quinta-feira, 27 de abril de 2023

Acabo de ler "Kono Subarashii Sekai ni Shukufuku wo! - Vol 1 - Natsume Akatsuki" (lido em espanhol)




O que você faria se eu lhe contasse que existe uma história altamente improvável em que um  homem mau-caráter, uma deusa completamente burra, uma cavaleira masoquista e uma maga piromaníaca se unem para derrotar o Rei Demônio numa jornada épica em que os vilões mais parecem heróis e os heróis mais parecem vilões?


Num mundo em que os heróis centrais são figuras distorcidas e problemáticas, Konosuba apresenta toda a originalidade de um autor que veio para quebrar os clichês tão exaustivos e consagradamente repetidos até a demência. Essa é a novela rápida que levou a criação do anime e é tão ou mais engraçada que o anime.


O leitor deleitar-se-á com o humor de um autor que não cansa de bater e alterar tudo aquilo que se tornou comum no universo dos isekais. Distorção essa que é extremamente saudável, tendo em vista a macaqueação sem fim em que se encontram os já batidos enredos que se repetem tanto que chegam a nos levar a pensar que estamos vendo a mesma obra com personagens diferentes e com algumas pinceladas que alteram um pouco a fórmula padrão.


De fato, aqui está uma obra que merece ser apreciada e vista por todos aqueles que têm gosto pela cultura japonesa, sobretudo no âmbito dos animes, mangás, novelas rápidas/pequenas e novelas visuais.

quarta-feira, 19 de abril de 2023

Redpill é meu ovo!




Toda ideologia se funda no mesmo elemento gnóstico que se funda a redpill. E esta se deve a falsa resolução do mito da caverna:


O mito da caverna só tem uma "resolução possível", e esta é plenamente negativista. Isto é, a acoplagem de conhecimento aumenta o espaço da caverna, porém sem você sair dela. Quanto mais conhecimento tiveres, menos prisional se torna a caverna. Só que você nunca sairá dela: a aquisição de mais e mais conhecimentos pelo resto da vida é a forma de se lidar com o problema, mas não há como sair dele em absoluto. O mito da caverna só tem solução metafórica, quando o ser se liberta dum aspecto contingencial, cai em outro.


A redpill é literalmente mais um gnosticozinho dizendo: "veja, se você aderiu minha crença, você é livre". Aí você cai alguma bobagem (reducionismo de classes, reducionismo de raças, reducionismo de individualismo) - aquilo que poderíamos chamar de religiões civis. O verdadeiro conhecimento é o aumento contínuo do próprio conhecimento, destruindo as reduções tipicamente gnósticas que dão caráter circular e delimitado. A solução sempre envolve uma complexificação, visto que envolve o aumento de critérios em que se baseia a capacidade de perceber epistemologicamente o real, a ideologia é e vai num sentido completamente oposto: é um aspecto da realidade tomado em sentido absoluto.


Só que a maioria das pessoas não sabe que o absolutismo do real requer a relativização dos critérios unilaterais e/ou monistas. Este não é o relativismo niilista que nega a verdade por ela ser necessariamente múltipla, nem o relativismo sincrético que não se realizou em síntese, mas o próprio relativismo sintético que ampliou a capacidade de inteligir. A maioria das pessoas saem duma caverna e adentram noutra, migrando de religião civil para religião civil (do fascismo ao marxismo, do marxismo ao positivismo, do positivismo ao anarquismo, etc.). A verdade é a aceitação da multiplicidade do real, em que os critérios entram em síntese e, com base nisso, tudo aquilo que era parcial é locupletado, tornando-se relativizado.


Todo esse exercício leva a uma agonia em que o verdadeiro intelectual entenderá, a cada dia mais, que o mundo é complexo demais para ser resolvido via simplificações grosseiras da realidade. Já que afirmações literais tomam cada vez menos espaço e ele vê uma série de exemplos que se juntam, alterando o que parecia grosseiramente simples em algo de intenso aspecto multifacetado. Dito isto, crenças circulares demais e respostas cabais demais importar-lhe-ão cada vez menos.

Acabo de ler "El tercermundismo" de Carlos Rangel (lido em espanhol)

 



O que faz um país ser de "terceiro mundo" ou adotar uma ideologia terceiro mundista? Um livro, escrito quando a União Soviética ainda existia, tenta responder essa questão pela visão de mundo liberal. A forma com que ele encara é distinta: em sua visão, o capitalismo é sempre uma revolução permanente nos meios de produção, muito mais radical que a do socialismo.


Já tinha lido anteriormente um livro de Carlos Rangel, todavia este se encontrava em português. Resolvi ler um livro em que o autor escreve em sua língua nativa. É até estranho pensar que Carlos Rangel, Nicolás Maduro e Hugo Chávez nasceram no mesmo país: a Venezuela. Como uma terra, hoje conhecida por seu socialismo bolivariano, criou esse liberal? Quiçá uma ironia da vida. 


Segundo o autor, o socialismo surge da mentalidade coletivista e tribal anterior ao pensamento individualista atual. Isto é, o socialismo seria uma forma de retornar ao estado primário em que a individualidade ainda era inexistente. As pessoas buscam apenas subterfúgios sociais para não encarar o peso de sua própria existência e caem em tribalismos coletivistas (socialismo e fascismo), desta forma: o socialismo seria uma fantasia reacionária.


Segundo Rangel, o capitalismo é ditado por círculos - e isto também acreditou Marx - e quando esses chegam em sua saturação, faz-se necessário uma revolução brutal na forma com que se produz. Essa seria, por sua vez, a forma com que o capitalismo revoluciona permanentemente a forma de produzir. Isto é, não há e nem haverá capitalismo afastado da revolução. Desta forma, o capitalismo será uma mentalidade eternamente revolucionária.


Um livro bastante interessante que não poderia ser inteiramente captado por uma análise tão diminuta, recomendo a leitura do livro. Gosto muito da forma com que Rangel escreve.

sábado, 15 de abril de 2023

Acabo de ler "História Mínima de Uruguay" de Gerardo Caetano (lido em espanhol)

 



O Uruguai é um país que vive entre dois países que lutam pela hegemonia do processo civilizacional latino-americano. Estes são: Brasil e Argentina. Países que, querendo ou não, gozam de estatura elevada ao redor da América Latina e sempre serão olhados com olhos mais admiráveis, curiosos ou, também, com uma marca de desprezo. Vê-se, nestes dois, algo de subimperialismo.


O Uruguai sempre teve que dividir a sua atenção nestes dois. Os uruguaios já se consideraram argentinos orientais e, igualmente, já pertencerem ao Império do Brasil (como a província Cisplatina). Ao adotar submissão, foi tido como covarde ou simplesmente congruente. Uma ação de um país entre duas potências regionais só pode ser uma: neutralidade. Aliar-se a Argentina ou ao Brasil provocaria uma reação a quem ele não se aliou. Situação que seria complicada para ele.


Todos os países detêm uma história e nenhum povo é menos digno de ser nacionalista que outro. O amor pela sua pátria não é ditado por seu tamanho, porém pelas ações concretas que ele faz historicamente e criam um senso de eu plural. Este país, diminuto em comparação a Argentina e ao Brasil, sempre se destacou pela sua diferencialidade processual e, por vezes, pela similitude com os processos regionais que imperavam na região.


Os uruguaios não se veem como menores, veem-se simplesmente como uruguaios. Orgulhosos, também, de seus processos históricos. Um de seus lemas é "nadie es más que nadie", ninguém é maior que ninguém: uma sociedade hiperintegrada e pronta para um processo de eu plural maior que de outros países latino-americanos. Também é o país que sempre está um passo a frente nas colocações mais necessárias socioculturais. Todavia é, igualmente, um país que sofre pela ausência de pensamento estratégico e adequação ao tempo econômico e tecnológico do momento.


O Uruguai é um país amável e de uma história fantástica. Não é tão diminuto quanto falam e merece mais apreço e consideração por toda a América Latina. Um belo e emocionante livro, diga-se de passagem.

sexta-feira, 14 de abril de 2023

Acabo de ler "Psicologia Aplicada de Jung - Capítulo 9: o estudo dos sonhos"

 



Falar sobre Freud ou Jung sem falar sobre sonhos é quase como cair em heresia. O sonho é um território misterioso em que, grande parte de nós, tem necessidade imensa de compreender. Querendo ou não, os sonhos nos impactam.


O sonho é uma espécie de compensação em que aquilo que não foi feito, aquilo que foi reprovado ou reprimido é realizado num espaço virtual para que se obtenha a satisfação e, com isso, o equilíbrio psíquico. Porém o sonho desempenha muitas mais funções do que essa.


O sonho é a fotografia do instante mental do sujeito, é a forma com que ele vê o mundo naquele momento de sua vida. Graças a isso, se descobrirmos o que cada objeto simbolicamente representa ao sujeito, temos o seu retrato mental. 


O sonho também é gerado pela interação da pessoalidade do sujeito em contato com os símbolos universais (arquétipos), o que gera necessidade de reconhecer os dois. 


O misticismo e poder ilimitado do sonho remontam a antiguidade primitiva de nós e de como desejamos, no fundo, poderes ilimitados. Jung sempre frisou que, dentro de nós, há um ser primitivo que pensa da mesma forma pouco importando as mudanças culturais. E essa estrutura permanece a mesma mesmo que não nos demos conta disso. É por conta disso que devemos conhecer o inconsciente: para não sermos dominados por ele.

quinta-feira, 13 de abril de 2023

Acabo de ler "Psicologia Aplicada de Jung - Capítulo 8: o estudo dos arquétipos"




Um arquétipo é uma imagem primordial, uma leitura criada pelos nossos primeiros ancestrais. Segundo Jung, os arquétipos localizar-se-iam no inconsciente coletivo. Essa subestrutura que existe dentro de nós leva-nos a dados padrões comportamentais instintivos e inconscientes.


Jung descobriu o inconsciente coletivo ao estudar várias culturas aos redor do mundo. Ele descobriu um universo de símbolos comuns representados de formas distintas pelos diferentes tipos de humanos. Jung percebeu que mesmo existindo uma diferença entre um símbolo e outro, certos símbolos apareciam universalmente e desempenhavam papéis semelhantíssimos entre si.


Essa subestrutura encontrada por Jung seria presente em todos os seres humanos, demonstrando a unidade da humanidade numa única espécie. E também demonstraria um legado que nos deixa mais próximos um dos outros, visto que todo pensamento humano é ligado consciente ou inconscientemente a essa mesma estruturação.


Os estudos dos arquétipos como estrutura comum a todo mundo e a forma com que nossa personalidade se molda a partir dos arquétipos talvez estejam nos tópicos mais interessantes de todos os estudos psicológicos.


Acabo de ler "Contos de Lima Barreto"

 



Esse livro, junto com a sua coleção, chegou-me por acaso. Fazia parte dum grande número de obras que seria descartada pela instituição em questão. Graças a isso, ganhei na loteria acadêmica/intelectual.


Sobre o livro: o autor tem um estilo muito surpreendente. Ele adentra nos miúdos da vida social da época e traça uma grande narrativa, muitas vezes bastante psicológica, que usualmente termina na surpresa e agrado do leitor.  A forma com que ele consegue trazer profundidade em pouquíssimas páginas é fascinante.


Sempre sabemos que há algo de errado, algo que alguma hora sobressaltará. Ler esse autor é um exercício de inconfundível confusão. Seus textos são marcados por um entrelaçamento em que, alguma hora, algo será revelado e esse revelado será algo de errado e de cômico.


Recomendo esse livro a todos que buscam entretenimento de qualidade. Cada texto traz uma narrativa e temas bastante complexos, só que nunca ultrapassando uma exposição que interesse ao gosto do leitor. O autor é inteligente sem ser chato.