sábado, 7 de outubro de 2023

Acabo de ler "A Falecida" de Nelson Rodrigues

 



Todo povo tem uma forma de encarar o mundo. Existem povos que estão imersos em eternas lutas que justificam a sua existência enquanto povo e lhe conferem dignidade. Cada alma nacional traz uma literatura nacional que revela a cada estudioso algo do país que lê.


Machado de Assis escrevia cinicamente. Nelson Rodrigues, de igual modo. A razão para tal produção cínica que apresenta continuidade lógica através dos tempos? O brasileiro não luta por nada. A vida é, para tal povo, um eterno vaivém de vaidades que se alternam e pequenos prazeres que se sucedem. Neste sentido, a alma mais arguta não se apaixona: se ressente. Para se proteger do ressentimento, ri e faz humor.


O Brasil chega a ser trágico e cômico: a grandeza de sua pequenez e a pequenez de sua grandeza revelam a face dum gigante adormecido. E aqueles que ousam sonhar estão condenados a serem maltratados: no Brasil, sucesso é ofensa pessoal.


A literatura moralista, ao apresentar personagens falhos que não são exemplo algum para serem seguidos, é uma das mais propícias. Escritor moralista desnuda a alma para mostrá-la no lodaçal que se encontra. E, em nosso país, lamas não faltam, pecam pelo excesso de oferta e sobrecarregam o mercado. E, não, não sou exemplo algum para nada e minha vantagem moral está em reconhecer-me como parte endógena deste esgoto.


Nesta grande peça, Nelson demonstra, fio a fio, as vaidades que se alternam de personagem em personagem. Cada qual reduzido pela miudeza de sua deformação de caráter. E se o leitor ler e ver algo de sujo, saiba que esta é a intenção central de seu brilhante autor.

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