sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Acabo de ler "Perdoa-me por me traíres" de Nelson Rodrigues

 



"Amar é ser fiel a quem nos trai!"

Gilberto (personagem de Nelson Rodrigues"


Nelson Rodrigues é um dos maiores escritores brasileiros, ele sentiu no âmago a alma do povo brasileiro e soube como trazê-la com todo o vigor dum artista genial. Sua obra é trágica, sua obra é visceral, não é para pessoas fracas. Ele detona o senso comum, ele desafia os deuses e sai invicto.


Uma obra teatral recheada por tragédias, por mentiras, por partes não abordadas pelas pessoas mais usuais. Sempre trazendo vários planos de consciência - de inconsciência e inconsistência também - e dando substância a cada fala, como numa pulsão lírica e altamente poética que daria inveja aos maiores poetas.


Nesta obra, uma das mais fantásticas que já li, muitos assuntos que até hoje são tabus são apresentados de forma trágica. Às vezes indo para o terreno do comédia sem, no entanto, sair da linha geral da miséria.


Recomendo que o leitor esteja acostumado à literatura rodrigueana antes de entrar em contato com ela. É uma obra que abordará o ser humano naquilo que, em sua sombra, mais esconde e mais quer ocultar. Desvela aquilo que temos de pior numa sordidez reversa que visa, antes de qualquer coisa, expor a verdade da natureza humana em seu descomunal abismo.

terça-feira, 10 de outubro de 2023

Acabo de ler "Kage no Jitsuryokusha - Vol V - Aizawa Daisuke" (lido em espanhol)

 



Faz muito tempo desde a última análise, mas o anime até o presente momento não chegou a este ponto em que se encontra a pequena novela. Então tome cuidado com os possíveis spoilers.


Neste capítulo, vemos desenvolvimentos interessantes na condução da história. Aqui se entra num possível racha futuro do Jardim das Sombras (Shadow Garden) e as inovações tecnológicas que esta misteriosa organização pensa em introduzir ao mundo, vindas diretamente da Terra.


Também descobrimos mais dos objetivos da Seita que o Jardim das Sombras combate, embora o autor não tenha introduzido claramente quem são os maiores nomes, deixando a surpresa para depois. Embora esteja claro que Culto Diablos e o Jardim das Sombras disputarão o governo secreto do mundo de forma cada vez mais intensa.


O volume não deve em nada aos seus predecessores. O nível de seriedade e humor continuam a encantar do mesmo modo que encantavam nos primeiros volumes. O autor tem sido bastante capaz de dar um bom rumo a história e deixar o leitor ansioso com este mundo que ele cria e que nos conduz.


Espero que a adaptação do anime chegue logo neste volume e que mais pessoas adentrem em contato não só com o anime, mas com a Light Nível.

sábado, 7 de outubro de 2023

Acabo de ler "A Falecida" de Nelson Rodrigues

 



Todo povo tem uma forma de encarar o mundo. Existem povos que estão imersos em eternas lutas que justificam a sua existência enquanto povo e lhe conferem dignidade. Cada alma nacional traz uma literatura nacional que revela a cada estudioso algo do país que lê.


Machado de Assis escrevia cinicamente. Nelson Rodrigues, de igual modo. A razão para tal produção cínica que apresenta continuidade lógica através dos tempos? O brasileiro não luta por nada. A vida é, para tal povo, um eterno vaivém de vaidades que se alternam e pequenos prazeres que se sucedem. Neste sentido, a alma mais arguta não se apaixona: se ressente. Para se proteger do ressentimento, ri e faz humor.


O Brasil chega a ser trágico e cômico: a grandeza de sua pequenez e a pequenez de sua grandeza revelam a face dum gigante adormecido. E aqueles que ousam sonhar estão condenados a serem maltratados: no Brasil, sucesso é ofensa pessoal.


A literatura moralista, ao apresentar personagens falhos que não são exemplo algum para serem seguidos, é uma das mais propícias. Escritor moralista desnuda a alma para mostrá-la no lodaçal que se encontra. E, em nosso país, lamas não faltam, pecam pelo excesso de oferta e sobrecarregam o mercado. E, não, não sou exemplo algum para nada e minha vantagem moral está em reconhecer-me como parte endógena deste esgoto.


Nesta grande peça, Nelson demonstra, fio a fio, as vaidades que se alternam de personagem em personagem. Cada qual reduzido pela miudeza de sua deformação de caráter. E se o leitor ler e ver algo de sujo, saiba que esta é a intenção central de seu brilhante autor.

terça-feira, 3 de outubro de 2023

Acabo de ler "A Mentira" de Nelson Rodrigues

 



Ler Nelson Rodrigues é um hábito que tenho desde o ensino médio. Leio-o há dez anos e é um de meus autores prediletos. Poucos autores me fascinam tanto assim. Lê-lo é uma mescla de nostalgia e espanto.


Como de costume, e não no mau sentido, Nelson trabalhará com vários planos de consciência que se intercalam dando complexidade narrativa e psicológica nesta obra. Pouco a pouco, vemos as mazelas morais dos personagens sendo esmiuçadas. O que garante a habitual substancialidade que os personagens de Nelson carregam.


A trama diverte a cada passo. Você realmente fica atento e, até mesmo, ansioso para descobrir o que se sucederá e qual é a verdade por trás da mentira. O livro garantirá vários desdobramentos que prenderão o leitor por um bocado de tempo durante a leitura e, quiçá, por toda a vida.


O livro trabalha com a ideia de pecado e a ideia de mentira. Aqui a mentira é sempre presente e todo ato gerará uma consequência que se diversificará em várias ações paralelas, porém sincrônicas, dos personagens envolvidos. Desvendar essa teia de aranha através da leitura atenta é o dever do leitor. E ele terá uma grata e espantosa surpresa no final.


Fazia tempo que um livro não me divertia tanto e valeu muito a pena alugá-lo na biblioteca municipal. Recomendo-o fortemente para quem almeja um bom suspense com altas doses de boa psicologia, algo que Nelson Rodrigues tem de melhor.

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Acabo de ler "Kono Subarashii Sekai ni Shukufuku wo! - Vol 10 - Natsume Akatsuki" (lido em espanhol)

 



Chegamos ao décimo volume. O que significa que estamos mais próximos do fim do que do começo. E quando digo "nós" quero dizer "eu", embora eu prefira dar ao escasso leitor que me acompanha uma sensação de pertencimento, mesmo que falha ou pouca.


Konosuba preza pelo humor, pelas falhas de caráter, idiotice, comportamento duvidoso e dualidade moral de seus personagens. Este volume não falha nisso, porém ainda podemos ver o desenvolvimento dos seus personagens rolando.


Eu não gostei muito do baixo desenvolvimento de nosso protagonista, o Kazuma. Embora já podemos ver um Kazuma bem mais a vontade e proativo no mundo em que se encontra, o que é um excelente sinal.


Aqui vemos um desenvolvimento maior de Iris e mais dados em relação aos nobres. A preocupação que Iris demonstra pelo seu reino, pelo combate ao exército de Rei Demônio e sua tenacidade em seguir lutando é impressionante.


Como já poderíamos pressupor, um personagem já deixa vestígios de que o Rei Demônio não é um mau-caráter e que, provavelmente, revelar-se-á tendo mais caráter que os humanos e demais protagonistas da obra. O que já era esperado, visto que os vilões são melhores que os protagonistas no conjunto geral delineado pelo autor.


De qualquer modo, a pequena novela demonstra sinais de desgaste e já não apresenta a mágica que apresentava no começo. Espero que os próximos volumes melhorem.

terça-feira, 26 de setembro de 2023

Acabo de ler "Amor em Segredo" de Sonia Rodrigues

 



Certos livros nos aparecem com um ar de espanto. Ao pesquisar o nome "Nelson Rodrigues", na biblioteca, deparei-me com essa curiosa obra de sua filha.


A relação "pai-filha" é tratada de forma curiosa, visto que seu pai negou-lhe a paternidade diversas vezes. A sua mãe, uma mulher apaixonada, não quis ir atrás também. A filha teve que seguir uma jornada teimosa até que tudo viesse à tona.


Não é de se espantar que o nome "Nelson Rodrigues", um dos maiores autores da história de nosso país, caísse como um trovão no céu ao ser meramente pronunciado devido a grandiosidade de sua obra que, além de excelente, é recheada de polêmicas de alta qualidade.


O livro trás mais da figura de Nelson como pai. Além de sua relação conflituosa com a filha. Todavia não há unifocalidade no tema: há algo de autobiográfico e um quê de gênero de crônica - característica que puxou de seu pai.


Um livro que vale a pena ser lido por todo legítimo fã da obra de Nelson Rodrigues e, evidentemente, de sua continuidade sanguínea.

quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Acabo de ler "Memória Individual, Memória Coletiva, Memória Social" de Jô Gondar

 



Aquilo que chamamos de memória nunca carrega exatidão, mas sempre uma reinterpretação do passado conforme as cargas componenciais de nosso psiquismo no momento em que rememoramos. Logo a memória é uma possibilidade atitudinal de, conforme meditamos, adentramos num novo posicionamento existencial.


Também é fato que a memória sempre se altera. Ela é múltipla e as figuras humanas assumem forma de sustentação, rivalidade ou de modelo. Tudo isto varia de acordo com o nosso estado de espírito e, por tal razão, não devemos nos crer imbuídos de objetividade. Nossa memória é produto de nosso estado mental presente e da anterioridade que nos precede.


A memória se constrói de modo topológica, ligada à estruturação do meio que circunscreve e aprisiona o ser em sua circunstância. Desencadeada a partir de uma teia relacional de indivíduos sociopsicologicamente atuantes e, igualmente, moldados pelo meio que endoculturalmente os moldou previamente em conformidade com suas próprias tradições.


A mnemotécnica (arte da preservação da memória), mesmo zelando pelo cumprimento de sua objetividade, sempre cai na circunstancialidade de seu espaço-tempo e é obra dele. Ligada a uma subjetividade que lhe prende, mesmo que de modo inconsciente e impercetível por aquilo que pratica o ofício da historicidade ou todo homem que, por excelência, é ser social e de comportamento intrinsecamente narrativo.


No fim, a falha da objetividade nos livra do triste fardo de sermos ritualizados como escravos pelo passado. A memória, não sendo objetiva, é a arte de reinterpretar o passado e dar luz para uma nova vida que se abre, portanto é sempre uma arte e, mais do que isso, um arte de liberdade.