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segunda-feira, 25 de março de 2024

Acabo de ler "La resistencia" de Ernesto Sabato (lido em espanhol)

 



Existe uma beleza indescritível na obra de Ernesto Sábato. E essa é a capacidade com que ele argumenta com erudição, mas suas formas conteudísticas não param exclusivamente na eruditividade, elas vão facilmente para uma grande poética que demonstra o gênio criativo dum grande autor. O uso do espanhol por Ernesto, sem se perder na contumaz objetividade acadêmica, demonstra que ele além de acadêmico é um artista das palavras.


Neste livro, vemos um Ernesto bastante pessimista para com o mundo em que vive. Se questionando sobre a megalomania estatizante, a massificação do homem, a ausência de sentido e, de igual modo, a capacidade do mundo sobreviver a exploração exaustiva de recursos naturais. O cenário, bastante catastrófico e desumanizador, apresenta um mundo corroído pela ausência de sentido existencial.


A linha de pensamento poderia ser facilmente conectada com a percepção de Viktor Frankl e, igualmente, de Ortega y Gasset. Sendo que Frankl diagnosticou melhor a ausência de sentido atual e Ortega y Gasset diagnosticou exemplarmente o fenômeno do homem massa. Todavia a chave da questão política - quadro ambiental e agigantamento do Estado - são bem observados por Ernesto.


Ora, é evidente que o trabalho de Ernesto teria uma conexão, também profunda, com George Orwell: este também era cético para com o socialismo estatista de seus dias. Todavia há um diálogo com a espiritualidade teológica da libertação dos dias de hoje, muito ligada à ecologia, como vemos em Leonardo Boff.


Existe uma possibilidade monstruosa de conexões na obra de Ernesto. Ela se revela bem ampla, bem complexa e, portanto, bastante rica em possibilidades dialógicas. Sua leitura também é bastante agradável. Como sempre, mais um excelente livro lido.

quarta-feira, 19 de julho de 2023

Haverá Segundo Sol

 No oceano dos teus lábios

Posso encontrar

Brevemente encontrar 

O paraíso perdido de outono mar

O invernal socorro de velho amar

A ternura crescente de primevo lar 


E se a teu sorriso ateu alcançar 

Espero beber em lindo lugar 

A loucura crescente de teu inverno e desértico, ermo e insólito apaixonar


Sabendo que haverá segundo Sol

A brilhar 

Em teu rosto de garota má


Haverá segundo Sol da esperança 

Que afaga alguém que tenta esquecer 

Esse enfado da matança


Haverá segundo Sol da fé 

Que afaga alguém que tenta esquecer 

A baixeza da angústia 


Haverá segundo Sol de amor 

Que afaga alguém que tenta esquecer

O ressentimento diabo da insânia 


Haverá segundo Sol de fogo

Que afaga alguém que tenta esquecer

A insólita lembrança


Haverá segundo Sol de verdidão 

Que afaga alguém que tenta esquecer e crescer

Porém se afama na amargura da infância

E um dia, talvez ele possa superar e entender

Tal ressentimento remanescente da infâmia


quinta-feira, 21 de julho de 2022

Prelúdios do Cadáver #4 - Sinto Raiva

Texto publicado em 16/06/2018


O tempo passa e eu não sei o que estou a fazer de minha vida. A única que venho ficado a sentir, nos últimos tempos, é uma cólera abismal misturada com frustração colossal e com um punhado de letargia zumbificante.


Não sinto vontade de nada. Só sinto a letargia. A letargia devora-me por inteiro. Tenho vontade de ficar parado, deitado ou sentado e sentir a agonia consumir-me por inteiro. O tempo escaparia dolorosa e lentamente. Perguntar-me-ia novamente: “Quantas vezes já me senti assim?” ou “Quantas vezes esse ciclo repetir-se-á causando-me dor e sofrimento?”. Então eu teria as memórias invadindo-me, recordando-me amargamente de toda a minha vivencialidade obtusa.


Tento ler e tento escrever contra a minha própria vontade de nada fazer: acabo por escrever essa porcaria de texto mal inspirado. Tudo que crio é vazio. Tudo que crio é sem sentido. Tudo que crio é destituído de sabor. São criações mortas, criações sem vitalidade. Um produto acinzentado e nojentamente preparado. Tudo isso vem de minha interioridade, tudo isso é o próprio estado de minha interioridade.


Ouço só música cristã e harmônica. A mesma não me traz felicidade, a mesma não me traz alívio nenhum, é uma forma de busca de salvação desesperada. Talvez eu busque um escape mágico. Talvez eu busque fugir de meus pensamentos. Talvez eu busque fugir de mim mesmo. Talvez eu busque simplesmente não aceitar a mim mesmo, esse é sempre meu dilema!


Matar-me-ia se eu pudesse. Estrangular-me-ia mil e uma vezes se necessário. Violentar-me-ia se eu pudesse. Toda a angústia cessaria assim que eu cessasse de existir. Não haveria mais letargia. Não haveria mais ódio. Não haveria mais frustração. Violência autocentrada contra a existencialidade nauseabunda. Morte e desistência da futuridade. Só o adiantamento do fim!