terça-feira, 27 de junho de 2023

Acabo de ler "Breve Historia de Cuba" de Julio Le Riverend (lido em espanhol)

 



Cuba é um país espetacularmente curioso, desperta amor e ódio em diferentes públicos. Alguns saem numa apologética apaixonada, outros numa crítica brutal. Eu prefiro nem concordar e nem discordar sistematicamente de nada, visto que isto é uma postura dogmática. Só consigo pensar pontualmente, de forma lenta e menos apaixonada.


Com esse livro, o leitor entenderá um pouco do descomunal ódio que nutrem alguns cubanos pelos americanos. Parte dele é verdadeiramente justificável, visto que os Estados Unidos da América quiseram prezar muito mais pelos próprios interesses do que por uma relação fraterna de povos equivalentes em soberania. O que gerou uma histórica interferência radicalmente imperialista e metodologicamente colonialista, muitas vezes se pensando que Cuba seria um dia integrada aos Estados Unidos.


A história de Cuba é marcada por uma forte tensão: um povo que é sempre tido em menoridade, arrastado por potências e agentes que lhe são exteriores, dando-lhes uma sucursal sensação de impotência. Esta é ainda mais frequente nas figuras de Espanha e Estados Unidos, porém os EUA são mais opressores mais recentes.


A colonização espanhola, e a colonização semidireta dos EUA, sempre levou ao esmagamento das pautas orgânicas do país. Talvez a continuidade opressiva levou a um desgaste e a uma radicalidade que hoje se configura em forma de ditadura de extrema-esquerda, essa seria uma psicologia bastante conveniente - e explicativa de seus momentos históricos e estado atual - a um país historicamente marginalizado e oprimido.


De todas as formas, o final do livro assume tons de hagiografia e o autor parte para uma apologética triunfal do regime, como se este fosse incapaz de, em sua dimensionalidade profética e sacrossanta, cometer erros. Creio que a carga crítica some e dá os ares religiosos que, a meu ver cético, nenhum regime político deveria ter.

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Acabo de ler "La Revolución Social y las Universidades" de Salvador Allende (lido em espanhol)

 



Neste livro, temos alguns esboços de quem era Salvador Allende e em que acreditava, sobretudo na questão política. Como o livro passado foi de sua filha, creio que a análise anterior pode ser completaria a essa e que a leitura dos dois livros possa, igualmente, ser complementar.


Notarão que há uma "evolução de pensamento" (embora eu prefira "complexificação") entre pai e filha, não deixando de ser um laço contínuo: a filha adiciona direitos sociais mais amplos, foco em grupos socialmente desfavorecidos e pautas ecológicas. O que dá um entendimento mais amplo das pautas da antiga esquerda e pautas da nova esquerda. Como são livros bem pequenos - embora ambos estejam em espanhol  -, talvez seja uma experiência interessante e esclarecedora.


Salvador Allende declara ser um aprendiz de marxista, porém mais próximo ao socialismo de forma mais ampla e não doutrinalmente marxista. Não poderia afirmar se essa colocação tem validade para toda sua vida. Vemos também que foi amigo de Fidel Castro e Che Guevara, mesmo que tenha usado meios diferentes e não fosse "marxista" em sentido estrito.


Allende declarar-se-á pró-nacionalização e acreditava que os países ricos, de índole imperialista, roubavam recursos e deixavam o país mais pobre. Não só o Chile: a noção de ser um país potencialmente rico, mas incapaz de enriquecer por causa da extração de recursos por mãos estrangeiras repetia-se em toda América Latina.


O livro, além dos argumentos já citados, é uma obra dedicada a utilidade social do estudante universitário e como estes devem se engajar no bem do país e do mundo. Além de um alerta ao egoísmo da busca da realização individual que desvia o coração da luta pelo mundo melhor.

domingo, 25 de junho de 2023

Acabo de ler "La Koinonia Eclesial" de Gustavo Gutiérrez (lido em espanhol)

 



Antes de começar a análise: não se assuste, a capa não está errada. Estava buscando alguma leitura mais diferenciada e resolvi buscar teólogos latino-americanos para ler, acabei por encontrar um importante teólogo da libertação.


A teologia de Gustavo é focada no sentido comunitário, isto é, numa forma de viver mais pautada pela sustentação recíproca. É nesta sustentação de reciprocidade e alteridade que se demonstra a teologia de Gustavo, e aí que está seu vigor.


A vivência do evangelho é a vivência da comunidade cristã. Uma comunidade que busca uma irmandade e a superação das desigualdades e injustiças que a dividem. Logo é cristão desejar a superação das problemáticas sociais e a comunidade cristão não poderia se furtar a este objetivo sem deixar de lado a sua natureza e missão evangélica.


Na sociedade latino americana, marcada pelas gritantes desigualdades que a atormentam, a missão cristã tem um caráter extremamente profético e denunciatório. Ela anuncia à mensagem evangélica, marcada pela comunhão, e denuncia vigorosamente as mazelas sociais.


Para quem quer começar a estudar a teologia da libertação, certamente é uma leitura bastante recomendável.

sábado, 24 de junho de 2023

Acabo de ler "Governabilidad y cohesión social: el caso de Chile" de Isabel Allende Bussi (lido em espanhol)

 



Sabendo previamente que o nome desta mulher causaria curiosidade, presto uma breve explicação: ela é filha de Salvador Allende, ex-presidente do Chile. Como é quase de conhecimento comum o que houve com seu pai, parto para a análise do livro em si e menos para detalhes biográficos.


O livro analisado é, mais uma vez, voltado a realidade política do Chile - tal qual o lido anteriormente. Porém este não se centra da partilha de poder na esfera subnacional. É mais sobre o levantamento de políticas para o melhoramento político do Chile de forma mais centrada em sua unidade política.


A autora, semelhante ao seu pai, é de visão política progressista. E defende uma série de visões que aumentariam o tamanho do Estado chileno com o fim de aumentar as estruturas da seguridade social, visando a igualdade.


A autora defende que uma maior regulamentação da economia e um investimento maior em certos setores dinamizariam a economia e trariam um desenvolvimento maior ao país. Também defende uma aplicação e reconhecimento mais tenaz de direitos.


Um livro interessante para quem quer se informar sobre o debate político chileno e as questões políticas concernentes a ele, mas igualmente - e por extensão - ao debate político latino americano.

sexta-feira, 23 de junho de 2023

Acabo de ler "Santiago não é Chile" de Egon Montecinos (lido em espanhol)

 



O livro se trata duma crítica ao modelo de Estado chileno. O nome é uma piada ao modelo centralizador que concentra o poder na capital (Santiago), reduzindo as outras regiões do país à menoridade política. 


O autor quer que as regiões subnacionais tenham maior poder político. A razão é que as pautas endógenas destas partes territoriais - daí o nome "subnacionais" - são mais bem compreendidas por elas mesmas e nada melhor do que elas próprias para gerirem seus rumos.


Há um conflito gestionário entre o modelo unitarista - que concentra o poder para si - e o modelo, por assim dizer, federalista - em que as partes subnacionais tem maior autonomia para decisão de seus destinos. O autor, aderindo a descentralização, advoga que grande parte da mazela da desigualdade territorial vem da centralização política.


Um livro que, poderíamos dizer, é bastante interessante para quem quer compreender o drama político chileno mais a fundo. Já que o Estado chileno passou por uma redução de tamanho intencionada por Pinochet, impossibilitando regiões de fornecerem serviços de seguridade social no âmbito educacional e de saúde.


É interessante que tal mudança só seria possível com uma mudança da constituição e isto é um problema enorme, sobretudo no Chile onde não há bastante consenso em torno desta questão.

segunda-feira, 19 de junho de 2023

Acabo de ler "El Sonido Primordial" de Luis Alberto Spinetta (lido em espanhol)

 



No pódio dos cantores de rock da Argentina, encontram-se três homens: Gustavo Cerati, Luis Alberto Spinetta e Charly Garcia. Homens dotados de capacidade ímpar e renomados por destreza e talento.


Ler um livro do Luis é, para mim, prazer e descoberta. Conhecer o outro lado de uma obra de um músico genial é sempre edificante, sobretudo quando se trata de um grande homem. E neste livro vemos a história da música comentada por um grande músico.


Com uma atenção especial voltada ao quebrador de normas chamado John Cage, nada escapa ao nosso arguto pensador. O começo da música, Gustav Mahler, Beethoven, Stravinsky, canto gregoriano. É um universo sintetizado em forma de livreto.


Qual a distância entre o som e o silêncio? O que veio antes? Qual a fluência do tempo na música? A precisa metragem assume papel especial aqui. Essas questões sondam o livro. Tudo é tratado de forma de ligeira, porém ainda assim encantadora.

terça-feira, 13 de junho de 2023

Tautologia de Lázaro

Às vezes meu passado póstumo volta-me como que numa forma de revólver


Por vezes sonho dormir como num desejo náufrago


E por mais que eu queira quebrar os turbilhões agônicos que me acorrentam neste cadáver plástico


Tenho uma interior luminescência que me ata neste corpo pútrido


Ressuscitar, mais uma vez


Já que se vive enquanto morto, pode-se também ressuscitar-se enquanto morto, infinita e nauseabundamente


Como numa tautologia de Lázaro