sábado, 18 de dezembro de 2021

Acabo de ler "Harry Potter e a Pedra Filosofal" de J. K. Rowling.



    "Se existe uma coisa que Voldemort não consegue compreender é o amor. Ele não entende que um amor forte como o de sua mãe por você deixa uma marca própria. Não é uma cicatriz, não é um sinal visível... ter sido amado tão profundamente, mesmo que a pessoa que nos amou já tenha morrido, nos confere uma proteção eterna. Está entranhada em nossa pele" (Dumbledore).


    Ler Harry Potter depois de anos é uma maravilha. A primeira vez que o li, estava no segundo ano do ensino médio. Ou seja, há cerca de oito anos atrás. Não me lembrava do quanto o seu universo era curioso e nem o quanto o livro era engraçado em diversos bons aspectos. E digo-lhes o livro é melhor que o filme, embora eu o tenha assistido - o primeirão - enquanto ainda era só uma criança. Assisti-o naquela ferramenta tecnológica, hoje antiquada, chamada Fita Cassete. Até hoje me lembro de estar ao lado de minha irmã enquanto assistia o primeiro filme de Harry Potter, das poucas coisas que me lembro da infância, essa é uma das melhores.


    Talvez a serenidade da vida adulta tenha acalmado o desordenado senso de realidade que me fazia digerir livros rapidamente em minha tenra mocidade adolescente. Talvez eu tenha ficado lento e reacionário, mas tendo fortemente a gostar mais de produções literárias que audiovisuais. Muitas coisas hoje não me agradam, entre elas os memes e as microescritas e microleituras que dominam a internet atual. Só que hoje, afastado da reação espalhafatosa, creio que é melhor calar-se e curtir um "próprio" universo cultural do que entrar em briga com uma unanimidade de imbecis. 


    Se alguém disser que "Harry Potter" é insuficiente como produto literário, dir-lhes-ia que são poucos os capazes de criar universos ricos de sentido e que a beleza da vida está mais contida em coisas que não veem do que as que veem. 

    Quanto a velhice e a morte, fico com as palavras de Dumbledore:

    "Afinal, para a mente bem estruturada, a morte é apenas a grande aventura seguinte".

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Diários Cadavéricos #1 - Inluta

Se eu morresse hoje, sentir-me-ia triste. Sei que minha família me ama, mas queria algo quente vindo de outro alguém. Alguém não ligado pelo fogo do sangue. Se assim não é, o amor não me basta. Não é suficiente o amor que vem do sangue, já que ele é quase que necessário. O amor de sangue é necessário e gratuito, mas o amor do outro, que não de sangue, é apenas gratuito. É por isso que invejo quem ama e quem é amado.


A luta que "inluta" em meu peito é luta amarga, meu Deus. Eu receio desejar mais o amor do outro que o seu - e assim o é. Como humano, é-me mais fascinante o amor humano do que o divino. O divino me parece mais distante do que o próximo. Se não tenho amor das coisas visíveis, como posso sonhar com o amor do Deus invisível? Eu preciso de um amor de carne, estou sozinho e confuso. A cada dia mais, a consciência de sua presença se apaga.


"Os desígnios de Deus são inexoráveis; não trateis de apressá-los" (Surata 16:1)  

"Pede-me; dar-te-ei por herança todas as nações; tu possuirás os confins do mundo" (Salmos 2,8)


Os dois argumentos provêm do mesmo Deus. Só que a pergunta que vem é essa: quando devo pedir e quando devo esperar? Devo pedir e esperar? O meu coração é aflito e na obscuridade perece. Sinto saudades de minha mãe e de um amor tal qual dela: tão pulsante quanto seu coração batente. Só que o que tenho é: uma vida vácua de amor e espiritualidade, recheada de caminhos tortos e passos insensatos. Deus, afasto-me de Ti, já que a tua presença se apaga de minha vida. Não pela sua inexistência, mas pela minha impiedade. Sua glória é tão benigna que parece inalcançável e por ser tão benignamente inalcançável, soa-me como irreal, impossível e irreproduzível nesse Vale de Lágrimas.


"Ele criou, com justa finalidade, os céus e a terra. Exaltado seja, pelos parceiros que Lhe atribuem" (Surata 16:13).

"O rei Davi estava velho, avançado em anos, e por mais que o cobrissem de roupas, não se aquecia" (I Reis 1,1).


Deus, se a tudo você ordenou, a razão de meu conflito é como um pó que se desfaz com a vassoura do tempo. Do mesmo modo que Adonias governou por tempo delimitado, em aparente desordem, meu sofrimento é igualmente delimitado. Só que esse tempo delimitado, que para Ti é nada, para mim é muito. A desordem momentânea é sensitivamente eterna. Já que a ordem natural encerra o mal visto que por Ti ordenada. 


"Poder-se-á comparar o Criador com quem nada pode criar? Não meditais?

Porém, se pretenderdes contar as mercês de Deus, jamais podereis enumerá-las. Sabei que Deus é Indulgente, Misericordiosíssimo.

Deus conhece tanto o que ocultais, como o que manifestais.

E os que eles invocam, em vez de Deus, nada podem criar, posto que eles mesmos são criados." (Surata 16:17-20)


O reino da matéria me parece tão único que minha pobre mente cai em idolatria, busco amar de forma deformada pois reduzida. A busca pelo amor daqueles que podem amar, mas não por Aquele que é o Amor. Busquei em outros amores te encontrar, quando encontrava, abandonava-o; quando eles sumiram, voltava a Ti tal como a ti volto agora. O que eu oculto é o que agora manifesto: sou tão errante quanto precário. Sou feio, meu Deus, e sofro de ausência de brio. Não sou bonito para ter direito e nem forte para conquistar. Se eu morresse hoje, arrepender-me-ia de ter passado tanto tempo me movendo pelo espaço-tempo do nada.

domingo, 12 de dezembro de 2021

Acabo de ler "Ed Mort e Outras Histórias" de Luis Fernando Veríssimo.

 



    Um autor versátil e capaz de dar vários entendimentos distintos, erudito tal como ninguém e referência múltipla para diversos agrupamentos. Homem de diversas leituras e humor genial, talvez um dos maiores gênios do humor da história lusófona.


    O livro conta com uma série de contos que traduzem uma série de sentimentos distintos - além de um certo constrangimento pelo autor ser demasiadamente culto. Tal como o "Você vai ver" no qual a marginalidade, o crime e o mundo distópico remetem a um cyberpunk cada vez mais real e aproximado do Brasil. Coisa que traz um certo mal sentimento e um elogio a capacidade profética do autor. Confesso também que me perdi numa série de referências que partem de um Brasil que não vivi e que me deixou meio perdido no entendimento de alguns contos, mas nada que fizesse com que eu perdesse a qualidade da leitura.


    "Organizamos os nossos dias em datas com a ilusão que assim estamos organizando, de alguma maneira, o Universo. O primeiro ato racional de Robinson Crusoé na sua ilha foi marcar a passagem dos dias no tronco de uma árvore. Só então, situado nas suas datas, partiu para pôr ordem na sua solidão e tratar de sobreviver"

    É incrível como o autor consegue traduzir a sua erudição em comédia, já que a maioria de nossos ilustres intelectuais transformam a sua erudição em alguma produção chata, formal e que não dá tesão algum em se ler. As suas referências dão um gosto maior a leitura, tal como a piada do rato albino que sempre volta e por isso se chama "Voltaire" ou quando Ed Mort investiga o caso de Sartre no Brasil.


    Termino o livro com uma certeza: quero e lerei mais livros do autor que, para mim, é genial.


segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Acabo de zerar Ocean's Heart!





    Esse é um dos melhores jogos indies que já joguei. O fato dele remeter aos clássicos jogos do The Legend of Zelda é um adicional enorme. E o jogo cumpre seu papel de ser um jogo "estilo Zelda". Seu universo é riquíssimo e realmente vale a pena saber de sua história e fazer várias de suas missões secundárias.

    O jogo é visualmente belo, relembrando a era 16 bits (alô, Mega Drive e Super Nintendo), só que conta com efeitos visuais aprimorados. Quando joguei, senti uma enorme nostalgia que foi cumprida em cada longa hora do jogo. Tive que muitas vezes pensar, anotar, revisar pensamentos, olhar para as anotações e aprender um pouco mais de coordenadas - tudo o que eu faria jogando Zelda. Um simples diálogo muda tudo e "escutar atentamente os NPCs" é de importância crucial. Sério mesmo, já ignorei diálogos e acabei tendo que voltar atrás apenas para ler mais minuciosamente.

    O jogo em si não é tão longo, mas como você se perde em missões secundárias - que recompensam acentuadamente -, você acaba por jogar por horas e horas e dias e mais dias. Se eu pudesse dar uma dica, essa dica seria: faça as missões secundárias, simplesmente faça. A experiência das missões secundárias favorecem muito a jogabilidade geral do jogo.
Se eu tivesse que dar uma experiência negativa, essa seria: seus chefes são fáceis demais e a necessidade de pensar estrategicamente quase some do mapa mental quando falamos da dificuldade dos chefes - não que isso afete muito negativamente, mas é um fator que é importante para mim. Os chefes viram monstros padrões com algumas adições visuais.
É um jogo que vale muito a pena jogar e que roda em quase toda carroça que você ousar colocar o joguinho. Esse comentário é importante: seu PC fraco que só não morreu por sua piedade e falta de grana será "revitalizado" com essa experiência de gameplay.

    Sem dúvida é um jogo fantástico, com um enredo fascinante, que sabe entregar uma boa experiência geral e que entretém por dias. No final, ao olhar por tudo que chegamos a passar na história e gameplay, temos a sensação feliz de missão cumprida. Nos integramos no jogo e tornamo-nos participantes dele de forma definitiva. Amei!

domingo, 5 de dezembro de 2021

Acabo de ler: "Em busca de rigor e misericórdia" de Lobão.





    Creio que Lobão seja um autor de estilística fascinante, uma vida pujante e de uma originalidade inequívoca.

    "Eu precisava mergulhar em questionamentos como: por que os intelectuais brasileiros são, em sua esmagadora maioria, tão unívocos e quase sem qualquer nuance de pensamentos?; por que esse deserto de opções ontológicas?; por que tudo que não se coaduna com esse monomaníaco pensamento reinante vira um tabu a ser perseguido e eliminado, jamais ponderado e discutido?; por que os debates, já tão escassos em outras eras, foram aterrados na vida pensante brasileira?; por que todo pensador, artista, produtor de alguma cultura no Brasil, caso não esteja atrelado aos cânones do mainstream, à ortodoxia pouco esclarecida de nossa intelligentsia, é, via de regra, tratado como um pária, como irrelevante, como um inimigo candidato a se tornar um nada?".

    A consciência de que vivemos num país recheado de bovinidade é, de longe, a que mais nos enche de temor. Em nosso estado atual, é-se impossível sequer um debate real, já que isso sugere uma série de estudos de cânones contraditórios que ninguém se atreveu a estudar por motivos de adesão ideológica-identitária. E, se estudou, estudou sem o menor "constrangimento" de tentar entender, já que o objetivo do estudo de um pensamento contrário é, quase sempre, a refutação ou a recusa a priori. Quando não, vê-se a "leitura camisinha" que tem por objeto o comentário de um autor que se gosta sobre um que não se gosta.
 
    "A solidão é a matéria escura da coletividade. Quem se nutre na solidão se torna um mundo, uma entidade que injeta sabedoria e oferece possibilidades múltiplas à coletividade. Meu insight partia da percepção de que nossa condição básica, a solidão, tem peso infinitamente maior naquele cujo ofício é contemplativo, criativo, o que a torna grande companheira".

    A vida intelectual não pode se curvar de forma abjeta a uma reprodução sem fim de consensos coletivos sem perder a sua autenticidade crítica. O que se vê é uma substituição da mentalidade crítica por um consenso social, isso anula a verdadeira forma de analisar a intelectualidade.

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Acabo de ler "O Prazer de Pensar" de Theodore Dalrymple.



    Um livro fantástico que conta histórias e experiências de Dalrymple com livros. Como a vida de Dalrymple é fantástica, envolvendo uma série de histórias icônicas com o proibido e aquilo que é politicamente nocivo ou desastroso - sua vivência em países em guerra e em ditaduras é própria e ele foi a esse tipo de país apenas para saber como ali se era (loucura, inteligência ou gosto pelo perigo?) -, há uma série de construções que demonstram como a curiosidade de Dalrymple é avançada e como ele lê diversas coisas que são tão variadas que ninguém saberia dizer a unidade de sua biblioteca.


    Se, no Brasil, vivemos num debate pouco dialógico em que um não lê o canon do outro - esquerdistas só leem esquerdistas, direitistas só leem direitistas, cristãos só leem cristãos de sua denominação e por aí vai -, o pensamento de Dalrymple vai além e a sua erudição demonstra uma leitura constante de obras de esquerda, mesmo que ele "seja de direita". E, seu pessimismo, é desenvolvido com uma boa razoabilidade.


    Com uma excelente prosa, Dalrymple demonstra ser um dos maiores escritores conservadores da atualidade. Uma inteligência pouco igualável e, possivelmente, de uma pessoa única. 

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

Acabo de ler "Qualquer Coisa Serve" de Theodore Dalrymple.

 


    Acabo de ler "Qualquer Coisa Serve" de Theodore Dalrymple.

    "Não odeio religião - na verdade, sou mesmo a favor dela. Assemelho-me a Gibbon, que ao tratar do sincretismo religioso romano declarou, admirado, que o povo achava que todas as religiões eram igualmente verdadeiras, que os filósofos as julgavam igualmente falsas e que os magistrados as consideravam igualmente úteis, sem porém haver qualquer conflito sobre o assunto. Ou seja: a religião era útil por melhorar o comportamento humano e mantê-lo lícito".

    Dalrymple é um dos escritores que mais gosto devido a sua escrita sarcástica que, muitas vezes, leva-me a várias risadas durante a leitura. O mais interessante é que Dalrymple é um homem que dá análises de situações extremas que, por sua extremidade, sempre levam ao aguçamento de minha curiosidade.

    Grande parte da escrita de Dalrymple se deve ao seu contato direto, sua experiência pessoal, com criminosos, com ditaduras e com países subdesenvolvidos que sofrem de violência extremada. E não para por aí, a própria vida investigativa de Dalrymple contempla o estudo de várias experiências perigosas que tomaram forma de literatura. Estudar a questão do mal é, para ele, um assunto sempre novo e interessante.

    Creio que as várias experiências com "o problema do mal" que Dalrymple vivenciou o levaram ao seu ceticismo político e seu pessimismo antropológico, tornando-o um intelectual conservador. Não um intelectual conservador qualquer ou algum fanático político. Dalrymple está longe de ser um reacionário bolsonarista ou coisa análoga, muito pelo contrário: ele é um brilhante intelectual, com uma erudição vastíssima e um reportório argumentativo inigualável. Não só isso, como já disse anteriormente: muito de seu posicionamento intelectual surge de uma experiência direta com o problema tratado.

    Não me senti nem minimamente entediado em nenhum momento da leitura da obra, sempre fiquei impressionado pela riqueza vivencial e intelectual de Dalrymple. E, mais do que isso, tive muitas boas risadas com o sarcasmo do autor.