quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Pugna Legalis #1: Constituição e Concreticidade

 


Essa série de anotações públicas será deixada para cursos menores (no sentido de duração) que venho feito. Eu começarei com o "Igualdade, Constituição e Democracia: Direitos em Perspectiva" do professor Wallace Corbo. Esse pode ser encontrado no Instituto Conhecimento Liberta.


A pergunta que o professor iniciou a aula era "O que é uma Constituição?". Depois disso, citou várias questões que são sempre suscitadas, mas pouco aprofundadas: Constituição de 1988, direitos fundamentais e democracia. O Brasil, ao todo, já teve oito (8) Constituições.


A ideia de Constituição surgirá com o constitucionalismo junto às revoluções liberais do século XVIII. As ideias atreladas eram:

1. Separação dos poderes;

2. Organização do Estado;

3. Proteção de direitos fundamentais.


Em outras palavras, a Constituição se ligava a ideia de Estado e ideias de organização política.


No século XIX, percebia-se que os objetivos enunciados pelo constitucionalismo do século XVIII (organizar o Estado, separar o poder, proteger o direito) não estavam sendo devidamente cumpridos. Logo veio a separação da Constituição como Ideia e a Constituição como Realidade. Isso era observável na Constituição Francesa e na Constituição Americana, as duas previam uma série de direitos, uma série de limitações ao Estado, mas, na prática, esses direitos e essas limitações não eram respeitados.


Ferdinand Lasselle, um escritor e político alemão, desenvolveu a ideia de "fatores reais de poder". Essas forças concretas (econômicas, sociais e políticas) são as que determinam o funcionamento do Estado e do poder político. 


Mas o problema é que a Constituição deve ser uma norma, uma norma jurídica. Algo que entra no terreno do "dever ser". A Constituição deve criar deveres, deve criar comandos. Ela não pode ser qualquer coisa. Hans Kelsen, jurista e filósofo austríaco, desenvolverá uma ideia de que a Constituição não é só filosofia e sociologia, ela é um direito e é a lei suprema de cada país.


Pode-se entender a Constituição como uma norma jurídica suprema. Ela deve condicionar todas as leis, decretos e resoluções — precisando ser respeitada. Para ser respeitada, ela precisa da ação social, isto é, pessoas nas ruas, nas instituições políticas, nas instituições jurídicas. Ela depende da ação concreta. O que existe é um desafio de efetividade, visto que a Constituição só se concretiza com base na ação social e institucional.


Entra-se, então, na força normativa. Isto é, a capacidade de algo não só estar escrito na Constituição, como também seja uma força efetiva, algo que deve ser respeitado, algo que a força política e a força jurídica se mobilizam para efetuar e para corrigir o que não é cumprido. Assim evitando-se distorções como as que ocorreram na Constituição de 1824 (direito à liberdade ao lado da escravidão) e nas Constituições de 1937 e 1967 (direitos fundamentais e liberdade ao lado de regime ditatorial e autoritário).


A Constituição de 1988 apresenta impulsos de efetividade constitucional por meio da efetivação de políticas públicas. Ela depende, é claro, da ação das pessoas, dos operadores de direito, dos parlamentares. E nem sempre as pessoas estão em discordância, mas ela abre a possibilidade dialógica. 

domingo, 7 de setembro de 2025

Direitos Civis na História Americana #2

 


Quando pensamos em lei natural, não pensamos em uma "lei da natureza", mas uma lei derivada da moralidade humana. Isto é, a percepção de justo e injusto, bem e mal, certo e errado. Alguns estudiosos jusnaturalistas dirão que a lei natural é a parte da lei de Deus que pode ser compreendida pela razão humana.


Muito do que entendemos de direitos naturais são: propriedade, liberdade pessoal, saúde, segurança, reputação, a liberdade de fala, liberdade de religião, liberdade de imprensa.


Os Estados Unidos da América foram fundados com base nas leis naturais e o governo era entendido não como um criador de novos direitos, mas como um assegurador dos direitos naturais.  Ele escapava dos chamados direitos abstratos, tais como era observados na Revolução Francesa.


Os movimentos modernos, no entanto, seguem uma tendência oposta. Isto é, acreditam em direitos criados pelo governo e mantidos por ele. E nessa linha que surgirá um segundo "Bill of Rights", o chamado "Economic Bill of Rights". Se os direitos derivam do governo, eles podem ser restringidos e aumentados por uma simples vontade governamental. Logo a segurança que existe neles é também variável. 


Existem duas categorias de direitos naturais. Os direitos substantivos e os direitos procedurais. Os substantivos são: vida, liberdade e propriedade. Os direitos procedurais são criados pela sociedade para garantir uma melhor segurança dos direitos naturais. Exemplos de direitos procedurais são: julgamento por um juiz (todos são inocentes até que se prove o contrário), habeas corpus (evita a arbitrariedade) e ex post facto (não prender pessoas que cometeram um ato quando esse ainda não era considerado crime).


Além disso, temos a noção de que todos os homens são criados iguais. Para assegurar que os direitos não sejam violados, há o direito ao voto, visto que nenhum direito poderia ser seguro se não há um efetivo controle de quem exerce o poder e quem controla os governantes controla as regras. Além disso, a igualdade de todos os homens requer consentimento para que todos sejam iguais, se não nem todos seriam iguais. É disso que surge a comunidade política. É evidente que aqueles que não são considerados cidadãos — pessoas de outros países —, logo que não fazem parte do corpo político, não possuem direito ao voto, visto que isso quebraria o consentimento do corpo político e abriria margem para manipulação.

quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Scripta Thomistica #8: Princípio de Não-contradição

 


Os antigos gregos desenvolveram um número de disciplinas ou corpos de conhecimento. Geometria, medicina e física são exemplos. Todas as ciências tinham como objeto um setor da realidade. Menos, é claro, a metafísica que tinha como objeto a realidade por si mesma. A metafísica investiga a realidade como um todo.


Um dos principais pontos da metafísica é: o princípio da não-contradição. Isto é, é impossível um ser ser e não ser ao mesmo tempo. Por exemplo: uma bola não pode ser vermelha e não ser vermelha ao mesmo tempo. Do mesmo modo, Sócrates não pode existir e não existir ao mesmo tempo.


Aristóteles definiu que o princípio da não-contradição é o primeiro princípio da metafísica. Esse princípio não é sobre crenças subjetivas, experiências ou perspectivas sobre dados elementos e objetos. O princípio é sobre a realidade por si mesma.

Direitos Civis na História Americana #1

 



Essas são notas do curso da Hillsdale College. Ele é chamado "Civil Rights in American History". O curso pode ser encontrado gratuitamente no site da Hillsdale College.


Quando pensamos a respeito dos direitos civis pensamos a respeito das liberdades que podemos ter em nosso dia a dia. Em muitos países do mundo, não há uma ordem civil de fato, mas a imposição de regras arbitrárias.


A ordem civil, o fato de todos viverem em regras comuns, também significa que não estamos usando meios militares ou coercitivos de forma primária. Estamos usando a razão, a concordância e a deliberação. É também da ordem civil que surge a civilização, isto é, a ordem dos cidadãos. A civilização só pode surgir de regras que pessoas conhecem e escolhem obedecer. Nessas condições a liberdade, o conforto e a cultura crescem. Ser civilizado é estar na ordem civil e a ordem civil é o melhor caminho.


Ter o direito da consciência, de usufruir do fruto do próprio trabalho, de crescer e florescer dignamente como ser humano. Tudo isso são meios de cultivar a nossa vida. O direito de autodesenvolvimento entra nessa equação.


Os Estados Unidos, fundados no dia 4 de julho de 1776, cresceram com base nos direitos naturais. Podemos citar três direitos: vida, liberdade e procura da felicidade. O governo, no momento inicial, servia para assegurar esses direitos.

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Acabo de ler "A Filosofia do Direito Natural de John Finnis" (Parte 2)

 



Nome:

A Filosofia do Direito Natural de John Finnis


Autores:

Elden Borges Souza

Victor Sales Pinheiro



O século XX traz a questão de como limitar o poder do homem e a opressão do homem pelo homem. O que traz um questionamento a respeito da ordem política, ética e jurídica. Além disso, um questionamento a respeito do direito positivo e da legitimidade jurídica de regimes genocidas.


Ao mesmo tempo em que se questiona o limite do direito positivo, aparece a possibilidade de retorno do direito natural. Só que vem a questão de como validar o direito natural. A rejeição de uma lei positiva injusta era um recurso do direito natural, visto que o jusnaturalismo apresenta noções éticas, políticas e jurídicas. Só que o jusnaturalismo enfrenta problemas quanto a sua validade jurídica.


A lei natural apresenta um dever ser enquanto ao ser. Ela afirma normas de acordo como as coisas deveriam ser. Porém o que pesa, na validade do jusnaturalismo, é o entrelaçamento que os seus críticos realizam a seu respeito: ele é aparentemente metafísico.


A defesa do jusnaturalismo contemporâneo é baseada na razão prática. Não há um direito natural como conjunto de regras fixas. Visto que a humanidade é naturalmente mutável, logo o conceito de justo não está completamente fixo, de forma rígida e imutável. A teoria da Lei Natural não depende da referência à natureza ou à vontade de Deus.


O que está buscando um jusnaturalista em nosso tempo é a compreensão do homem enquanto ser social, o que cria uma necessidade social, o que leva a existência da sociedade. Existe uma ordem necessária para essa sociedade. Deve existir a busca do bem comum nessa ordem.

Scripta Thomistica #7: Teologia

 


São Tomás de Aquino se inquiriu se podíamos chamar a teologia de ciência. Para tal, ele tomou a definição filosófica de Aristóteles.


A ciência é aqui definida como um corpo de conhecimento para entender determinado objeto. A biologia, por exemplo, é o estudo dos organismos vivos. A ética é o estudo da moral humana. A metafísica estuda tudo o que existe em uma forma mais extrema, chamada de ciência do ser.


Dessa forma, podemos chamar a teologia cristã de ciência? A teologia cristã é o estudo da revelação divina e o mistério de Deus revelado em Cristo. Os pontos iniciais do conhecimento da teologia cristã não são dados por um conhecimento evidente, nem por experiências ordinárias e tampouco pelo conhecimento natural do mundo. A teologia cristã tem como primeiros objetos princípios que foram dados verticalmente na divina revelação de Deus.


A teologia, então, apresenta uma particularidade. Em outras palavras, o conhecimento começa pela graça da fé. O conhecimento não aparece na demonstração natural e na argumentação filosófica, mas em uma profunda forma de insight dada pela graça da Santíssima Trindade. Visto que a Revelação Divina tem que estar acima de nossa mera capacidade humana de conhecer. Assim introduzindo uma amizade e familiaridade intelectual com Deus pela fé, esperança e caridade. Só desse modo o homem pode participar do conhecimento de Deus e dos santos.


A teologia cristã, em sua premissa, está acima da capacidade humana de conhecer. Então ela seria uma "ciência" — dentro da definição aristotélica — que escapa da razão natural e encontra a sua possibilidade na graça. Ou, em outras palavras, Deus dá ao ser a possibilidade de embarcar no estudo de Deus e o seu mistério através da graça. E esse saber se conecta com os outros distintos saberes.


A teologia é uma explicação dos mistérios da fé em sua coerência interna e como esses mistérios iluminam a condição humana. E ela é esse corpo de explicações que surgem para dar uma explicação a revelação divina.

Scripta Thomistica #6: como ler um Artigo da Suma Teológica?

 


Muitas pessoas têm dificuldade de compreenderem os escritos que estão na Suma Teológica. Seja por causa dos jargões, que estão nos termos da sua época, seja pela eloquência que o livro em si apresenta. Grande parte dos termos empregados, como dialética, hilomorfismo e teleologia não são palavras comuns.


Em primeiro lugar, a Suma Teológica nunca intentou ser uma referência primária e de caráter introdutório. Ela oferece um caráter pedagógico para o estudo da teologia. Dando uma visão sistemática e sábia da fé.


Se querermos, por exemplo, descobrir o que São Tomás de Aquino pensa a respeito da Graça, seria interessante olharmos para o que ele diz a respeito da Trindade, da pessoa humana, de Cristo e da vida no paraíso. Tudo está conectado. Você pode consultar introduções populares e comentários literários, mas nada disso pode substituir a leitura de São Tomás de Aquino por si mesmo.


Para compreendermos a Suma Teológica, precisamos compreender que cada artigo começa com uma questão. Tomás iniciará colocando uma citação de uma oposição. Essas oposições usualmente são argumentos ou vozes da antiguidade que colocam uma posição contrária da qual São Tomás de Aquino eventualmente defenderá. Ele também terá uma seção chamada "Sed Contra" na qual ele citará brevemente uma autoridade. Dali virá o Corpus (Corpo do Artigo), que dará o corpo da resposta real do artigo. Depois disso, haverá uma revisão das objeções e suplementos de respostas em turnos.