolução das ideias, o homem colheu todo fruto da liberdade e não era mais sequer um heresiarca. Não há mais heresiarcas pois ninguém crê na importância das doutrinas, não havendo doutrinas não pode haver heresiarquia, visto que ninguém discorda sistematicamente de nada pois ninguém crê sistematicamente em algo.


O resultado de uma vida sem sentido, uma vida sem cosmovisão, não é uma "produtividade", mas sim a negação e a inércia. Hoje se fala muito de produtividade, crendo que o homem se levantará e produzirá mais no vazio da sua existência atual. Do que adianta a um niilista construir um palácio se ele não vê sentido algum nessa ação? Toda ação é previamente envolta na ausência de causa.

segunda-feira, 15 de julho de 2024

Acabo de ler "Sacred Chaos" de Françoise O'Kane (lido em inglês/Parte 3)

 


Como o lado sombrio pode ser confrontado? O Self é a experiência mais imediata do divino. Todavia esse divino não é uma divino tomado de forma "absolutamente boa", o "divino" abriga uma espécie de substância caótica que é tão psicologicamente importante quanto a parte "sagrada". A má relação entre os dois polos (trevas e luzes) leva a um deslocamento psíquico. Se a má relação causa deslocamento, então a confrontação não é psicologicamente adequada. É preciso que exista uma estabilidade e uma integração.


Vivemos numa sociedade ainda cristianizada e faz parte da nossa cultura a repressão da parte considerada ruim. Essa repressão alimenta a nossa sombra, fortalecendo-a inconscientemente. Não estamos nos afastando do "mal", mas colocando-nos impotentemente ante a sua secreta influência. Dentro do psiquismo, bem e mal fazem paradoxalmente uma unidade. Dentro da cultura cristã, aparecem como irreconciliáveis. A ideia de apagamento do mal pode levar paradoxalmente a um desequilíbrio mental e na ausência da percepção do mal que causa. O mal pode ser, então, racionalizado numa estrutura argumentativa (atacar homossexuais por eles não se adaptarem a estrutura reprodutiva da sociedade, por exemplo) que torne palatável ao ego – tornando a prática do mal como inconsciente a própria pessoa.


Só que falar de "integração da sombra" é algo simples, embora socialmente inadequado – defender que existe um mal dentro de nós e que ele deve ser usado e até mesmo aceito chega a soar absurdo para os "ouvidos mais leigos". Quando pensamos nos mecanismos sociais, eles até agora não demonstraram uma solução satisfatória para a utilização da energia sombria que existe em cada um de nós de uma forma que não seja socialmente tóxica. A utilização da energia sombria pode ser perigosa, mas o seu acúmulo também leva a disrupções sociais. Como já escrito anteriormente, a ideia de que temos que ser bons o tempo todo leva a um acúmulo energético negativo que consequentemente nos leva a ser inevitavelmente maus – e, ressalto mais uma vez, muitas vezes de forma inconsciente.


A imagem do divino (Imagino Dei) e a imagem do Self estão intimamente correlacionadas. A inexistência do mal na doutrina cristã – principal influência teológica da sociedade ocidental – na imagem de Deus leva a uma percepção deturpada da própria estruturação do psiquismo. Essa falha tem um efeito colateral na nossa sociedade. Ainda mais quando temos em mente que a ideia acerca do caos é atrelada ao feminino e o feminino não aparece na trindade. A ideia de "ordem" e "positivo" aparecem de forma inconscientemente maniqueísta na estrutura de pensamento teológico de muitas igrejas cristãs. O cristianismo ao dizer que o mal não está em Deus, cria uma visão em que o mal só pode ser banido para se aproximar de Deus.


A verdadeira natureza do Self está na completude da integração dos elementos, não podendo ser confundida com a negação dos elementos em prol de outros. A capacidade de compreender os diferentes polos do Self e de aceitá-los é de natureza essencial para a maturação do psiquismo. A negação só fortalece inconscientemente o lado que se reprime.

sábado, 6 de julho de 2024

Acabo de ler "Sacred Chaos" de Françoise O'Kane (lido em inglês/Parte 1)

 


O Self não faz divisão de valores. Ele é a totalidade, isto é, sejam compostos considerados pelo próprio "Ego" como bons ou ruins. Quando nossos valores, moralidade e virtudes entram em choque com uma realidade que nos nega, existe uma tentativa de puxar "os conteúdos caóticos" de dentro de nosso ser e pô-los em prática. O lado irracional e sombrio é inerente ao psiquismo, ele pode ser custosamente reprimido, mas não pode ser retirado. Ou seja, ele estará conosco onde quer que estejamos e poderá despertar quando menos esperarmos.


O eterno conflito da natureza humana, ele aparece diversas vezes durante a história. As linhas mais avançadas do cristianismo defenderam que o mal está circunscrito na esfera da ação moral, mas não é uma existência por si mesma. Por outro lado, existe uma versão maniqueísta em que há um dualismo no mundo. Um "deus bom" e um "deus mal", opostos dialeticamente. Existe a gnose que separa duas deidades, a material e a espiritual. Os problemas do mundo teriam surgido através da criação do mundo físico.


Ora, o elemento do caos – a ausência de regularidade e estabilidade – gera sempre uma outra percepção acerca da humanidade. Por exemplo, existe dentro da mentalidade revolucionária uma ideia positiva. Do caos, surgirá uma ordem mais justa, socialmente mais equilibrado e em que os recursos são dispostos de forma a favorecer o bem comum. Logo o caos é percebido instrumentalmente, o caos serve para a criação de uma ordem. O revolucionário não defende o caos pelo caos, mas a geração de um caos para a destruição da ordem existente. Isso tendo em vista uma nova ordem. Esse fenômeno pode ser enquadrado como uma espécie de "sedução sombria".


É possível dizer que existe um mecanismo de regressão. Essa regressão é, particularmente, enquadrada como um mecanismo de retornar a passos anteriores – idades mentais anteriores – para resolver um conflito presente. Isso leva a uma perda do "quadro psicológico" em sua inteireza.  Isto é, se o psiquismo pode ser enquadrado como um quebra cabeças em que há graus maiores de consistência e inconsistência pelas partes que faltam ou estão devidamente integradas perante o aspecto momentâneo e dinâmico da vida. Quando entramos em crise, há um obscurecimento e perda quantitativa dos fragmentos que estavam integrados, o que leva uma perda qualitativa do autocontrole psíquico e da estabilidade mental. Usualmente levando a infantilização e imediatismo.

quinta-feira, 20 de junho de 2024

Acabo de ler "Palavras para Desatar Nós" de Rubem Alves

 



Ler Rubem Alves é, para mim, algo terapêutico. Isto é, serve-me de auxílio nos momentos mais complicados de minha vida. Este homem tem uma escrita pacífica e bastante densa. Consegue, por meio de tons suaves, traduzir toda uma realidade complexa. Essa capacidade extraordinária é algo invejável.


Rubem Alves é um homem bastante interessante. Vindo do meio protestante, escreveu um livro falando sobre como o catolicismo teve mais protagonismo na cena progressista do que o protestantismo, natural detentor desse termo. O que chega até mesmo a soar uma incógnita: como uma hierarquia dita como altamente hierarquizada e não sujeita à mudanças poderia ser palco duma revolução? Talvez seja pelo inerente costume das massas de terem apego às tradições, mesmo quando elas não consigam sistematizá-las. Sou da tese que o catolicismo foi mais progressista pelo fato de que os sacerdotes, freis e monges têm maior formação acadêmica.


De qualquer modo, esse livro apresenta toda a característica de uma crônica: ele é suave e faz referência a vida cotidiana de Rubem Alves. Sem cair numa gigantesca abstração tipicamente acadêmica ou num vazio de futilidade tipicamente mundano ou corriqueiro.


Em Rubem Alves, simplicidade e academicidade aparecem lado a lado de forma harmônica, sem que uma acabe por ferir uma a outra. Sua erudição, que aparece de forma simples, continua a ser assustadora e encantadora. Um livro que qualquer um poderia ler, mas que também edificaria a vida de qualquer pessoa que lesse.

segunda-feira, 20 de maio de 2024

Acabo de ler "Em Defesa de Stalin" de Vários Autores (Parte 14)

 


Voltamos a análise do Instituto Marx Engels Lenin sobre a vida de Stalin (páginas 219 à 228). O que são as questões doutrinais? Meras abstrações? Norteadores da conduta ontológica da humanidade? Vulgaridades perante a prática? Algo que esquecemos quando começamos a agir verdadeiramente? Creio que, com base numa série de estudos, posso afirmar que as questões doutrinais sempre pesam radicalmente na conduta humana. Ao menos naquelas pessoas que, conduzidas pelo uso da razão e pela busca de uma vida de significado, buscam viver uma vida de propósito e missão.


Numa revolução em que as próprias ideias anteriores são atacadas e se busca colocar um sistema de ideias novo para que a máquina do Estado se renove ou se mude as questões políticas e quais ideias políticas vão ser aplicadas são de importância vital. Isto é, era da natureza mesma desse processo uma disputa doutrinal entre os revolucionários e uma batalha pela hegemonia para a condução do poder. E a luta doutrinal não se fazia só entre marxistas, liberais, monarquistas, reacionários e conservadores. A luta também era entre aqueles que posteriormente seriam chamados de "sociais-democratas" e aqueles que são anarquistas, socialistas revolucionários e também os chamados trotskistas.


Stalin, assim como todos envoltos nesse processo de radicalização para uma mudança, buscou uma forma de defender as suas ideias. Foi combatente fiel. Lutou contra trotskistas, socialistas revolucionários, anarquistas e sociais democratas. Combateu aquilo que chamou de "burguesia democrática" e outras tendências que estariam mais para a esquerda legalista e outras tendências revolucionárias.


Veja que a luta entre cristãos e gnósticos, nos primeiros momentos de nosso século, também carregava forte aspecto doutrinal. Na revolução francesa, a luta doutrinal também era bastante característica. A humanidade, sempre narrante, briga por suas narrativas de tempos em tempos. Daí o aspecto conflitual das ideologias, religiões, ideias e doutrinas que se chocam com uma periodicidade fulminante e que são um fato histórico em todas as épocas.

sexta-feira, 7 de abril de 2023

Acabo de ler "O Sistema Social no Islam" de Sayyed Hashem Al-Musaui

 



O Islã é uma religião diferente do cristianismo. Enquanto o cristianismo deixa a regulação social, ou a forma de configuração do Estado, ao âmbito das decisões da sociedade, o islã procurará uma união íntima entre o Estado e a Religião. No caso do cristianismo, a união figuraria como uma deificação do Estado - tomada sempre como ruim; já no caso do Islã essa é uma necessidade lógica.


Partindo-se da ligação intrínseca entre o pensamento religioso e o Estado, a própria religião, em seu livro sagrado, terá dispositivos em seus textos para que o Estado funcione de forma submetida a realidade do Islã. Ou seja, o Islã não é só uma fé professada num âmbito privado e não tocado pelas práticas mundanas, constituí também uma comunidade jurídica. É por isso que o estudo do Islã não é só teológico, há uma série de estudos em que se divide o Islã.


O Estado Islâmico é, propriamente, a forma com que a religião moldará o Estado ao seu serviço. O que soará, para muitos ocidentais, como algo estranho ou danoso as atividades das duas partes. Cristãos não querem que o Estado torne-se regulador da religião e nem a subverta naquilo que há de mais próprio. Já o Estado não quer o poder eclesiástico, de natureza espiritual, em seus meandros. Se os dois processos ocorrem, os dois perdem a sua distinção - em nossa mentalidade ocidental.


Aqui temos que reconhecer que: a análise é dificultada por causa das mais diversas questões a serem pontuados. A sociedade islâmica, em seu início, logrou um aumento quantitativo e qualitativo de vários direitos que eram inovações bastante atentas as necessidades correntes das sociedades em que se circunscrevia. Porém os muçulmanos se dividem em muito em como deve ser a organização nos tempos de hoje. Vejam exemplos do Estado da Turquia e da Arábia Saudita. Um adota um parâmetro semelhante ao ocidental e outro adota um parâmetro que poderíamos considerar mais tradicional ao Islã.


De qualquer modo, o que fica do livro é o entendimento de que, ao seu modo, o Islã traçou uma sociedade que ainda é uma surpresa constante aos estudiosos do caso. E seria difícil uma análise completa.

sexta-feira, 24 de março de 2023

Acabo de ler "A Igreja no Brasil-colônia" de Eduardo Hoornaert

 



O livro, escrito por um sacerdote católico, traz uma abordagem bastante crítica da história da Igreja no Brasil colonial. Sendo bastante contundente, traz uma diferenciação entre o tratamento dados aos povos indígenas e aos povos africanos. Além de estabelecer diferenças entre as diferentes ordens e como atuavam dentro do território do Brasil colonial.


A missão da Igreja no Brasil se confundiu com os objetivos colonizadores portugueses muitas vezes, levando até mesmo a perda de seus critérios messiânicos e evangélicos em prol do empreendimento português. Um exemplo claro disso é a forma com que parte da sociedade requeria o trabalho escravo indígena e como se posicionaram as diferentes ordens católicas frente a esse posicionamento. Os jesuítas tenderam a desfavorecer essa iniciativa, já outras ordens se posicionaram com favorecimento dessa causa.


Por outro lado, houve uma diferença de tratamento bastante clara entre o indígena e o africano. O africano tendeu a ser abandonado a sua própria sorte e o indígena gozou do privilégio de algum respaldo das instituições religiosas. Houve também uma utilização maléfica da fé para fins de submissão, como um grande veículo cultural que implantava mensagens alienantes em prol da subserviência dos outros povos não-europeus. Diferenças de tonalidade de pele também foram usadas como critérios hierárquicos nas instituições eclesiásticas.


O mais interessante é que o autor da mensagem, bastante crítica para com a história da Igreja no Brasil, é um sacerdote e como ele se propõe a uma leitura imparcial e autêntica. Provando a capacidade modernizadora da própria Igreja Católica como instituição e como doutrina cristã.

domingo, 5 de fevereiro de 2023

Acabo de ler "La Edad Media" de Jose Luis Romero (lido em espanhol)

 



Escrever sobre a Idade Média, sobretudo num país tão atrasado em conhecimentos históricos medievalistas como o Brasil, é uma tarefa um tanto quanto ingrata e que possibilita toda uma série de margem para más interpretações e birras geradas após anos de distorções ou má interpretações históricas.


Deve-se pontuar que:

1. Grande parte da interpretação histórica medievalista surge dum período que sucedeu logo após ela e, muitas vezes, com caráter notoriamente negativista sobre todos os seus mais diversos aspectos;

2. Uma nova interpretação acerca da Idade Média vem surgido com uma revisão bibliográfica e dos mais diversos  documentos, todavia é recente e não foi acoplado ao conhecimento acadêmico comum;

3. Parte da história da Idade Média se perde pois o foco eurocêntrico impede uma olhar mais sistemático;

4. Grande parte do mito de "Idade das Trevas" impede um olhar mais atento a esse período que, diga-se de passagem, foram três e não um.


O livro traz uma análise sobre os três períodos medievais. Tratando da dissolução do Império Romano, a forma com que o cristianismo impactou as mudanças do mundo e como o papado tentou recorrentemente reestabelecer um Império - a qual poderíamos chamar de Cristandade. As lutas recorrentes também buscavam cristianizar a cultura e manter o legado civilizacional romano.


Fora isso, vemos o desenvolvimento conflituoso entre muçulmanos e cristãos - e como Mohammed unificou seu povo e, consequentemente, possibilitou seu desenvolvimento. O desenvolvimento da burguesia enquanto classe e como a fragmentariedade territorial causada pela nobreza levou monarcas a fortalecerem a classe burguesa também é tratado aqui.


Esse livro é, mesmo que curto, bastante abarcante das problematicidades que apareciam na época e tenta, em seu curto espaço, apresentar uma exposição metódica da situação. Vale a pena ler.

domingo, 22 de janeiro de 2023

Acabo de concluir o curso de "Ética Cristã"

 



Fazendo parte da grade curricular da pós-graduação em "Docência em Filosofia e Teologia", a "Ética Cristã" é uma de suas interessantes disciplinas. Não só complementa a outra disciplina ("Ética Geral e Profissional") como traz um aprimoramento e uma ótica cristã.


Os direitos humanos, olhados pela ótica cristã, traz já em seu seio uma frase veterotestamentária: o homem foi criado a Imagem e Semelhança de Deus. Decorre disso a razão e liberdade. E, igualmente, a sua condição como fim em si mesmo e portador duma natureza divina que o iguala a todos os outros homens sem qualquer distinção.


A ética cristã basear-se-á na fonte revelada (Sagradas Escrituras) e na razão natural (conhecimento adquirido sem auxílio da revelação divina). O que dá um caráter dialógico a formação da ética cristã, visto que está não está só inteiramente fundada numa posição teológica graças ao auxílio da razão. Este auxílio da razão, por sua vez, se faz pelo contato com a cultura contemporânea e insere a lógica cristã no período em que vivemos.


O cristianismo leva, de forma necessária, a um imperativo ético pelo qual o cristão é chamado a responder. A fé, per se, já é uma resposta do cristão ao chamado divino. O cumprimento dessa mesma fé, para que ela não seja um mero conhecimento doutrinal, se dá pelo respeito, amor e responsabilidade para com o próximo e para com a promoção de sua dignidade. O cristão é chamado a promover o bem-estar social com base nos preceitos éticos veterotestamentários e neotestamentários - essa, por sua vez, tendo foco na mensagem evangélica portada por Jesus Cristo.


Um curso extremamente interessante e conscientizador, vindo a calhar bem num momento em que direitos humanos são desrespeitados e o individualismo exacerbado busca romper o tecido social que produz uma sociedade harmônica - esquecendo que a pessoalidade é possível graças aos arranjos sociais, intercâmbios e sociabilidade que a possibilita - com interesses puramente egocêntricos e autocentrados. O respeito aos direitos humanos é, também, o respeito à humanidade portadora da Imagem e Semelhança de Deus.

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Acabo de ler "Esperança Além da Crise" de Mark Finley

 



Falar sobre esperança num período de crise global é algo meio comum, quiçá até mesmo entendiante de tantas vezes que essa palavra se repete no discurso público, todavia anunciar a esperança é um dever urgente e necessário. Sobretudo num cenário de covid e de guerra que destroem vidas, famílias, sociedades, economias. Vivemos numa fragilidade sistemática.


Agora, se você se pergunta o que é esperança, parafresearei Paul Tichilli. Explicou certa vez Paul Tillich que a esperança nada mais é que uma forma de "sonhar andante". Tudo que existe, pré-existiu anteriormente ou era dalguma maneira gerado pela ação humana de forma prévia para que no futuro viesse a existir. Essa é, notoriamente, a esperança cristã: um caminhar que antecipa o futuro beatífico. Para os cristãos, vivemos nas dores de um parto dum novo mundo.


O livro em questão fala muito sobre esperança e como mantê-la num período tão conturbado quanto o nosso. Um exemplo magnânimo disso na literatura bíblica é quando Jesus andou sobre as águas e Pedro foi caminhar com ele. Numa percepção simbólica: a água, a liquicidade, representa a mutabilidade do mundo imprevisível. Já a esperança, não se deixar afogar, é a persistência na realização dos sonhos. Dito isto, todo homem pode andar pelas águas.


Um livro pequeno, mas encantador. Leitura agradável, simplicidade e objetividade.

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Acabo de ler "O Mistério da Profecia" de Mark Finley e Loron Wade

 



Esse é o primeiro livro focado em teologia adventista que leio. O que foi, para mim, um choque divertido. Os vários pontos que se intercalam de forma diversa com as múltiplas linhas teológicas que tinha mais contato foram bons para eu ampliar meus conhecimentos no âmbito da teologia cristã.

O livro conta com um trabalho gráfico maravilhoso, contando com uma série de imagens e ilustrações. Além da capa grossa que adiciona um valor ainda mais na beleza do livro. Usualmente não sou de elogiar tal aspecto, mas como esse livro é de beleza sobressaltante, convinha elogiar essa parte.

Em relação ao conteúdo do livro, os autores trabalham os mais diversos pontos da teologia adventista dando um ar notoriamente sistemático. Essa capacidade e esse esforço demonstra um certo primor intelectual. Dificilmente alguém poderia apresentar uma obra que fosse, ao mesmo tempo, simples e sistemática.

Só que não só nessa parte o livro se destaca. As narrativas encontradas dentro do livro aumentam em muito a qualidade da obra. Tiram um pouco do peso da rigorosidade técnica e tornam a leitura mais fluída sem, contanto, diminuir o valor técnico da obra.

Considero um livro especialmente interessante em muitos detalhes. O conjunto geral da obra me encantou bastante.

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Acabo de ler "O que é Islamismo" de Jamil Almansur Haddad

 



O Islã é deveras interessante. Durante muito tempo, anteriormente ao comunismo soviético e bloco socialista, o Islã foi o maior desafio ao Ocidente e a sua identidade. Claro que não estou exortando, aqui, a rivalidade religiosa - não faz parte do minha índole.

É interessante observar que os germânicos venceram o Império Romano do Ocidente e os muçulmanos venceram o Império Romano do Oriente. Cosmovisões em conflito adquirem uma tonalidade apaixonante para qualquer um interessado em história.

O Brasil também deve muito ao Islã ao que se refere ao fim da escravidão. Foram africanos islâmicos ou islamizados que tiveram protagonismo alto e referencial nas insurreições. Evento que, por enquanto, não goza dum estudo acadêmico sistemático e de alta relevância e importância que merece.

Outro ponto a ser olhado é que: embora o cristianismo separe o poder temporal (político) e o poder espiritual (religioso), o mesmo não se dá teologicamente no Islã. Só que o tratamento jurídico dessa questão encontra-se no próprio Alcorão e é até bastante tolerante.

Com o crescimento do islamismo, possivelmente como maior religião do mundo em futuro próximo, o diálogo interreligioso e o (macro)ecumenismo tornar-se-ão cada vez mais necessários e frequentes.

Todas as questões levantadas, em época de escalada de conflito, ditarão o possível futuro que teremos. Adiar a questão, não preparar-se, seria duma insensatez brutal.

domingo, 25 de setembro de 2022

Acabo de ler "O que deu errado no Oriente Médio" de Bernard Lewis

 



Há muito tempo atrás, a civilização islâmica era o cume da civilização. Uma sociedade de liberdade, ciência e criatividade. Os ocidentais, sobretudo cristãos, importavam os conhecimentos dos seguidores de Alá. Só que, com o tempo, tudo foi indo ao brejo e o Ocidente ultrapassou o Oriente.

Dizer que toda pessoa do Oriente Médio é muçulmana seria estranho e insensato. Por muito tempo, judeus e cristãos divergentes iam para os domínios muçulmanos para terem liberdade. Essa liberdade era maior que na própria Europa, todavia essa liberdade tornou-se menor na medida em que a Reforma, o Renascimento, as Revoluções Políticas e Industriais tomavam forma no Ocidente. A situação entrou numa inversão: os muçulmanos não eram mais donos da ciência e da liberdade, os terrenos cristãos e, seguidamente, pós-cristãos cresciam cada vez mais. O imitado tornou-se imitador.

Como uma civilização que já foi a mais criativa, igualitária e científica pode, então, retornar à glória de outrora? Existem duas vias principais: a dos fundamentalistas que almejam o retorno ao assim chamado islã primitivo e aos dos modernizadores que querem atenuar o poder diretivo da religião - separando "Igreja" e Estado, tal qual no Ocidente. Só que essa separação, em grande parte, nunca existiu no horizonte de pensamento teológico do Islã.

Virão aqueles que pensaram que a escolha por uma separação entre religião e política nada mais é do que submissão política e cultural ao Ocidente. E haverão aqueles que defenderão, com unhas e dentes, uma modernização do debate religioso. De qualquer forma, o destino da alma civilizacional islâmica se encontra em choque e não sabemos o que se sucederá.

Eu posso dizer que não li esse livro, eu o devorei. Tive que ficar durantes horas parado, lendo minuciosamente e adquirindo, com êxtase, as informações que me eram disponibilizadas. Todos os choques culturais me trouxeram, também, a dúvida de como o Brasil poderá modernizar-se ao novo tempo presente. Igualmente aumentei meu grau de empatia e conhecimento sobre a civilização islâmica - que me encanta cada vez mais.

segunda-feira, 5 de setembro de 2022

TRANSFORMEI "O LIVRO DA INTENÇÃO" DE RAIMUNDO LULIO EM AUDIOLIVRO!

 



É com prazer que anúncio que acabo de transformar mais um livro em audiolivro. Sinta-se convidado(a) para ouvi-lo no Spotify ou no YouTube pelo canal "Latir contra os Grandes"!

Nesse livro, Raimundo Lulio trabalha sobre o ordenamento da vida em si e como mortificar os maus gostos e ascender na aspiração das coisas celestes. Um livro excelente a quem busca um maior relacionamento com o divino. Um grande clássico teológico da Idade Média. O livro poderá ser ouvido em estado completo no Spotify e em fragmentos no YouTube.

Spotify:

YouTube:

quinta-feira, 21 de julho de 2022

Prelúdios do Cadáver #10 - Bissexualidade, Conservadorismo e Cristianismo

Texto publicado em 30/08/2018


Estou no Contra os Acadêmicos desde que vi o Vitor Matias anunciar o grupo. Quando entrei, em meu perfil antigo, o grupo não tinha nem cem usuários se não me engano. Vejo que a sexualidade é um importante assunto no grupo, quase nunca comentei nada nesse longo tempo que estou aqui e, então, agora resolvi falar um pouco de minha orientação sexual, de minha religião (cristã) e do movimento LGBT.

Esclareço, desde já, que isso não é uma apologética ao movimento LGBT e também não é uma apologética ao movimento anti-LGBT. Essa minha "argumentação" mais parece uma confissão de uma pessoa enlouquecida com a própria condição que lhe foi posta e que fica oscilando entre o bissexualismo e o heterossexualismo forçado. E ficando-se com a questão: é mais natural seguir meus impulsos e ser plenamente bissexual ou viver numa luta interna para reprimir meu lado homossexual e viver numa heterossexualidade forçada?

Sou bissexual. Minha orientação sexual é motivo de angústia para mim e para meus familiares. Meu desejo sexual é, para mim, um pecado que não consigo me retirar. Resumidamente: minha sexualidade é uma maldição. Muitas vezes, caio numa contradição brutal: quero e não quero ser bissexual. Por vezes, tomo a minha orientação sexual por natural; por outras, como inatural e pecaminosa. Sei que nasci com ela, não sei o que fazer com ela. É-me uma sorte ser bissexual, pois assim posso ignorar uma “parte de mim” e ter uma “vida normal”. Todavia estou sempre em contradição comigo mesmo: nunca sei o destino que tenho que dar a minha orientação sexual.

Como disse, eu oscilo demais. Muitas vezes, há um instinto que me leva a pensar que devo achar a minha orientação sexual normal e cometer atos sexuais que me são, ao mesmo tempo, uma gratificação e um pecado mortal. Noutras vezes, uma razão ressoa alertando-me para que eu não pratique a sodomia. Vivo na constante exitação, ora achando o bissexualismo normal, ora achando-o doentio.

Sou bissexual e quem está a me acompanhar há um bom tempo sabe disso. Houve um tempo em que eu falava de minha sexualidade abertamente, hoje quase nunca falo – falei recentemente, mas para atacar argumentativamente um militante LGBT. Isso, minha omissão a respeito de minha sexualidade, acontece por causa de meus desentendimentos para com a “tribo urbana LGBT”. Não quero ser associado a superficialidade e militância que ela, a tribo urbana LGBT, faz. Então prefiro não falar de minha orientação sexual pois evita qualquer tipo de estereotipação.

Escrevi “tribo urbana LGBT” ao invés de “comunidade LGBT”. Há uma razão para isso: existe dentro da comunidade LGBT uma tribo urbana LGBT que tem a sua própria gíria, a sua própria pauta e o seu próprio modo de ser e de se vestir. Como acho tosco a tribo urbana LGBT e odeio as suas imposições, prefiro não tomar partido falando de minha sexualidade abertamente. O fato é que, como toda tribo urbana, ela é uma seita composta por uma microideologia.

Por que uma seita e por que uma microideologia? Fácil. Uma seita pois ela isola-se em si mesma, não permitindo o contato com pessoas fora de sua bolha. Como toda bolha, ela é agressiva com desertores e contra pessoas que não se encaixem nela. Uma microideologia pois a mesma releva-se em sua particularidade, a pauta LGBT, e tenta suas ações baseadas nesse microcosmo. Tal como o movimento negro é uma microideologia, o movimento feminista também é uma microideologia, o movimento LGBT também deve ser considerado uma microideologia.

O pecado distorce a visão. Como cristão, não sei como enxergar a minha orientação sexual. Sei que, desde novo, tenho-a como fiel acompanhante. Se a minha orientação sexual de fato é um pecado e o pecado corrompe a visão, como posso enxergar a Verdade? Sempre acabo caindo instintivamente no desejo pelos dois sexos. Sempre que penso em combater o LGBTismo, penso que estou a combater a mim mesmo. No fim, sempre acabo por realizar a minha perversão.

Como cristão, não sei qual argumentação teológica devo seguir. A minha orientação sexual é um dos motivos pelos quais oscilo entre o catolicismo e o protestantismo, aplicando ora uma modelo tradicional, ora um modernista que compactue com a minha sexualidade. Frequento a missa semanalmente e ainda fico para o grupo de jovens. Sinto-me, então, um hipócrita perdido na tibiez. O fato é que nunca poderei ser plenamente católico se eu continuar assim.

Sobre a “cura gay”, já ouvi relatos de homossexuais que queriam ser, no mínimo, bissexuais para poderem engravidarem uma mulher e terem filhos. Também vi muitos que queriam serem heterossexuais pois não gostavam do comportamental dos outros homossexuais.

Os chamados “grupos homossexuais ou LGBTs”, sejam eles virtuais ou reais, são imersos numa promiscuidade, numa liberalidade e numa superficialidade que faz com que certos membros da comunidade LGBT sintam-se enojados consigo mesmos e com o restante da comunidade. O sexo fácil é, para todo integrante da comunidade LGBT, não um mero jargão e sim uma prática incrivelmente documentada pela internet indicando vários “points de pegação”; tal liberalidade sexual é muito equidistante da liberalidade heterossexual. Dito isso, é natural ficar enojado com tamanho indiferentismo para com o afeto. O sexo puro não é sinal de liberdade, mas sim dum impulso bestialógico que escraviza corpos e almas. Então, em minha sincera opinião, querer ver-se livre duma comunidade tão bestializada pelos impulsos é muito natural e, até mesmo, uma virtude.

Se eu pudesse escolher, não seria bissexual. Sempre tratei a minha parte homossexual com uma profunda angústia e arrependimento. Sempre que praticava a sodomia, sentia-me abismado e cortado ao meio. Minha consciência moral diz-me que estou a praticar um ato criminoso, um ato imoral. Para mim, minha sexualidade não é motivo de orgulho e sim de dor e sofrimento.

Já tentei falar com minhas psicólogas sobre a sexualidade, elas tomaram como algo natural e que devo agir “naturalmente” com a minha orientação sexual. Muitas vezes, como já escrevi, entro por essa linha de raciocínio. Por outras, culpo-me.

Dito tudo isso, esse é um dos meus maiores dramas existenciais. Uma questão que resumir-se-ia no “Ser ou Não-ser: eis a questão!” de minha existência. Deixo, convosco, as admoestações e argumentações a respeito disso. Agradeço, antecipadamente, a todos que lerem e que responderem essa publicação.

Prelúdios do Cadáver #8 - Breves Notas Sobre Tudo

Texto publicado em  25/08/2018


Relutei em escrever esse texto, todavia achei-lhe absolutamente necessário. O Brasil vem passado por um incessante movimento de politização. Usualmente tendo a não expressar a minha visão política e, quando eu chego a expressá-la, expresso-a relutante e timidamente.


Sou uma pessoa que está em grupos políticos dos mais variados gostos. Meu facebook é, verdadeiramente, uma diversidade filosófica e ideológica ululante. Acontece que, após ver e ler séries de repetições argumentativas rasas, fiquei decepcionado com a rasura e incapacidade crítica de meus queridos amigos/colegas virtuais. Claro que alguns destemidos salvam-se perante esse caldeirão de lodo.


Também relutava em criar qualquer texto durante a minha jornada de retiro intelectual, todavia não estava aguentanto a atmosfera tenebrosa que provejetava-se em minha querida rede social. Era evidenete também as consequências que essas movimentações também faziam no mundo real.


1. O NTC

O NTC é uma sigla composta por três nomes: nacionalismo, tradicionalismo e cristianismo. Juntei-as pois os seus simpatizantes e ideólogos caracterizam-se por uma condição: o desprezo a modernidade e tudo aquilo que a modernidade representa.


Os nacionalistas não odeiam a “modernidade” ao todo, mas têm certo desprezo dela por causa de sua incapacidade de respeitar as barreiras territoriais, por causa de sua incapacidade de preservar a diversidade cultural, por causa de seu desrespeito as tradições – e, nisso, acham apoio dos tradicionalistas. Os tradicionalistas fazem por motivos razoavelmente parecidos com os nacionalistas, embora mais focados na tradição de seu país. E os cristãos, nesse balaio, acham que a moral cristã, que querem impor a todos, está sendo substituída por uma moral anticristã.


Há também um movimento cristão católico que defende a criação de um Estado confessional – leia-se: Estado declaradamente católico. O mesmo Estado favoreceria a Igreja Católica. O Estado também seguiria a moral católica. Isso, é claro, é um devaneio teocrático reacionarista. A verdade é que o movimento cristão católico – tradicionalista assumido ou não – defende algo que seria muito similar ao que acontece em países islâmicos, só que de maneira cristã. Nisso há uma divisão entre os católicos não-integralistas e integralistas, que defendem quase a mesma coisa só que de maneiras diferentes. Há uma rixa entre eles. Existem católicos que defendem que o integralismo é uma doutrina herética, isso são outros quinhentos e não vou me delongar nesse assunto.


Antigamente, havia uma divisão clara entre o nacionalista e o patriota. Hoje em dia há uma confusão. O patriota, em seu emprego terminológico antigo, era uma pessoa capaz de amar o seu país e respeitar o que pessoas de outros países também sentiam pelos seus países; o nacionalista, no passado, era tido quem amava seu país e aceitava qualquer decisão do seu país sem titubear, o nacionalista não conseguia compreender o que pessoas de outras nacionalidades sentiam pelos seus países. Como essas duas empregações terminológicas estão ultrapassadas, prefiro não usá-las aqui.


Quanto ao Brasil, sou pragmático. Prefiro uma economia que seja sustentável, capacitada de fornecer um bom padrão de vida e que dê um bom desenvolvimento tecnológica do que uma fortemente pautada pela defesa irracionalizada dos bens nacionais. Para que eu não seja mal compreendido já digo que sou centrista. Defendo um papel atuante do Estado, só que de forma pragmática e não conduzida por motivos ideológicos maniqueístas.


Sobre a questão tradicionalista e cristã. Oponho-me aferradamente, mesmo que eu seja cristão. Compreendo a separação entre o Estado e a religiosidade, também não defendo a forçação de tradição. Nesse sentido, compreendo que o cristianismo e a tradicionalidade devem serem postas opcionalmente e não forçosamente. É preciso que elas apresentem-se como uma escolha boa e não como uma obrigação feita por meio da coerção que é imposta.


2. O Movimento da Renovação Cristã/Católica Carismática

Antes de começar a falar da RCC, já aviso antecipadamente que não sou um defensor ferraz da “Santa Tradição” e que reconheço alguns méritos da RCC. Tenho uma certa ogeriza e rivalidade para com o movimento carismático. Apesar de muitos de meus amigos saberem disso, muitos não o sabem. Isso acontece também por minha culpa, toda vez que me manifesto sobre o movimento carismático acabo por fazê-lo timida e concisamente.


As minhas razões são simples. Em primeiro lugar, há a presença de técnicas hipnóticas feitas nas orações conduzidas pela RCC, há quem defenda isso como perfeitamente moral e que a hipnose é aceitável nesses casos; mas eu sou contra pelo fato de que a maioria dos frequentantes desses locais não sabem que há técnicas de hipnose no meio de tudo isso e, desse modo, não são capazes de opinar a respeito. Em segundo lugar, a RCC torna o cristianismo em um sentimentalismo vulgar, esquecem-se das meditações existênciais propostas a todos os cristãos e, por conseguinte, tornam o cristianismo em algo que os intelectuais riem apaixonadamente.


Em todo esse movimento de sentimentalização do cristianismo, o velho lema “fé e razão” tornou-se um passado reacionário e não um guia para todo cristão basear-se não tão somente na fé, mas também na boa utilização da razão. Um dos efeitos mais notáveis dessa sentimentalização é criação de cristãos incapazes de refletir, cheios de si e que são ridicularizados pelos mais densamente intelectuais. Muitas pessoas que buscam esperançosamente a salvação, encontram um cristianismo bobo alegre e sentimentaloide que lhes causa nojo e afastamento.


3. Olavo de Carvalho

Há muito tempo atrás, criticava ferrenhamente o dito cujo. Todavia não tinha estudado a sua obra. Após ler dois livros dele e estar lendo o terceiro nesse momento, vejo que a maioria das críticas que o autor recebe são estúpidas e, até mesmo, inválidas. Reconheço que Olavo é uma pessoa extremamente inteligente, que possui uma estilística insuperável e uma capacidade de argumentação superior a maioria gritante de seus odiadores. Acho-o um autor extremamente agradável de se ler, embora não concorde com tudo que ele diz. Efeito semelhante ocorre com Chesterton, pelo qual também nutro grande admiração intelectual.


4. Pós-Modernos

Nos últimos tempos, tenho lido alguns autores pós-modernos. Incluindo aí autores pós-modernos nacionais e internacionais. Noto que, quando os leio, vejo muita coisa apreciável e, é claro, uma inteligência ilustre. Consigo gostar tanto dos progressistas pós-modernos quanto gosto dos conservadores que leio. Isso me torna meio termo e em cima do muro.


Todavia é-me odiável a maioria de sua militância – tal como é, similarmente, meu ódio a militância conservadora. Há uma vulgaridade, irracionalidade e tribalidade em toda militância, por isso grande parte é constituída por estúpidos homens-massas.


5. A Democracia

Já odiei a democracia de dois modos: como um totalitário e como um libertário. Hoje em dia, ponho-me na defesa dela. Posso dizer que acredito agora na pluralidade de visões, religiosidades, partidos políticos, culturas e tudo o mais. Não substituiria isso por nada.


O movimento antidemocrático concebe-se da incapacidade de muitos brasileiros em estudar e aprender visões divergentes das suas. Essa acusação vai e é perfeitamente cabível para todos os espectros políticos. O problema do Brasil não é a democracia, é a falta de esforço intelectual em aprender a estudar e aprender sistematicamente diferentes escolas de pensamento. Quando houver tal esforço intelectual por parte de nossa população, a maioria das implicações religiosas, políticas, econômicas e intelectuais dissolver-se-ão.

Procurando a Casa dentro de Casa

Eu estive procurando uma casa. Não uma casa qualquer, mas a minha casa. Andei pelas escadas de minha casa, para achar a minha casa e não achei a minha casa. Procurei afagos de meus animais em minha casa, achando que dar-me-iam o sentimento do retorno a minha casa. Procurei no rosto de meu pai a minha casa, mas nele não encontrei. Procurei deitar na cama de meu quarto assim poderia lembrar do velho aconchego de minha casa, infelizmente não senti nada parecido como estar em casa.


Equidistância brutal, intimidade sem objeto, memória sem doçura. Procurei no beijo duma doce mulher o retorno a minha casa. Só que em teus lábios minha casa não estava. Procurei, então, correr pelo quintal de minha casa até chegar a minha casa. Só que ao correr pelo quintal de minha casa, senti-me cansado sem nunca chegar a minha casa. Duvidei de mim mesmo, duvidei de minha pessoa, duvidei de meu ser. Se o ser é, por que tudo na vida leva a crer que não pode sê-lo? Viajei por aí, tentando toda hipótese. Procurei me encontrar no beijo não de uma mulher, mas de um homem. Seus lábios não eram macios, eram ásperos. Senti algo diferente, senti um bater de coração, mas não senti a minha casa. Seu beijo era para mim, meu beijo era para ele, mas meu beijo encontrava-o sem que o beijo dele me encontrasse. Equidistância que gera distância em proximidade.


Não me leve a mal, só busquei a minha casa. Pouco importando se era hétero ou homossexual. Só queria buscar a minha casa. Afaguei-me em travestis e prostitutas, para nelas tentar encontrar a minha casa. Frequentei puteiros procurando a minha casa, mas em cada puteiro não me encontrei em minha casa. Amei uma garota, amei fortemente uma garota, acho que ainda a amo. Ela hoje é mulher, eu hoje sou homem. Só que a minha casa estava nela, mas a casa dela não estava em mim. Como resultado, namora outro homem.


Eu peguei livros. Livros que poderiam formar um edifício em meu quarto. Procurei em cada livro do meu quarto a minha casa. Nem em meu quarto acho mais a minha casa. Nem em teu beijo acho a minha morada. Procurei trazer bebidas, trouxe vodka, cerveja e vinho. A bebida que trazia para minha casa não me lavava para minha casa. Procurei na bebida o esquecimento de minha casa para não sentir saudade de minha casa. Embriaguei-me na constância para me esquecer de minha casa. A minha casa fazia-me um tamanho mal, não por ser minha casa, mas pelo fato de eu não poder voltar a minha casa. Eu queria somente a minha casa, mas minha casa não encontrava. A minha dor era buscar a minha casa, a minha felicidade seria achar a minha casa, só que não a encontrando, só podia sentir dor por não achar a minha casa.


Usei de tudo. Maconha, pó e lança-perfume. Camisa de time, terno e lingerie. Procurei o rúgbi, o Mario Kart e a espada samurai. Nada de casa, nem em jogo, nem em esporte e nem na luta mortal. Onde estava a minha casa? A maconha que fumava era para não me sentir distante de minha casa. O pó que cheirava era para estar perto de minha casa. O lança-perfume era para chegar em casa. A torcida com que gritei ao lado, a torcida com que xinguei o juiz, não me levou para casa. O terno que utilizei com esmero para o subemprego não me levou para casa. A lingerie, num ato de loucura e disforma de identidade, que utilizei pensando que chegaria em casa não me levou para casa, mas para caminhos tortos de gozo barato.


Procurei ler em cada livro minha casa no exílio de meu quarto. Procurei em cada falso amor um retorno ao verdadeiro amor de minha casa. Aceitei a prostituta como a única mulher que poderia ter em minha falsa casa. Aceitei o sexo banal da madrugada. Fiz casamentos forjados para ver se chegaria em casa. Só que nada me levou para minha casa. Logo nada disso me valeu. 


Perdoe-me, Deus. Eu nunca quis fugir de casa. Na verdade, eu não sabia que minha casa era minha casa. E por não saber que minha casa era minha casa, por outras casas andei em perene exílio. Andava então de casa em casa, cada casa era um aperto e uma prostituição. Nesse tempo estive na solidão da solidão. Perdoe-me, Deus.