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quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Acabo de ler "Teologia do Domínio" de Eliseu Pereira (Parte 6)

 


Nome:

TEOLOGIA DO DOMÍNIO: UMA CHAVE DE INTERPRETAÇÃO DA RELAÇÃO EVANGÉLICO-POLÍTICA DO BOLSONARISMO


Autor:

Eliseu Pereira


“O Estado é cristão e a minoria que for contra, que se mude. As minorias têm que se curvar para as maiorias” (Jair Messias Bolsonaro)


A ideia de que uma maioria cristã pode colocar "leis compatíveis com as suas crenças" é bastante falha. Em primeiro lugar, não há uma unidade doutrinal dos cristãos brasileiros. Em segundo lugar, isso feriria a própria laicidade do Estado. Em terceiro lugar, isso fere o Brasil enquanto país plural. Em quarto lugar, os não-cristãos seriam oprimidos por uma maioria.


O objetivo dos evangélicos no Brasil é colocado numa frase bastante esclarecedora:


“Eles desejam ‘restabelecer’, por meio da conversão individual, da inculcação da moral cristã, do uso da mídia e da participação direta nos poderes políticos constituídos, uma espécie de neocristandade, a dominação cristã do Estado e da vida privada” (Mariano)


O objetivo de construir uma nação evangélica e construir uma neocristandade é um objetivo totalitário. O maior inimigo dos humanistas e democratas no Brasil não é, como muitos creem ser, o fascismo ou nazismo. Esses grupos (fascistas e nazistas) são meramente minoritários e estão perdidos em algumas células de radicalidade. Não entram na maioria da população. Se há um inimigo poderoso o suficiente para arrombar as portas do Estado e remodelar o país num projeto totalitário, esse inimigo seria a Teologia do Domínio.


A Teologia do Domínio se utiliza do chamado "cristianismo cultural". Essa "cultura cristã" se oporia radicalmente aos seus "inimigos mais notórios". Esses inimigos notórios seriam humanistas e comunistas. Entram aí uma série de movimentos que estariam travando a cristianização total da sociedade. Para vencer, se faria necessário uma frente que atacasse os inimigos da "civilização judaico-cristã". É evidente que entre eles estariam LGBTs, comunistas, liberais, sociais-democratas, conservadores céticos e tantos outros.


O Estado seria pouco a pouco dissolvido e em seu lugar o poder seria distribuído a uma série de igrejas que desempenhariam o antigo papel do Estado. A minimalização do Estado se daria em paralelo a maximização das igrejas cristãs em poder e influência política. Logo a velha questão teológica (poder espiritual e poder temporal) seria "resolvida" com as igrejas assumindo o poder temporal.


As ideias da Teologia do Domínio são socialmente complicadas. Uma série de grupos se veriam ameaçados pelo seu poder crescente. Só as ideias de teocracia já ameaçam o Estado Democrático de Direito, criminalizando a própria noção de que a democracia se faz com diferentes ideias. Calar as diferentes ideias é uma forma de calar a própria possibilidade de democracia. Além dessa problemática, nos separamos com o fato de que as igrejas assumiriam o poder ao lado de um patriarcado. O patriarcado é uma ameaça as mulheres e aos seus direitos e liberdades. Com o antagonismo crescente de cristãos e LGBTs, vemos também uma ameaça a minorias de gênero e sexualidade.

sexta-feira, 27 de setembro de 2024

Acabo de ler "INVISIBLES: PROBLEMÁTICAS DE SALUD-ENFERMEDAD-ATENCIÓN DE PERSONAS BISEXUALES" de Osmar e Edgar (lido em espanhol/Parte 1)

 


Nome:

INVISIBLES: PROBLEMÁTICAS DE SALUD-ENFERMEDAD-ATENCIÓN DE PERSONAS BISEXUALES 


Autores:

Omar Alejandro Olvera Muñoz;

Edgar Carlos Jarillo Soto.


Nota:

Essa pesquisa foi feita no México.


A problemática da saúde da pessoa bissexual se insere em um contexto bastante específico. Esse contexto específico é um processo sociohistórico em que a invisibilização e valoração negativa operam como mecanismos antagônicos para regular o exercício da sua sexualidade. O que faz com que indivíduos bissexuais apresentem maiores danos mentais a sua saúde mental que gays e lésbicas.


Os problemas advindos da bissexualidade são particulares. Se a invisibilização das pessoas bissexuais implica em problemas de saúde específicos, então essa deveria ser tratada a partir de um cuidado com a consciência social. Essa questão deveria entrar no âmbito da psicoterapia. O reducionismo nas práticas dos profissionais de psicoterapia pode levar a um agravamento da questão, levando ao fortalecimento das situações de crise.


Os profissionais de saúde devem compreender que estão dentro de uma estrutura social. Essa estrutura social dá suporte a comportamentos adoecedores. Não tratar essa questão de fundamentação sociológica pode fazer com que os adoecimentos continuem por motivos sociais, levando a um empobrecimento das técnicas e avanços dos próprios profissionais de saúde. O profissional de saúde tem, para si, um dever dentro da sociedade. E esse dever não é puramente biológico, mas também sociológico, psicológico e filosófico: o de combater efeitos sociocolaterais de dados comportamentos sociais. A neutralidade – se furtar ao combate intelectual numa sociedade marcada pela injustiça – é uma forma de fugir do próprio dever enquanto profissional. Em outras palavras, a compreensão sociohistórica da formação patológica e seu combate as desigualdades e opressões reinantes não é um mero acessório ou um esforço adicional, mas deve ser uma prática dentro do próprio ofício do profissional de saúde.


Um olhar de ahistoricidade da formação patológica pode fazer com que se preserve uma sociedade adoentada e adoecedora, levando a inutilidade do próprio exercício e função da saúde. É combater os efeitos e não as causas – e grande parte delas são sociais.  A saúde é uma necessidade humana, e essa necessidade de saúde não é só física, ela também é mental. É por isso que a saúde tem que ter um esforço para compreender e assimilar explicações sociohistóricas do estado mental das pessoas. 


A questão da saúde da pessoa bissexual se aprofunda em múltiplas vias, são essas:

– Invisibilização:

Bissexuais são tratados como inexistentes, o que impossibilita uma identidade socialmente reconhecível. Sendo julgados como homossexuais ou heterossexuais. 

– Rechaço na comunidade heterossexual e LGBT:

Bissexuais são atacados por héteros e outros integrantes da sigla LGBT. Seja sendo vistos como traidores, seja sendo vistos como incapazes de um relacionamento monogâmico, seja sendo considerados como "instáveis" por não entrarem no sistema binário (monossexual).

– Inferiorização e Sexualização:

A mulher bissexual corre o risco de entrar na "caçada aos unicórnios" – casais procurando uma terceira pessoa para ménage – ou homens procurando uma "mulher liberal". O homem bissexual pode ser enquadrado como gay ou ser tido como "menos homem" – a masculinidade hegemônica é um esforço contínuo para reforçar a masculinidade o tempo todo, mas essa masculinidade hegemônica é heterossexual, ativa e "macho" (estereótipo) –, o que pode levar a complicações sociais.


A saúde mental das pessoas bissexuais é atacada sempre. Todos os dias. Em todos os locais. Seja no hegemônico (heterossexual), seja no não-hegemônico ou contra-hegemônico (LGBT). A não compreensão desse fator, além de casos mais graves como tentativa de "cura", pode levar ao desencadeamento de crises. 

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Acabo de ler "What Is Hegemonic Masculinity?" de Mike Donaldson (lido em inglês/Parte 3)

 


Em relação ao hétero-patriarcado se pode afirmar que a hegemonia é marcada por uma superioridade, essa superioridade recompensa quem é (heteronormativos) ou quem se assemelha (homonormativos) ao padrão de masculinidade hegemônica. A homossexualidade é condenada em três vias: o homem heterossexual vê como fundamental odiar o homem homossexual; a homossexualidade está ligada a efeminização e vivemos numa sociedade machista; o desejo homossexual é considerado subversivo por si mesmo.


O comportamento homofóbico, bifóbico, lesbofóbico e transfóbico provindo de homens heterossexuais é comum e, até mesmo, recompensado. Desde criança, o homem heterossexual é ensinado que será recompensado por ser hétero e atacado se desviar desse padrão. Ser hétero é uma forma de autojustificação e esse comportamento deve ser ressaltado o tempo todo. Não por acaso, uma das principais brincadeiras é acusar outro homem de não ser "homem suficientemente", acusação do qual o homem acusado deve imperiosamente se livrar. Esse mecanismo, feito a exaustão e todos os dias, leva a um condicionamento mental em que o homem deve ter uma vigilância constante em relação a própria masculinidade – e não uma masculinidade qualquer, mas sim a hegemônica.


O comportamento homossexual é considerado um desvio duplo. Um desvio se encontra no gênero (homossexuais são considerados efeminados) e outro na sexualidade (homossexuais possuem relação com o mesmo sexo). O antagonismo entre heterossexuais e homossexuais é claro: se o poder heterossexual advém do hétero-patriarcado, advém por sua vez da masculinidade e heterossexualidade. O homem homossexual é a antítese do homem heterossexual, ele representa a negação sistêmica dos seus valores e modo de vida. Tal radicalidade, sobretudo em nosso meio cultural, leva a um choque óbvio.


A cultura do homem heterossexual é uma cultura da exaltação da força e do domínio. Essa cultura, nociva e tóxica por si mesma, requer uma constante descarga energética entre si e em outros grupos. A "descarga interna" é um meio de regulamentação comportamental entre os próprios heterossexuais, para reforçar o comportamento hétero-patriarcal. Já a "descarga externa" é correlacionada a demonstração de superioridade do homem heterossexual em relação aos outros grupos, sobretudo mulheres e LGBTs.

domingo, 25 de agosto de 2024

Acabo de ler "Afeminação, hipermasculinidade e hierarquia" de Mozer e Helder (Parte 2)

 



NOME:

Afeminação, hipermasculinidade e hierarquia

AUTORES:

Mozer de Miranda Ramos;

Elder Cerqueira-Santos.

No Brasil, existe uma hierarquização de performática de gênero. Essa hierarquização tem algumas camadas. Se em primeiro lugar se encontra o homem heterossexual e másculo, em lugares inferiores se encontrariam o homem heterossexual de índole mais tímida e o homem heterossexual menos encaixado nas definições de masculinidade exuberante. Logo viriam os bissexuais que esconderiam a bissexualidade e tomariam uma vida dupla, marcada pela contradição e ocultamento. Também haveria o binarismo do macho/bicha, onde os ativos estariam acima dos passivos, os efeminados estariam abaixo dos machos. Ser macho e ativo seria tudo.


A questão problemática que vemos aí não se revela logo de cara. Ser efeminado não é o mesmo que ser passivo. Ser passivo não é o mesmo que ser efeminado. Aliás, hoje em dia existem muitos heterossexuais que curtem inversão de papéis. Essa ligação entre passividade-feminilidade revela uma inconsciente construção social acerca dos papéis de gênero e, até mesmo, a ideia de que mulheres são inferiores aos homens, visto que são, quase em totalidade, "passivas". A ideia de passividade-feminilidade também traduz um importante conflito de gênero: quanto mais longe um homem estiver duma mulher, mais hierarquicamente bem posicionado ele está. Essa é uma misoginia oculta muito bem estudado pela militância feminista. O que vemos é a valorização de uma figura bem clássica em nosso imaginário social: heterossexual, ativo, masculino e macho.


Como podemos vislumbrar, muitas das vezes o imaginário do homem homossexual ou bissexual se confunde com o imaginário do homem heterossexual. A ideia de superioridade do homem másculo e ativo contraposta à inferioridade do homem efeminado e passivo representa uma reprodução, mesmo que inconsciente, do machismo hétero-patriarcal. Esse inconsciente é fundamentalmente misógino e é um ponto que serve para alienação e incapacitação não só dos homens bissexuais e homossexuais, como da comunidade LGBT como um todo. Ela é uma misoginia internalizada que servirá sempre para se curvar à heteronormatividade. Representa também uma estratificação social em que o macho bi/gay se encontra acima do efeminado, levando a choques internos – além de comportamentos tóxicos – no seio da comunidade.

Acabo de ler "Reflexiones sobre el feminismo y la diversidad de género" de Villón e Cedeño (lido em espanhol/Parte 3 Final)




Nome do Artigo: "REFLEXIONES SOBRE EL FEMINISMO Y LA DIVERSIDAD DE GÉNERO: EL PODER DEL DISCURSO EN LA POLÍTICA PÚBLICA"
Escritores:

Villón Rodríguez Nadia Wendoline

Cedeño Astudillo Luis Fernando

Falar sobre gênero e sexualidade é bastante complexo. Ainda mais na América Latina, onde o atraso impera em conjunto a ignorância generalizada. Tivemos e temos uma série de conflitos sociais e teorizações que nos levaram até o momento presente. Apesar disso tudo, vivemos na angústia de um processo histórico que ainda não terminou. O que quero dizer é que: o resultado de tantas lutas ainda se revela incompleto. Assim o é em toda instância o que se determina como "histórica", história (existência) e determinação (essência) estão sempre contrapostas e confusas.

O poder depende da legitimidade e a legitimidade é assegurada através de uma conformância social. Essa conformância social depende da aceitação da maioria. As práticas institucionais estão correlacionadas a uma construção hétero-patriarcal – também chamada de hétero-matrix  –, desconstruí-lo depende de um desenvolvimento das forças sociais em direção a outro sentido. Essas forças sociais, de impulsos transformadores, precisam construir uma nova hegemonia para a consolidação de um novo rumo político. Todavia não é possível pensar nisso sem conquistar a maioria social. Essa mesma maioria está extremamente correlacionada a um processo de endoculturação hétero-patriarcal que estabelece o gênero masculino e a sexualidade heterossexual como dominantes – e veem ambos como corretos.

Na prática, o ambiente em que vivemos é tomado como normal, sendo naturalizado como única realidade possível. Essa naturalização se torna uma espécie de "imperativo oikocrático". As pessoas não compreendem que, muitas vezes, a sociedade em que vivemos são construções históricas e não construções essenciais. O meio serve como mecanismo de validação da hegemonia existente e forças antagônicas devem lutar para a validação das suas teses contra as práticas sociais existentes.

A conclusão que podemos chegar é que os movimentos sociais (sejam feministas ou LGBTs) se encontram em estado incipiente e ainda não conseguem fazer um desenvolvimento social que contraponha a hegemonia hétero-patriarcal e a hétero-matrix. As mulheres e as comunidades LGBTs ainda não conseguiram criar um sistema novo que possa fazer frente, suas tentativas ainda são "marginais" e não adentram ao espaço público com toda potência necessária para se tornar "o novo sistema".

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

Acabo de ler "Reflexiones sobre el feminismo y la diversidad de género" de Villón e Cedeño (lido em espanhol/Parte 2)

 



Nome do Artigo: "REFLEXIONES SOBRE EL FEMINISMO Y LA DIVERSIDAD DE GÉNERO: EL PODER DEL DISCURSO EN LA POLÍTICA PÚBLICA"

Escritores:

Villón Rodríguez Nadia Wendoline

Cedeño Astudillo Luis Fernando


As sociedades e os estados latino-americanos herdaram estratos sociais divididos em raça, gênero e classe social. O poder, seja antes da autodeterminação desses países, seja depois do momento de sua emancipação, adquiriu forma patriarcal. Logo quem deveria deter o poder, dentro da esfera familiar, era o homem (o patriarca). Foi através de uma legitimação constante do domínio do homem que as mulheres se viram privadas de suas próprias decisões.

O poder do patriarcado foi justificado graças a débil capacidade dos estados latino-americanos de promoverem políticas reais. As leis, por sua vez, foram criadas tendo como base as leis ibéricas e o direito canônico. Tal assimilação aumentou o poder masculino e colocou a mulher numa posição de inferioridade.

O laicismo só veio muito depois, bem tardiamente. E as reformas liberais não levaram em conta as diferenças estruturais que deveriam ser corrigidas para trazer luz à igualdade de gênero. Mesmo que uma maior autonomia tenha dado margem a uma onda emancipatória.

As leis serviram para fortalecer a hegemonia hétero-patriarcal. Era uma espécie de binômio: servia para fortalecer o homem heterossexual de qualquer ameaça. Ademais, projetos de embranquecimento populacional via importação da população européia foram feitos ao lado de políticas de extermínio de comunidades não integradas – sobretudo a indígena.

É a correlação da hegemonia (heterossexualidade, masculinidade e branquitude) que torna questionável o comportamento heterossexual e masculino. É essa mesma correlação que torna possível uma aproximação entre o movimento feminista e LGBT. Não só isso, torna também provável organizações indígenas e da negritude entrarem nesse conflito.

O fato do patriarcado fortalecer o poder de grandes homens, usualmente burgueses ou detentores de amplo poder, que torna possível uma trindade revolucionária: luta de classes, feminismo e liberação sexual.

Existe uma correlação de forças hegemônicas que atuam conjuntamente: heterossexualidade, masculinidade, branquitude, riqueza e domínio. Essa correlação estrutural demonstra quem manda e quem se justifica nesse poder. Além de demonstrar quem não pode mandar ou se justificar nessa estrutura.

Acabo de ler "Reflexiones sobre el feminismo y la diversidad de género" de Villón e Cedeño (lido em espanhol/Parte 1)


Nome do Artigo: "REFLEXIONES SOBRE EL FEMINISMO Y LA DIVERSIDAD DE GÉNERO: EL PODER DEL DISCURSO EN LA POLÍTICA PÚBLICA"

Escritores:

Villón Rodríguez Nadia Wendoline

Cedeño Astudillo Luis Fernando


A justiça de gênero se propõe a eliminar as desigualdades entre mulheres e homens que se produzem e reproduzem na esfera da comunidade, da família, do mercado e do próprio Estado. O projeto feminista não inclui só a luta contra a desigualdade de gênero, como inclui notoriamente a própria comunidade LGBT como uma espécie de pauta conjunta. O projeto feminista é um projeto de promoção das diferentes identidades e orientações sexuais em direção a uma sociedade mais justa. Ela quer não só a igualdade, mas a igualdade diferenciada que equipare outros gêneros e orientações sexuais na esfera do poder.


Para o movimento feminista existe um papel do Estado na organização do poder. O Estado pode ser direcionado, por meio de políticas públicas, a alcançar os objetivos sociais ou pode adquirir um papel de reforçador de desigualdades estruturais. Ou o Estado se dirige para uma direção (mudanças estruturais) ou se conecta com as desigualdades existentes reforçando o polo hegemônico. É preciso reconhecer que historicamente se constrói uma desigualdade em relação as mulheres e aos grupos LGBTs. Um Estado mal direcionado pode ser um Estado que se propõe ativamente na perpetuação da injustiça.


Também é preciso considerar que as mulheres são atacadas por causa da cultura beligerantemente centrada na exaltação da masculinidade e no poder masculino. A exclusão e o ataque a homens homossexuais e homens bissexuais perpassa a violência de gênero: odeiam homossexuais e bissexuais pelo fato deles não serem considerados como adequados as normativas do gênero masculino. Isto é, odeia-se a possível feminilidade – ou o que se crê como feminino – dentro do homem. Logo a violência contra o homem homossexual e o homem bissexual esconde inconscientemente o ódio a mulher. É evidente que, nessa questão, o ódio à comunidade LGBT e à mulher passam por diferentes pontos, mas existem vários cruzamentos que tornam as pautas próximas e permitem uma unidade que, se não completa, dialogicamente enriquecedora.

sábado, 30 de março de 2024

Acabo de ler "Dramaturgia Coletiva no Teatro para Crianças: comunicação em processo" de André Ferraz Sitônio de Assis

 



Muitas vezes concebemos o teatro para crianças como um produto menor, o objetivo é meramente um entretenimento que deixe as crianças temporariamente quietas e, quiçá, alienadas. Outra forma de concebermos o teatro para crianças é a do espectador-receptáculo que absorve o conteúdo didático de que lhe passamos doutoralmente.


Há algo estranho nessa relação, e aí adentram três questões: 

1- Queremos que o teatro infantil seja apenas uma distração para nos dar um descanso a nossa responsabilidade para com as crianças?

2- Vemos as crianças como seres fora da complexidade do mundo em que vivemos e que, por isso, são incapazes de compreenderem os dramas humanos?

3- Queremos gerar pessoas subordinadas às nossas cosmovisões, meros seres-receptáculos que, na medida em que crescem, tornam-se nossa imagem e semelhança no âmbito das ideias?


Indo na contramão dessa tendência, há uma outra opção que no fundo é uma opção política: o teatro para crianças como veículo transmissor dum processo dialógico entre a criança e o adulto. Onde os anseios humanos são tratados como universais e a própria criança está envolta neles. E o processo de construção cênica se dá numa relação de liberdade e construção coletiva em vez de uma programação pregada antecipadamente por um adulto visto como ser superior e condutor do processo.


Se queremos uma sociedade mais libertária e autônoma, onde padrões não são previamente estabelecidos como superiores aos outros, temos que retirar esse "aspecto subordinativo" que sempre aparece: adulto X criança, hétero X LGBT, saudável X doente, branco X negro, são X louco.


Quando criamos um "modelo" ou aceitamos esse "modelo" como critério normalizador, pressupomos uma relação subordinada em que tudo deve copiar exemplarmente esse modelo. A criança se torna melhor quando se torna mais adulta, a pessoa LGBT quanto mais se aparenta com os critérios de heteronormatividade, o negro quanto mais se branquifica, o "louco" quanto mais se aparenta com o "são". Essa relação modelar é uma relação de submissão que deve ser quebrada pela liberdade.

quinta-feira, 21 de julho de 2022

Prelúdios do Cadáver #10 - Bissexualidade, Conservadorismo e Cristianismo

Texto publicado em 30/08/2018


Estou no Contra os Acadêmicos desde que vi o Vitor Matias anunciar o grupo. Quando entrei, em meu perfil antigo, o grupo não tinha nem cem usuários se não me engano. Vejo que a sexualidade é um importante assunto no grupo, quase nunca comentei nada nesse longo tempo que estou aqui e, então, agora resolvi falar um pouco de minha orientação sexual, de minha religião (cristã) e do movimento LGBT.

Esclareço, desde já, que isso não é uma apologética ao movimento LGBT e também não é uma apologética ao movimento anti-LGBT. Essa minha "argumentação" mais parece uma confissão de uma pessoa enlouquecida com a própria condição que lhe foi posta e que fica oscilando entre o bissexualismo e o heterossexualismo forçado. E ficando-se com a questão: é mais natural seguir meus impulsos e ser plenamente bissexual ou viver numa luta interna para reprimir meu lado homossexual e viver numa heterossexualidade forçada?

Sou bissexual. Minha orientação sexual é motivo de angústia para mim e para meus familiares. Meu desejo sexual é, para mim, um pecado que não consigo me retirar. Resumidamente: minha sexualidade é uma maldição. Muitas vezes, caio numa contradição brutal: quero e não quero ser bissexual. Por vezes, tomo a minha orientação sexual por natural; por outras, como inatural e pecaminosa. Sei que nasci com ela, não sei o que fazer com ela. É-me uma sorte ser bissexual, pois assim posso ignorar uma “parte de mim” e ter uma “vida normal”. Todavia estou sempre em contradição comigo mesmo: nunca sei o destino que tenho que dar a minha orientação sexual.

Como disse, eu oscilo demais. Muitas vezes, há um instinto que me leva a pensar que devo achar a minha orientação sexual normal e cometer atos sexuais que me são, ao mesmo tempo, uma gratificação e um pecado mortal. Noutras vezes, uma razão ressoa alertando-me para que eu não pratique a sodomia. Vivo na constante exitação, ora achando o bissexualismo normal, ora achando-o doentio.

Sou bissexual e quem está a me acompanhar há um bom tempo sabe disso. Houve um tempo em que eu falava de minha sexualidade abertamente, hoje quase nunca falo – falei recentemente, mas para atacar argumentativamente um militante LGBT. Isso, minha omissão a respeito de minha sexualidade, acontece por causa de meus desentendimentos para com a “tribo urbana LGBT”. Não quero ser associado a superficialidade e militância que ela, a tribo urbana LGBT, faz. Então prefiro não falar de minha orientação sexual pois evita qualquer tipo de estereotipação.

Escrevi “tribo urbana LGBT” ao invés de “comunidade LGBT”. Há uma razão para isso: existe dentro da comunidade LGBT uma tribo urbana LGBT que tem a sua própria gíria, a sua própria pauta e o seu próprio modo de ser e de se vestir. Como acho tosco a tribo urbana LGBT e odeio as suas imposições, prefiro não tomar partido falando de minha sexualidade abertamente. O fato é que, como toda tribo urbana, ela é uma seita composta por uma microideologia.

Por que uma seita e por que uma microideologia? Fácil. Uma seita pois ela isola-se em si mesma, não permitindo o contato com pessoas fora de sua bolha. Como toda bolha, ela é agressiva com desertores e contra pessoas que não se encaixem nela. Uma microideologia pois a mesma releva-se em sua particularidade, a pauta LGBT, e tenta suas ações baseadas nesse microcosmo. Tal como o movimento negro é uma microideologia, o movimento feminista também é uma microideologia, o movimento LGBT também deve ser considerado uma microideologia.

O pecado distorce a visão. Como cristão, não sei como enxergar a minha orientação sexual. Sei que, desde novo, tenho-a como fiel acompanhante. Se a minha orientação sexual de fato é um pecado e o pecado corrompe a visão, como posso enxergar a Verdade? Sempre acabo caindo instintivamente no desejo pelos dois sexos. Sempre que penso em combater o LGBTismo, penso que estou a combater a mim mesmo. No fim, sempre acabo por realizar a minha perversão.

Como cristão, não sei qual argumentação teológica devo seguir. A minha orientação sexual é um dos motivos pelos quais oscilo entre o catolicismo e o protestantismo, aplicando ora uma modelo tradicional, ora um modernista que compactue com a minha sexualidade. Frequento a missa semanalmente e ainda fico para o grupo de jovens. Sinto-me, então, um hipócrita perdido na tibiez. O fato é que nunca poderei ser plenamente católico se eu continuar assim.

Sobre a “cura gay”, já ouvi relatos de homossexuais que queriam ser, no mínimo, bissexuais para poderem engravidarem uma mulher e terem filhos. Também vi muitos que queriam serem heterossexuais pois não gostavam do comportamental dos outros homossexuais.

Os chamados “grupos homossexuais ou LGBTs”, sejam eles virtuais ou reais, são imersos numa promiscuidade, numa liberalidade e numa superficialidade que faz com que certos membros da comunidade LGBT sintam-se enojados consigo mesmos e com o restante da comunidade. O sexo fácil é, para todo integrante da comunidade LGBT, não um mero jargão e sim uma prática incrivelmente documentada pela internet indicando vários “points de pegação”; tal liberalidade sexual é muito equidistante da liberalidade heterossexual. Dito isso, é natural ficar enojado com tamanho indiferentismo para com o afeto. O sexo puro não é sinal de liberdade, mas sim dum impulso bestialógico que escraviza corpos e almas. Então, em minha sincera opinião, querer ver-se livre duma comunidade tão bestializada pelos impulsos é muito natural e, até mesmo, uma virtude.

Se eu pudesse escolher, não seria bissexual. Sempre tratei a minha parte homossexual com uma profunda angústia e arrependimento. Sempre que praticava a sodomia, sentia-me abismado e cortado ao meio. Minha consciência moral diz-me que estou a praticar um ato criminoso, um ato imoral. Para mim, minha sexualidade não é motivo de orgulho e sim de dor e sofrimento.

Já tentei falar com minhas psicólogas sobre a sexualidade, elas tomaram como algo natural e que devo agir “naturalmente” com a minha orientação sexual. Muitas vezes, como já escrevi, entro por essa linha de raciocínio. Por outras, culpo-me.

Dito tudo isso, esse é um dos meus maiores dramas existenciais. Uma questão que resumir-se-ia no “Ser ou Não-ser: eis a questão!” de minha existência. Deixo, convosco, as admoestações e argumentações a respeito disso. Agradeço, antecipadamente, a todos que lerem e que responderem essa publicação.