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segunda-feira, 18 de agosto de 2025

Acabo de ler "Direitos humanos, democracia e desenvolvimento" de Boaventura e Chauí (Parte 1)

 


Nome:

Direitos humanos, democracia e desenvolvimento


Autores:

Boaventura de Sousa Santos

Marilena Chauí

Autor do Prefácia:

José Geraldo de Sousa Junior


Manteria a mesma linha de análise anterior, isto é: a de enunciar os trechos centrais de forma a simular mais perfeitamente o pensamento dos autores. Tal tipo de análise emana com o princípio central desse blogspot: o Agnosticismo Metodológico.


— Universidade Popular:

- Entendimento de que "para transmitir a ideia de que, depois de um século de educação superior elitista, uma universidade popular é necessariamente uma contrauniveesidade;

- Uma concepção anarquista e de pedagogia libertária;

- Processo educacional como estratégia fundamental para perspectiva libertária.


— Revista Kultur: Universidade Popular d'Ensino Livre:

1. Objetivo principal: criar uma consciência popular;

2. Criar um curso de nível superior;

3. Criar uma biblioteca e um museu popular;

4. Promover conferências públicas;

5. Construir-se num centro popular, para empreender a instrução superior e a educação social do proletariado em face de seu protagonismo no processo revolucionário.


— Michel Onfray (Fundador da Universidade Popular de Caen):

- Poder emancipador da pedagogia libertária;

- Atribuição de ensinar a todos um saber alternativo e crítico;

- Possibilidade de pensar de outra forma;

- Interesse em ensinar quer um saber alternativo, quer um saber clássico, mas de maneira alternativa, isto é, crítico;

- Gerar um intelectual coletivo, eficaz, que logo perturba e incomoda.


— Boaventura de Sousa Santos:

- Ultrapassaram a distinção entre teoria e prática;

- Prática da transformação social e sua compreensão efetiva;

1. Atividades pedagógicas;

2. Atividades de pesquisa-ação para transformação social;

3. Atividades para transformar competências e instrumentos destinados à tradução intertemática, transnacional e intercultural.


— Obstáculo central a ideia de Universidade Popular: a estrurura convencional apresenta problemas correlacionados a classe, etnia, região e gênero.


— Desigualdade racial:

- Pretos e pardos recebem, em média, metade do rendimento dos brancos;

- 12 anos ou mais de estudos: proporção de brancos, com carga cumulativa de estudos, é três vezes maior;

- Homens pretos e pardos têm um rendimento médio 30% inferior ao das mulheres brancas.


— PNE (Lei n. 10.172/2001):

"criar políticas que facilitem às minorias, vítimas de discriminação, o acesso à educação superior, através de programas de compensação de deficiências da sua formação escolar anterior, permitindo-lhes, desta forma, competir em igualdade de condições nos processos de seleção e admissão a esse nível de ensino"


— Dois exemplos de organização que deram frutos sociais para a atenuação das desigualdades sociais no Brasil:

- Acesso ao ensino superior para assentados e beneficiários da reforma agrária;

- Educafro: ampliação dos acessos sociais notadamente à educação.


— Organização Popular:

- Assessores Jurídicos Populares: contribuem para pluralização do debate no meio acadêmico, proporcionando a inclusão de trabalhadores no meio jurídico, para facilitar a expressão desta categoria;

- Trabalhadores e jovens pobres: reivindicam políticas de criação de novos campi e novas unidades universitárias;

- Foco em carreiras nobres (medicina, direito e engenharia).


— Construção de uma Universidade Popular:

1. Ultrapassar a distinção entre teoria e prática;

2. Superar a distinção entre ensinar e aprender;

3. Aumentar significativamente a eficácia e a consistência de ações transformadoras, ambicionando a emancipação social;

4. Gerar uma coligação entre comunidade, universidade e cidade, diluindo a noção de que a universidade é o único lugar que produz conhecimento;

5. Transformar conhecimento e ensino;

6. Ativação de condições sociais e epistemológicas para transformação de uma utopia instigadora.


sábado, 2 de novembro de 2024

Acabo de ler "New Libertarian Manifesto" de Konkin III (lido em inglês/Parte 1)



Nome:
New Libertarian Manifesto

Autor:
Samuel Edward Konkin III

Não importa qual vertente teórica esteja estudando, a coerção sempre aparece como fator notório no campo de análise. A forma como devemos lidar com a opressão, nas linhas que estamos, é variável. Alguns buscam catalogar o que seria uma boa coerção, outros tentam colocar uma coerção mínima. Existem aqueles que compreendem que toda relação humana envolve um jogo de poder. Há aqueles que querem abolir a coerção. Essa variedade não pode ser ignorada e nem abolida do debate.

Qual seria a fonte primordial da opressão? Se não a fonte primordial, qual seria a pedra angular ou, precisamente, aquilo que faz com que uns possam se sobrepor aos outros nas relações sociais? Se existe um fator decisivo na balança da opressão, esse fator decisivo é o Estado. Por tal razão, não convém a nós perguntar se o Estado deve ser alterado, se o Estado deve ser mudado e, se me permitem ir mais longe, se o Estado deve acabar? Esse livro fala sobre estratégias e táticas para acabar com o Estado, mesmo que isso soe um absurdo para alguns.

Konkin III tem um ponto: ele defende uma mudança cataclismática e uma grande estratégia. O que ele propõe, em outros termos menos brandos, é uma revolução. Uma revolução diferente da maioria das revoluções, já que seria uma revolução contra o Estado. Uma proposta bem ousada, já que o Estado sempre é utilizado para beneficiar um grupo e atacar outro. Muitos revolucionários, na sanha de mudar o mundo, recorrem ao Estado para os seus propósitos. Konkin segue uma linha diferente, não podemos mudar o mundo por meio do Estado pois o Estado é propriamente o culpado do mundo assim estar.

A pergunta que virá a muitos é: por qual razão o Estado? O Estado é propriamente a instituição da coerção, a centralização da imoralidade, o aparelhamento do roubo e do assassinato, a coordenação da opressão numa escala inconcebível para criminosos menores. O Estado representa um poder que é grande demais para qualquer pessoa, um poder que sempre poderá ser usada contra nós, um poder tamanho que nenhum de nós deveria possuir. Naquele tempo em que esse documento foi escrito, o Estado já tinha matado mais do que qualquer período da história; o Estado tinha roubado mais do que em qualquer período da história; o Estado já tinha iludido mais que em qualquer período de irracionalidade da história.

O que foi o século XX? O século XX foi o século em que a guerra matou mais que todas as anteriores. Em que as taxas e a inflação roubaram mais do que já foi produzido. Em que as mentiras políticas, em que a propaganda e em que a "educação" confundiram mais do que qualquer superstição na história.

Qual seria a solução para todo esse poder sempre distorcido pela natureza do Estado? Confiar ao Estado maiores possibilidades de distorções futuras com nossos nobres ideais? O Estado é a distorção, ele sempre distorcerá. A ação revolucionária não pode, por sua vez, se embasar no uso do Estado pois o Estado sempre a distorcerá.

O chamado de Konkin não é um chamado para ocupar o Estado com propostas reformistas. Não é o de criar um "Estado revolucionário". O chamado de Konkin é por uma unidade revolucionária de libertários que não aceitam a principal raiz de distorções: o Estado. Para tal, o libertário deve viver de forma alternativa ao poder do Estado. O movimento libertário deve ser um movimento de criação de alternativas ao Estado para destruir o Estado.

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Acabo de ler "Anatomy of the State" de Murray N. Rothbard (lido em inglês/Parte 7 – Final)

 


Nome:

Anatomy of the State


Autor:

Murray N. Rothbard


Para Murray, existem dois paralelos. A história da ação não-estatal, marcada por uma cooperação e competição. A história estatal, marcada pelo domínio e uso da força. Essas duas histórias sempre se cruzam, ora tendendo para um lado, ora tendendo para outro.


Os argumentos que o Murray utiliza contra o Estado são, é claro, bastante interessantes. Há uma verve libertária inegável. Embora se possa afirmar que exista uma simplificação dos fenômenos sociais e psicológicos. Além do Estado, existem opressões sociais. O Estado pesa muito no exercício dessas opressões, todavia elas não necessariamente precisam do Estado para existirem. De qualquer forma, pensar num mundo sem Estado e estabelecer uma crítica ao Estado é de suma importância para o debate e Murray não pode ser simplesmente ignorado ao fazer isso.

Acabo de ler "Anatomy of the State" de Murray N. Rothbard (lido em inglês/Parte 5)

 


Nome:

Anatomy of the State


Autor:

Murray N. Rothbard


O Estado quase sempre acaba de duas maneiras: (I) ao ser conquistado por outro Estado pela guerra; (II) ao ser derrubado por um grupo de revolucionários. Quando o povo se move nessas duas direções, seja para o combate do Estado inimigo, seja para a revolução, movem-se pela crença de que, no fundo, estão se dirigindo para a realização da própria vontade ou para defenderem a si mesmos.


O ilusionismo coletivista sempre é, historicamente, um dos principais meios de mobilização. A palavra "nós" é algo muito difícil de se conceituar com precisão. Sim, fazemos parte de uma formação específica e estamos situados no espaço-tempo. Nossa língua talvez seja igual e quiçá tenhamos pontos semelhantes. Todavia pegar uma série de características comuns e, a partir disso, criar uma unidade perfeita de coesão é um salto argumentativo tremendo. Existem pontos, em cada indivíduo, de conexão ou de separação. No máximo, podemos falar de interesses semelhantes ou próximos em dados pontos em alguns momentos. Não há nem coletividade e nem individualidade plena.


O momento em que isso, o ilusionismo coletivista, mais ocorrer é durante uma guerra ou durante uma revolução. O Estado está particularmente interessado na guerra, já que é a partir dela que ele pode utilizar um dos maiores mecanismo de autopreservação que possui: a crença dos indivíduos de que a sociedade existente e o próprio Estado são uma mesma identidade e, portanto, possuem os mesmos fins.


Seríamos nós o Estado? Há um entretanto particularmente interessante. Se o Estado somos nós, por qual razão o Estado está mais preocupado em punir crimes contra a existência de si próprio do que crimes cometidos de um cidadão para outro? Ora, todo crime dentro do Estado, sendo a sociedade o próprio Estado, seria um crime contra o Estado e teria igual valor, não?

Acabo de ler "Anatomy of the State" de Murray N. Rothbard (lido em inglês/Parte 3)

 


Nome:

Anatomy of the State



Autor:

Murray N. Rothbard

Quando um grupo de indivíduos se apodera do poder de dado território, ele precisa conseguir o aval da maioria da população. Esse aval não é conseguido só em processos de governos democráticos, esse processo é necessário em qualquer governo. A busca por legitimidade e legitimização é inerente a perpetuação de qualquer Estado, seja qual for o seu modelo organizacional.

Essa legitimidade é conquistada usualmente pelo fato de que o Estado busca importantes grupos sociais, extraindo apoio dos líderes desses grupos sociais. É pegando para si as lideranças dos grupos que compõem o território que o Estado é legitimado. Esse processo, mais uma vez, não é só dentro do regime democrático, mas dentro de qualquer regime.

Conquistar o apoio das "lideranças", dando-as um título de nobreza ou algum cargo estratégico, o Estado não poderia deixar de pensar nas grandes maiorias. As grandes maiores não se convencem unicamente com a participação dos seus representantes. A aprovação social de um indivíduo pode mudar. Para conseguir o apoio da maioria, o Estado apela para os meios ideológicos. Ele convence a maioria das pessoas que a existência do Estado é inevitável, que ela é boa ou prudente.

Para a tarefa de convencer a população do território acerca da importância do Estado, o Estado busca auxílio de intelectuais que convençam o homem médio a confiar nele. A aliança dos intelectuais e do Estado é bastante antiga, o intelectual precisa de um anteparo financeiro e o Estado precisa convencer a população da necessidade da existência do próprio Estado. Os intelectuais servem ao Estado convencendo as pessoas, moldando a assim chamada "opinião pública".

É evidente que o intelectual não necessariamente precisa do Estado para sobreviver e para desempenhar as suas atividades. Só que há um porém: a vida do intelectual, o seu sustento, é incerto. A maioria da população não considera a importância intelectual e isso faz com que a sobrevivência, dentro de uma sociedade de mercado, seja incerta e sempre volátil. Por outro lado, o Estado não só está convencido da importância dos intelectuais, como quer eles do seu lado e oferece aos intelectuais a comodidade necessária.

Os intelectuais, não sendo bobos, se ancoram no Estado para poderem darem continuidade as suas existências. Para tal, criam vários argumentos através da história. A ideia de que o imperador/rei tinha sido eleito por Deus; a ideia de que os nobres eram uma elite de pessoas notáveis; a ideia de que o Estado reuniu ao seu redor os melhores especialistas para tratar dos problemas públicos. Tudo isso consta. Acima de tudo, o Estado seria inevitável, em último caso, visto que o mundo tem muitos males.

O maior alicerce do Estado, como apontado por Rothbard, é o de transformar o roubo não sistemático e privado em algo mínimo. O Estado seria, então, um mecanismo avançado de roubo que não permite que existam outros mecanismos que pratiquem a sua função primordial (roubar).

Existe outro mecanismo que o Estado utiliza para manter a sua legitimidade. As pessoas têm uma predisposição natural para amarem os seus locais de nascença. Esse sentimento natural se confunde com o apoio ao Estado. Muitas guerras, movidas por interesses escusos entre diferentes Estados, são manipuladas para que o povo acredite que é uma luta entre dois povos e não uma luta entre dois grupos com interesses distintos. Essa manipulação é toma forma de nacionalismo.

É claro que, após tantos e tantos anos de estatismo, isso gera um hábito. Muitas vezes, não questionamos a realidade ao nosso redor pelo simples fato de que ela nos aparece como sendo natural e não forjada por construções sociais. A forma com que nos assimilamos hoje ao Estado se dá de semelhante maneira: nossos pais eram governados pelo Estado, os pais dos nossos pais eram governados pelo Estado, assim foi sucessivamente. Nossa mente simplesmente concebe que: se o Estado apresenta continuidade no espaço-tempo, ele não pode ser uma produção artificial. O Estado, para nós, aparece como uma figura tão natural quanto qualquer outra coisa que esteja a nossa volta.

O pensamento que o Estado utiliza para se legitimar ante aqueles que condenam a sua existência é, muitas vezes, um apelo ao passado e a sua própria longevidade histórica. Se a maioria das pessoas se habituou as práticas dos diferentes Estados, como é que poderíamos considerar a sua existência estranha ou indesejável? Os intelectuais que possuem visões antiestatais são considerados como estranhos, estando longe dos anseios da maioria e o Estado usa essa maioria, que raramente pensa acerca da natureza do processo que levou a formação do próprio Estado, contra essa minoria. Desse modo, o antiestatista é classificado como uma pessoa com visões demasiadamente românticas, um insano, um perverso, dentre outras classificações pejorativas ou idealistas.

A justificação da existência e perpetuidade do Estado pode variar de época em época a depender do contexto, tempo e local que se situe. Ele pode advir da vontade divina, do absoluto ou das necessidades materiais das forças produtivas. De qualquer modo, não importa o argumento utilizado: o Estado sempre encontrará uma justificativa para existir e perpetuar a sua existência, não importa por qual meio retórico. Só que esse vaivém demonstra algo: que o Estado é, propriamente, uma construção social e depende de uma sociedade que justifique essa construção para existir.

A principal razão do Estado moderno é a justificação por meio das suas nobres causas. O Estado estaria acima das preocupações mesquinhas que motivam as ações de indivíduos particulares. É ele que promove tudo o que é bom para o bem-estar coletivo enquanto os outros só pensam em si mesmos. Não há, além do Estado e dos seus nobres burocratas, qualquer pessoa que tenha os anseios filantrópicos, por mais mínimos que sejam. Uma narrativa completamente falsa, mas que não deixa de ser convincente.

Outra razão do Estado existir, agora que não somos mais dominados por uma razão teológica, é a ciência. O Estado é a mais científica das organizações. Além disso, a ciência só existe por causa da organização do Estado. O Estado tem as melhores pessoas, as pessoas mais bem-intencionadas, em promover a melhor administração possível para a resolução de tudo. A ciência não existe sem o Estado. Ora, isso é outra alegação falsa. Completamente parcial e viciosamente narrativista.

segunda-feira, 20 de maio de 2024

Acabo de ler "Em Defesa de Stalin" de Vários Autores (Parte 14)

 


Voltamos a análise do Instituto Marx Engels Lenin sobre a vida de Stalin (páginas 219 à 228). O que são as questões doutrinais? Meras abstrações? Norteadores da conduta ontológica da humanidade? Vulgaridades perante a prática? Algo que esquecemos quando começamos a agir verdadeiramente? Creio que, com base numa série de estudos, posso afirmar que as questões doutrinais sempre pesam radicalmente na conduta humana. Ao menos naquelas pessoas que, conduzidas pelo uso da razão e pela busca de uma vida de significado, buscam viver uma vida de propósito e missão.


Numa revolução em que as próprias ideias anteriores são atacadas e se busca colocar um sistema de ideias novo para que a máquina do Estado se renove ou se mude as questões políticas e quais ideias políticas vão ser aplicadas são de importância vital. Isto é, era da natureza mesma desse processo uma disputa doutrinal entre os revolucionários e uma batalha pela hegemonia para a condução do poder. E a luta doutrinal não se fazia só entre marxistas, liberais, monarquistas, reacionários e conservadores. A luta também era entre aqueles que posteriormente seriam chamados de "sociais-democratas" e aqueles que são anarquistas, socialistas revolucionários e também os chamados trotskistas.


Stalin, assim como todos envoltos nesse processo de radicalização para uma mudança, buscou uma forma de defender as suas ideias. Foi combatente fiel. Lutou contra trotskistas, socialistas revolucionários, anarquistas e sociais democratas. Combateu aquilo que chamou de "burguesia democrática" e outras tendências que estariam mais para a esquerda legalista e outras tendências revolucionárias.


Veja que a luta entre cristãos e gnósticos, nos primeiros momentos de nosso século, também carregava forte aspecto doutrinal. Na revolução francesa, a luta doutrinal também era bastante característica. A humanidade, sempre narrante, briga por suas narrativas de tempos em tempos. Daí o aspecto conflitual das ideologias, religiões, ideias e doutrinas que se chocam com uma periodicidade fulminante e que são um fato histórico em todas as épocas.

segunda-feira, 29 de abril de 2024

Acabo de ler "Em Defesa de Stalin" de Vários Autores (Parte 6)

 



Ainda na parte escrita por Emil Ludwig, estamos nas páginas 87 à 108 do livro. Aqui vemos o governo de Lênin e toda a conjuntura de dar forma ao poder revolucionário. Com os poder em mãos, o esforço não era mais o de promover instabilidade ao poder dominante e sim o de criar um novo poder dominante. Ou seja, o de construir a ditadura do proletariado. Um estado diferente de todos os outros: não sendo mais controlado pelo clero (via religião), pela aristocracia ou realeza (via política) ou pela burguesia (via economia), agora cabia ao próprio proletariado e ao seu fiel amigo, o campesinato, o de ditar o rumo de sua própria vida e engendrar as engrenagens da liberdade que sempre almejou.


Só que havia um problema nesse sonho, o problema era que o sonho não era só de um. O sonho era um sonho compartilhado com várias visões que, mesmo que se juntassem com alguma semelhança, apresentavam-se distintamente. Dentro do próprio partido, existiam rupturas. Não só isso: socialistas revolucionários, anarquistas, mencheviques e tantos outros, também combateram a burguesia e seus aliados na revolução. Cada qual queria ter parte nesse poder que surgia, mas cada qual tinha uma visão distinta sobre esse poder. Partidários de uma mesma classe – ou duas classes (proletariado e campesinato) –, divididos por diferentes ideais.


O poder evidentemente caiu nas mãos dos bolcheviques, isto é, dos comunistas. Inicialmente esse poder foi utilizado para reprimir os teóricos e adversários do poder comunista, garantindo a estabilidade do poder com base na repressão. Depois de terem calado os inimigos "extra-doutrinários", cabia-se estabilizar o poder nas mãos dos comunistas. E como é que eles fariam isso? Concentrando-o nas mãos de um grupo de comunistas em vez de reparti-lo nas mãos de todos os comunistas. Esse repetitivo processo de concentração para estabilização do poder e para manter a revolução seria, a posteriori, um grande problema para o Estado Soviético e um dos principais motivos de seu fim.


De qualquer forma, a rivalidade entre Trotsky e Stalin vai se delineando e uma ruptura definitiva vai surgindo pouco a pouco.

quarta-feira, 24 de abril de 2024

Acabo de ler "Homo Ludens" de Johan Huizinga

 



Essa versão é apenas um recorte que li especialmente para minha licenciatura em teatro. Mesmo não sendo o livro inteiro, deu-me um sabor bastante apreciável e ressignificou muitas de minhas crenças. Creio que até a minha visão de muito sobre "jogos" e "brincadeiras", além de seu funcionamento social e psicológico, foi bastante alterada por essa breve leitura. Pretendo algum dia, quando tiver maior disposição de tempo, ler a versão completa do livro.


Johan trabalha com uma hipótese bem diferente da habitual, mas ela está em paralelo com grandes escritores e intelectuais de sua época. Creio que com a sanha racionalista e o desempenho desmesurado duma crença excessiva pela razão e o seu uso acabamos por perder a própria capacidade do bom uso da razão. Muitos intelectuais levaram os mitos e as religiões para as portas da frente da academia (aqui no sentido de universidade), exemplos esses são:

- Claude Lévi-Strauss;

- Eric Voegelin;

- Johan Huizinga;

- Mircea Eliade.


A sanha racionalista acreditou que poderia desmistificar o homem e traduzir, na Terra, uma forma de homem de razão pura. Um homem absorvido pela atmosfera duma racionalidade objetiva e que encarava o mundo dum modo completamente imparcial. Tal intenção motivou várias escolas de pensamento: positivismo, anarquismo, marxismo, liberalismo, dentre tantas outras. Todavia a ideia de um homem absorvido inteiramente pela potência do intelecto e capaz de dar juízos racionais em absoluta concordância com os critérios da razão suprema nada mais é do que uma construção da própria imaginação humana e, como tal, incapaz de ser realizada na prática – sobretudo tendo-se em conta a própria humanidade inerente ao homem enquanto homem.


Esse texto, por sua vez, apresenta não uma linha de pensamento que defende o aspecto religioso inerente ao pensamento do homem – mesmo que em escala inconsciente –, mas a inerente ludicidade do homem. Ou seja, somos algo além do que seres inconscientemente religiosos, somos seres que brincam inconscientemente. Dar-se conta disso é, mais uma vez, libertador. E espero que um dia que essa percepção seja academicamente mais levado a sério.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Acabo de ler "Marx y Rusia" de Carlos Taibo (lido em espanhol)

 



A obra de Carlos Taibo é uma obra muito rica em seus pontos. Sendo ele um exímio estudioso da realidade russa, é também um leitor apaixonado da obra de Marx. Embora o próprio Carlos Taibo seja, por assim dizer, um autor anarquista. Ele faz frente aos vulgares que sendo marxistas ou anarquistas não lêem o conteúdo teórico de outros autores por divergências intelectuais, empobrecendo em muito o conteúdo da própria obra e (auto)limitando a capacidade de expansão do próprio horizonte de consciência.


Percebe-se que Marx, o velho Marx, tornou-se um homem mais sábio e mais aberto. Em vez de se encurralar pelo corpo teórico já construído pelos seus anos de vida intelectual, tornou-se, muito pelo contrário, aberto ao revisamento intelectual de sua própria obra. Estabeleceu novas pontes, construiu pouco a pouco um contato maior com sociedades pré-capitalistas em diálogos teóricos com o futuro anticapitalista. Além disso, estabeleceu um horizonte teórico de maior ecumenicidade com autores anarquistas.


A pesquisa de Carlos Taibo sobre o velho Marx traz uma luz que pode desencadear uma série de estudos que são muito relevantes ao desenvolvimento duma linha de raciocínio mais crítica e, ao mesmo tempo, mais abarcante e, portanto, mais completa. Hoje em dia é soberanamente necessário que não sejamos mais intelectuais dogmatizados e brutalizados pela adesão irrestrita ao bando. Temos que ser pessoas abertas, navegantes do mar de dados que é o conhecimento.


Sem dúvidas, hoje para mim é indubitável que se pode amadurecer intelectualmente sem que, ao mesmo tempo, sejamos pautados por uma rigidez mental tão característica de vários intelectuais que nos predecederam. E, quem sabe, a partir disso: construir uma sociedade mais igualitária, mais justa e mais humana. Que a mesa onde nos assentamos seja a de um diálogo irmão e não a de uma selvageria desavergonhada.

terça-feira, 22 de agosto de 2023

Acabo de ler "Historia Mínima de la Guerra Civil española" de Enrique Moradiellos (lido em espanhol)




Escrever sobre um conflito tão exaustivo e marcante nas poucas palavras que o Instagram permite é uma certa espécie de martírio. Porém não falho ao meu compromisso intelectual de estudar e analisar, mesmo que sem a minúcia necessária, o universo hispânico (seja este em sua origem ou em suas variações).


Quem estudar espanhol terá um mundo a se abrir diante de teus olhos. A história de inúmeros países e, igualmente, muitíssimos autores aparecer-lhe-ão em companhia para que amadureça em visão de mundo, relativizando a estreita visão de outrora e abarcando um novo grau de horizonte de consciência. A história marcar-lhe-á a alma a ferro e fogo, para que tu crenças na medida do mar imenso e profundo que desbrava.


A guerra civil espanhola teve uma configuração muito importante. A  Alemanha e a Itália estiveram ao lado de Franco, porém a União Soviética manifestou-se a favor do regime republicano. A participação de anarquistas, comunistas (marxistas) e socialistas também foi de suma importância. A neutralidade da Inglaterra e a permissividade da França foram pontos graves.


Tratava-se duma guerra entre um lado tradicionalista (católico e monárquico), de tendências fascistas e outro lado de tendências mais laicas, dominado por uma mentalidade mais própria da modernidade ou até mesmo do socialismo ou do anarquismo. Um lado vendo o outro como intolerável.


Todos já sabemos o fim que levou. A vitória de Franco não seria estrategicamente um grande auxílio ao Eixo (Itália, Japão e Alemanha), todavia afastaria a Espanha duma posição energicamente contrária aos seus interesses. Já a União Soviética, neste tempo ainda sem seu gigantesco arsenal militar, não seria suficientemente capaz de sustentar uma revolução socialista ali com sua baixa capacidade produtiva e produtos fora do padrão de excelência que um dia conquistaria. Mesmo que se possa dizer que outra república socialista ser-lhe-ia de grande ajuda.


Uma luta tão multifacetada, tão demonstrativa das contradições históricas não pode ser ignorada por qualquer um que goste e queira estudar seriamente o mundo.

terça-feira, 20 de setembro de 2022

150 VÍDEOS NO CANAL!

 



Hoje atingi a marca de 150 vídeos postados. Quero muito transformar o canal num divulgador dos mais amplos discursos, com uma variedade imensa de doutrinas, religiões, ideologias e afins. Não é uma tarefa fácil, só que estou me tornando a cada dia mais apto para o combate.

Claro que atualmente o canal (Latir contra os Grandes) não é tão diverso quanto deveria, só que farei de tudo para dar um maior balanceamento. O objetivo de ter um pancânon ainda é a suprema causa do canal. Devo lhes dizer que sonho em narrar coisas desde que era um pré-adolescente viciado em creepypastas. Jurei que um dia teria um canal de narrações.

A propósito, foram postados vários vídeos hoje. Eles variam entre marxismo, islamismo e anarquismo. Há uma poesia do sufi Rumi, artigos do Stálin e um artigo selecionado do anarquista Proudhon!

Ouça no YouTube:
https://youtube.com/channel/UChS1QmDXtyHvJktE9NlwAYw

Ou ouça no Spotify:
https://open.spotify.com/show/21nTtV7hSGnS9Q4pEvUwr5?si=nOxn2dnZT3epj-wOZBRHjg&utm_source=copy-link

domingo, 18 de setembro de 2022

Sabe que dia é hoje? É DIA DE ANARQUIA, BABY!

 


Acabo de trazer uma série de artigos anarquistas em narração no projeto de áudio Latir contra os Grandes. Eles poderão ser ouvidos no YouTube ou no Spotify - a escolha é sua.

Dentre os principais artigos trazidos, estão 2:
1- "Os Perigos do Estado Marxista" de Mikhail Bakunin;
2- "Anarquismo e Crime" de Benjamin Tucker.

No primeiro artigo, Bakunin demonstra uma capacidade extremamente profética - ou, quiçá, mera percepção do óbvio ululante - de dizer que o projeto de Estado Marxista acabaria num regime totalitário. O trabalho é, nitidamente, um clássico do pensamento anarquista.

No segundo artigo, temos Benjamin Tucker elencando que, logo após a luta antirreligiosa e a luta escravatura, o próximo passo da humanidade seria caminhar para a abolição do Estado. Fora que ele conecta o Estado intimamente com a criminalidade.

Ouça aqui no Spotify:

Ou ouça no YouTube:

Lembrando que:
Nenhum artigo narra apresenta parcial ou totalmente as visões de minha pessoa.

quinta-feira, 1 de setembro de 2022

TRANSFORMEI "VÍCIOS NÃO SÃO CRIMES" EM AUDIOLIVRO!

 



Decidi que meu primeiro empenho de publicação de audiolivro no canal Latir contra os Grandes (YouTube, Spotify e Anchor) seria o de narrar um clássico do pensamento anarquista individualista. E esse livro foi "Vícios Não São Crimes".

No livro que transformei em áudio, vocês poderão se deparar com uma série de argumentos em que o autor defende que o vício é diferente de um crime. Nele poderemos ver um pensar bastante diferente daquilo que é habitual e entendermos um ponto de vista divergente quanto a relação de vícios e crimes, além dos meios regulativos do governo e da sociedade para com isso.

Spotify:
(No Spotify, todo livro encontra-se unido num único local)

YouTube:
(No YouTube, o livro foi dividido em 22 fragmentos)

sábado, 29 de janeiro de 2022

Éramos dois, e daí?

 Você me contava do seu desejo de virar socióloga. Era de esquerda juvenil, adolescente lutando contra o tédio. Tão desafiadoramente bonita quanto inteligente e simpática. Revelei a ti o meu amor quando já era tarde, tinha vergonha metódica de mim e não queria lhe envergonhar com minha obscura imagem social. Por um momento, éramos dois, mas depois de alguns meses, já não éramos nada.


Eu te diverti com meu humor adolescente de anarquista niilista e rebelde sem causa. Pagando-lhe bebidas na esperança que transfigurasse a sua lesbicalidade e bissexualidade. Me aproximando com distâncias calculadas e passos patéticos que geraram tragédias insensatas. Eu sumi por sete anos, em crises sem fim, falei-lhe que era teu amigo, mas e daí? Eu sumi. Sumi e voltei transfigurando proximidade em distância abjeta e sem explicação sensata.

Você jogava videogame em minha casa. Na doce infância era tão bom, só que eu era idiota e inadequado demais para a pré-adolescência. Como consequência de meu desenquadro, criei em você a vergonha que lhe permitiu o afastamento adequado. Éramos dois, e daí? Daí que sumi sem nunca mais falar contigo. Daí que lhe achei um cara que preferiu a sociedade a amizade dourada.

Nos pegamos três ou duas vezes. Dormi contigo, em teu quarto. Sua mãe trouxe pizza, sem pensar em sexo homossexual de dois caras bissexuais que não davam pinta de nada. Éramos dois, éramos dois amigos e coloridos adolescentes numa época de liberalidade sexual. Quem você é agora? Você se assumiu ou ainda isola o fato sexual de sua família com ocultamentos constantes de sua inconstância inata?

De pastor você foi a ateu convicto. Íamos ao puteiro em apostasia à faculdade. Conversávamos muito. Você voltou a ser pastor, traiu o puteiro, o anarquismo, o ateísmo e a mim. Éramos dois, e daí? Daí que nunca mais falamos e eu até hoje não me lembro de seu sobrenome.

Eu era tão católico quanto um católico deve ser. Num retiro vocacional buscando irmão ser. Te vi algumas vezes em conversas doutrinais que foram fáceis de esquecer. Lia "Ordem Nova", o reacionarismo era moda, a monarquia voltava em mentes e não em regimes. Sempre quis te comer, sobretudo quando bebíamos na igreja. Eu fiquei sabendo, você beijou garotas e eu beijei rapazes. Éramos perfeitamente heterossexuais e completamente bissexuais.

Em Santa Catarina foi um horror, afastado da família e da cidade que morei com louvor. Identidade em choque em novo mundo cultural. Você foi padre, agora era homossexual e casado. Eu? Eu era o cara que ia em retiros vocacionais e militava no movimento negro. E mesmo você sendo casado com outro homem, desejei que fosse meu próprio homem. Treinamos juntos, sugeri poliamor e um dia no pós-treino você me chupou. Eu fui pra São Paulo, você lá permaneceu. Ficou onde fui, para permanecer de onde era. Eu voltei pra São Paulo, para permanecer de onde vim. Éramos dois, e daí? E daí que ainda penso em você.

Eu lia Olavo de Carvalho, você lia Nietzsche. Eu era Apolo e você era Dionísio. Só que eu tinha um Dionísio oculto e você tinha um Apolo oculto. Pegamos duas mulheres, mas quando a pegamos, uma das duas não estava presente e nem conhecíamos a outra que estava por vir. Pegamos a mesma flor e depois a outra flor, em perfeita conformância com a igualdade do sabor. Você me apresentou a social, eu te apresentei a transexual. Você me apresentou a Dionísio e eu te apresentei ao tradicionalismo. Éramos loucos sem tirar e nem pôr, talvez seja por isso que você foi um dos únicos que ficou.