Ser cristão, no mais íntimo e profundo sentido do termo, não é crer meramente que o mundo se afastou de Deus pelo pecado. É crer, no mais angustiante desespero desconsolador, que tudo será salvo. É ver o mundo em ruínas, não só permanecendo de pé, mas sorrindo numa densa chuva sem fim, é preciso sorrir até no dilúvio, já que Deus é bom. Não abalado e niilificado com a presente derrota, e sim com a íntima certeza que esse mundo de dor e sofrimento, que esse vale de lágrimas, está em estado gestacional e o que vem depois é mais do que o progresso, é o paraíso. Lá, após toda dor, tudo fará um sentido e se terá uma conexão tão grandiosa, que tudo será perdoado. Mais do que perdoado, tudo será salvo.
Embora hoje não se possa dizer o mesmo. Embora hoje a contradição e a escravidão do ser sejam a norma. Embora hoje não há como dizer que o "Senhor é meu Pastor", já que hoje só se pode dizer: "Por que me abandonaste?". Todo esse sofrimento sem fim, esse mundo líquido de areia movediça sempiterna, esse desconsolo que arrasta o sofrimento em um constante holocausto, em constante desemprego, fome e miséria. É preciso crer num novo ser, ser esse que não é o cidadão perfeito duma utópica sociedade comunista ou duma sociedade conduzida por uma suspeita mão invisível. É preciso crer num novo Céu e numa nova Terra. Num Céu que se faz Terra. Numa Terra que nunca se desconectou e nem mais se desconectará do Céu. Mesmo que agora só haja o império da vaidade. Mesmo que agora só haja o retorno ao pó.
O mundo leva a crer que Deus não existe. O próprio afastamento de Deus o leva. Tudo leva a crer na escravidão da Serperte. O próprio enigma da Serpente é prometer o que já se tem, para se tirar o que se tinha. Só que um dia haverá um mundo, um mundo que não é desse mundo, só que nesse mundo se revela e se faz. Mesmo com tudo isso, mesmo com perene depressão, mesmo com hipotetéticos paraísos revolucionários ou reacionários. Devemos seguir em frente com esse paraíso que é gerado, a cada dia, em direção ao Reino Celeste. Mesmo que agora não o haja, mesmo com a razão condenando qualquer hipótese do milagre nesse vale de lágrimas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário