quinta-feira, 14 de março de 2024

Acabo de ler "Dorotéia" de Nelson Rodrigues

 



Por vezes uma sociedade padece, se entristece, pela ausência da liberdade. Essa peça pode ser encarada de uma forma psicanalítica, sobretudo na psicanálise de Reich, por causa do desafio proposto por ela: o que é o ser proibido na esfera de sua sexualidade? Aí é que está a chave que pretendo utilizar nessa análise.


Veja que faz parte do regulamento do ser o orgasmo. A ausência do orgasmo pode ser sublimada por um esforço produtivo, mas será que esse esforço deveria ser compulsório? Sociedades mais fechadas buscam minar a sexualidade e as sociedades fortemente telúricas - como as fascistas - buscam até reprimir a sexualidade com tudo que estiver ao alcance de suas mãos. Não por acaso, a repressão à sexualidade feminina, a minorias sexuais (LGBTs), a busca pela padronização, tudo isso marca o regime fascista. Todavia não estamos nesse contexto, embora seja salutar observar tal parte.


É preciso compreender que a ausência de uma liberdade de desejo, de liberação de desejo, de satisfação pulsional é uma forma de criar uma sociedade adoentada e suscitar nela os mais terríveis delírios. A insatisfação pulsional gerará constantemente crises psíquicas. E essas crises gerarão um estado exacerbação. Esse estado posteriormente poderá ser utilizado metodologicamente para uma missão. E é assim que a sociedade extremo-telúrica se alimenta e retroalimenta: da insatisfação de seu desejo em conjunto com uma condução coercitiva de esforços a um inimigo determinado para o reforço de sua mentalidade coletivo-normativa.


Nelson Rodrigues, ao escrever essa peça, caçoa dos pensamentos bizarros sobre o que é a humanidade e todo o misticismo por trás das proibições e negações que grupos sociais criam para si mesmos para se negarem. O que é bastante interessante, visto que é sociologicamente útil para compreender os dramas sexuais que existiam nessa época.


Como sempre, a obra rodrigueana é marcada por uma capacidade de abertura que possibilita uma análise crítica duma série de conjunturas. Demonstrando a genialidade do grande mestre que é e foi Nelson Rodrigues.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Acabo de ler "Em Defesa de Stalin" de Vários Autores (Parte 15)

  Voltamos a análise do Instituto Marx Engels Lenin sobre a vida de Stalin (páginas 229 à 232). Com a derrota da primeira revolução russa, a...