Nos segredos da impotência, se encontram os segredos da alma. Só o homem frente a realidade avassaladora que é a morte que ele se encontra com si mesmo em sua mais pura e plena face: a vontade de ontologizar-se e dar cabo a última pergunta que lhe conduz a vida que quer viver. Isto é, se não nos perguntarmos sobre a morte, não nos perguntaremos sobre a vida e adentraremos num círculo de vaidades que diluem a autenticidade de nossa existência num jogo de multiplicidades que se alternam.
Nelson é o mestre de ensinar a vida como ela é. Em vez de personagens plenipotenciários que alteram o mundo com o seu poder onipotente, onipresente e onisciente, temos o ser humano em sua condição mais primária e natural: a impotência. E é nessa impotência que se encontra a raiz das ações de nossos personagens, que lutam para ter alguma significação num mundo que, não estruturado para lhes satisfazer, atua antagônica e estruturalmente contra eles.
Quem, em sua humanidade, não se depara com os afetos transviados que se conduzem não a realização do desejo, mas a negação triunfal de suas expectativas mais tenras? Aqui temos personagens que são movidos pelas vísceras, sentindo-se traídos pelas dinâmicas psicossociais que sempre geram conflitos. O desejo de ser desejado é um dos aspectos mais determinantes da obra.
Boca de Ouro, personagem mitologizado ao limite, traz consigo uma mensagem: a pessoa que se marca para ser afetivamente marcada, seja no sentido bom ou mau. E é nisso que suas desventuras levam: a tragicidade do ser humano em seu ofício de ser querido. Já foi dito que o âmbito da cultura é o espetáculo do homem para o homem, visto que o homem quer mais do que um objeto, ele tem por objetivo ser amado.
Se tudo isso só leva a uma série de ações que visam demonstrar potência, temos uma série de fios que enforcam o personagem central da mitologização no momento em que ele se julgava mais poderoso. Tal lição, demonstrando a penosa realidade da vida, é uma verdadeira odisseia para quem se aventura na vida como ela é: um vaivém da potência e da impotência.
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